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19 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça
há 12 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

T5 - QUINTA TURMA

Publicação

Julgamento

Relator

Ministro JORGE MUSSI

Documentos anexos

Inteiro TeorHC_163422_MG_1330777926917.pdf
Certidão de JulgamentoHC_163422_MG_1330777926919.pdf
Relatório e VotoHC_163422_MG_1330777926918.pdf
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Inteiro Teor

HABEAS CORPUS Nº 163.422 - MG (2010/XXXXX-1)
RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI
IMPETRANTE : HEBERT AUGUSTO DIAS DA SILVA
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
PACIENTE : NILSON JOSÉ RIBEIRO (PRESO)
EMENTA
HABEAS CORPUS . TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇAO PARA O COMÉRCIO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. DOSIMETRIA. PENA-BASE. FIXAÇAO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CULPABILIDADE. POLICIAL MILITAR. MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. NATUREZA E QUANTIDADE DE DROGAS. ART. 42 DA LEI 11.343/06. EXASPERAÇAO DA REPRIMENDA. FUNDAMENTAÇAO CONCRETA E IDÔNEA. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
1. Em se tratando de crimes cometidos da Lei 11.343/06, como ocorre na espécie, na fixação da pena, deve-se considerar, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do CP, a natureza e a quantidade da substância entorpecente, a personalidade e a conduta social do agente, consoante o disposto no art. 42 da Lei n. 11.343/06.
2. Tendo os crimes sido perpetrados por policial militar que, ostentando tal condição funcional, tinha maiores condições de entender o caráter ilícito do seu ato e também porque detém o dever de garantir a segurança pública e reprimir a criminalidade, não se mostra injustificada a manutenção do acórdão no ponto em que, por conta disso, considerou um pouco mais elevada a culpabilidade do agente.
3. Verificado que as instâncias ordinárias levaram especialmente em consideração a natureza e a considerável quantidade de droga envolvida nas operações realizadas pela associação criminosa, não há que se falar em constrangimento ilegal quando as sanções básicas de ambos os crimes - tráfico de entorpecentes e associação para o narcotráfico - foram fixadas um pouco acima do mínimo legalmente previsto para cada tipo, vez que apontados fundamentos concretos a justificar maior reprimenda.
APLICAÇAO DA PENA. POLICIAL MILITAR. INCIDÊNCIA DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO 40, II, DA LEI 11.343/06. RECONHECIMENTO ACERTADO. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM . INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE.
1. Correto o reconhecimento da majorante do art. 40, II, da Lei 11.343/06, tendo em vista que o condenado praticou o crime de tráfico prevalecendo-se de informações que detinha em razão de ser policial militar.
2. Não há bis in idem na consideração da condição de policial militar para, na primeira etapa da dosimetria, concluir pela maior culpabilidade do agente e, na terceira, reconhecer em seu desfavor a causa de aumento do art. 40, II, da Lei de Drogas, pois na primeira considerou-se a condição de policial militar em sentido amplo e, na outra, que praticou o crime valendo-se de informações que possuía, dada a função pública que exercia.
ASSOCIAÇAO PARA O NARCOTRÁFICO. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇAO PREVISTA NO 4º DO ART. 33 DA LEI 11.343/2006. PRETENDIDA APLICAÇAO. REQUISITOS SUBJETIVOS. NAO PREENCHIMENTO. INTEGRAÇAO EM ORGANIZAÇAO CRIMINOSA. CONCEITO. CONVENÇAO DE PALERMO. INDEFERIMENTO DA MINORANTE JUSTIFICADO. COAÇAO NAO DEMONSTRADA.
1. Revela-se inviável a aplicação da causa especial de diminuição prevista no 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, porquanto o conjunto de provas colacionado, derivado de meses de investigação policial, levaram a conclusão que o paciente seria integrante de organização voltada à prática de tráfico de drogas.
2. A definição de organização criminosa é aquela estabelecida na Convenção das Nações Unidas sobre Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), aprovada pelo Decreto Legislativo 231/03 e promulgada pelo Decreto 5.015/04, que dita que grupo criminoso organizado é aquele "estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material" .
EXECUÇAO. REGIME. CONCURSO MATERIAL. FIXAÇAO COM BASE NOS SOMATÓRIO DAS PENAS. REPRIMENDA SUPERIOR A OITO ANOS DE RECLUSAO. MODO FECHADO JUSTIFICADO. CONSTRANGIMENTO NAO EVIDENCIADO.
1. Tendo o paciente sido condenado por 2 (dois) crimes, em concurso material, cujas penas, somadas, ultrapassaram o montante de 8 (oito) anos de reclusão, de rigor a manutenção do regime inicial fechado de cumprimento de pena. Exegese do art. 111 da LEP e art , 33, , a , do CP.
2. Ordem denegada.
ACÓRDAO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem. Os Srs. Ministros Março Aurélio Bellizze e Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Gilson Dipp e Laurita Vaz.
Brasília (DF), 07 de fevereiro de 2012. (Data do Julgamento).
MINISTRO JORGE MUSSI
Relator
HABEAS CORPUS Nº 163.422 - MG (2010/XXXXX-1)
IMPETRANTE : HEBERT AUGUSTO DIAS DA SILVA
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
PACIENTE : NILSON JOSÉ RIBEIRO (PRESO)
RELATÓRIO

EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em favor de NILSON JOSÉ RIBEIRO contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que, ao julgar a Apelação Criminal n.º 1.0024.08.120892-8/001, interposta pela defesa, deu-lhe parcial provimento para reduzir a pena-base do crime de tráfico imputado ao paciente, restando a sua reprimenda total calculada em 11 (onze) anos de reclusão, no regime inicial fechado, mais pagamento de 1.600 (um mil e seiscentos) dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos artigos 33, c/c 40, II, e 35, todos da Lei n.º 11.343/06, na forma do art. 69, do Código Penal.

Informa que, insatisfeita com o resultado do julgamento colegiado, ingressou a defesa com recurso especial, que se encontraria em trâmite na instância ordinária.

O impetrante alega constrangimento ilegal, ao argumento de que a decisão do Juiz singular, bem como a do Tribunal impetrado, não teriam obedecido ao critério trifásico de fixação de penas no estabelecimento da reprimenda imposta ao paciente, violando o disposto no artigo 93, IX, da CF/88 e nos artigos 157, 381, III. 564, III, m, todos do Código de Processo Penal.

Assevera que o fato de ser o apenado policial militar não poderia levar a um juízo negativo quanto à sua culpabilidade, mesmo porque a condição de funcionário público já teria sido valorada na causa de aumento de pena do artigo 40, II, da Nova Lei de Drogas, o que implicaria em bis in idem.

Com relação ao crime de tráfico, argumenta que não há motivos para se fixar a pena-base acima do mínimo legal, com fundamento, exclusivamente, na natureza do delito e na quantidade de droga apreendida, já que o réu teve sua personalidade e conduta social valoradas favoravelmente.

Aduz que a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, , da Lei de Drogas, foi analisada equivocadamente na segunda fase do sistema trifásico de fixação da reprimenda penal, o que ensejaria a nulidade da sentença impugnada, circunstância que teria passado despercebida pela Corte originária quando do julgamento do apelo.

Defende, ainda, que no caso concreto não teria sido apresentada qualquer justificativa idônea a ensejar a inaplicabilidade da causa de especial diminuição da pena apontada, já que o paciente é primário, possui bons antecedentes e a prática criminosa constituiu um fato isolado em sua vida.

Quanto ao crime do artigo 35 da Lei n.º 11.343/06, o impetrante defende que o regime de cumprimento de pena é inadequado, já que sendo a maior parte das circunstâncias judiciais favoráveis, e tendo a reprimenda relativa a esse delito sido inferior a 4 (quatro) anos, deveria ter-se fixado o regime aberto para o seu cumprimento.

Entende, por fim, que o apenado não se valia da função pública para praticar o crime de tráfico, já que sua atividade era simplesmente a de "avisar os demais integrantes da quadrilha sobre possíveis operações policiais" (fls. 16), de sorte que deveria ser afastada a causa de aumento prevista no art. 40, II, da mencionada lei federal.

Requereu, liminarmente e no mérito:

a) a nulidade do acórdão impetrado, com retorno dos autos ao Juízo singular para nova dosimetria da pena;

b) a redução da pena-base imposta pelo crime de tráfico;

c) a redução da pena ao mínimo legal pelo crime de associação, com consequente fixação do regime aberto para o seu cumprimento;

d) o afastamento da causa de aumento de pena prevista no art. 40, II, da Lei n.º 11.343/06;

e) a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, , da Nova Lei de Drogas.

f) a expedição de alvará de soltura em favor do paciente.

A medida liminar foi indeferida.

Solicitadas informações, o Tribunal de Justiça e o Juízo singular as prestaram.

O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem.

É o relatório.

HABEAS CORPUS Nº 163.422 - MG (2010/XXXXX-1)
VOTO

EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Da análise dos autos verifica-se que o paciente foi condenado, em primeiro grau, à pena total de 13 (treze) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado, mais multa, pela prática dos delitos previstos no artigo333, c/c artigo400, inciso II e artigo355, todos da Lei nº 11.343333/06, porque, no dia XXXXX-10-2007, foi flagrado junto com outros seis agentes, "associados para o fim de praticar, reiteradamente ou não, o tráfico de drogas, ainda prevalecendo-se Nilson, de função pública que ocupava " (fls. 20).

Segundo consta da sentença: "por volta do mês de junho de 2007, iniciou-se operação denominada"Pirâmide", visando apurar a ocorrência do tráfico de drogas nesta capital e na grande BH, comandado, principalmente, do interior da penitenciária da Região Metropolitana. As investigações levadas a efeito pela Polícia Civil, em especial por meio do monitoramento das comunicações telefônicas, tiveram como primeiro alvo a pessoa de Nelson da Silva Moreira, vulgarmente conhecido como" Tigrão ". A partir da investigação, apurou-se que os outros vários indivíduos, muitos ainda não identificados, também estavam envolvidos no tráfico de droga, o que desencadeou o monitoramento de vários numerais telefônicos. E, a partir desses monitoramentos, foi possível esclarecer a qualificação, e a participação no narcotráfico, dos agentes ora denunciados. Assim, apurou-se que os denunciados Nilson, Lânia e Newton, integravam uma das gangues que abastecia com drogas, o Aglomerado do Bispo de Mauro. Em várias ligações interceptadas, os policiais flagraram diálogos travados entre usuários e traficantes de outras regiões, solicitando drogas aos denunciados Nilson e sua esposa Lânia" (fls. 21).

De se destacar, também, que "Apurou-se ainda, que o denunciado Nilson, tirava proveito de sua função pública, vez que policial militar, avisava a outros traficantes acerca de operações policiais, conforme se verifica na ligação interceptada no dia 14 de setembro de 2007, constante às fl. 119" (fls. 21).

Inconformada, a defesa apelou perante o Tribunal a quo , que, em relação ao recurso do ora paciente, deu-lhe parcial provimento, reduzindo a pena-base imposta ao crime de tráfico de drogas para 7 (sete) anos de reclusão, mais pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, mantida a de 4 (quatro) anos de reclusão, mais pagamento de 900 (novecentos) dias-multa, pelo delito de associação para o narcotráfico, as quais, em razão do concurso material, perfizeram o total 11 (onze) anos de reclusão, mais pagamento de 1.600 (um mil e seiscentos) dias-multa, a ser cumprida no regime fechado.

Inicialmente, no que se refere à sustentada ilegalidade na pena-base, verifica-se, quanto ao crime de tráfico, que o Tribunal a quo reduziu o quantum inicialmente imposto pelo juiz sentenciante, tendo fixado a sanção básica em 7 (sete) anos de reclusão, sob os seguintes fundamentos:

[...] A) A culpabilidade ultrapassa os limites do próprio delito, uma vez que a frustração com a autodeterminação do apelante é elevada, por se tratar de policial militar, razão pela qual era de se esperar conduta diversa, não havendo qualquer outro fator que pudesse diminuir tamanha reprovação.[...] F) As consequências extrapolam aquelas próprias da conduta típica, principalmente em razão da alta potencialidade nociva que tal volume de negócios ilícitos imprimia na comunidade, principalmente tratando-se de tráfico de "crack" [...]. (fls. 96)

Já, no que se refere ao crime de associação para o tráfico, o magistrado singular elevou a pena-base considerando o seguinte: "Culpabilidade intensa pelo perigo social da conduta, bem como pela enorme quantidade de drogas apreendidas que demonstram a articulação, intensa atuação e ramificações da quadrilha " (fls. 51), entendimento que foi mantido pela Corte estadual, nestes termos:

Quanto à pena-base aplicada para o delito tipificado no art. 35 da lei 11.343/06, estou que o magistrado primevo sopesou-a com acerto, justificando-se a fixação da pena-base acima do mínimo legal, em razão da análise das circunstâncias judiciais, nas quais vislumbro ao menos duas desfavoráveis. (fls. 97)

A aplicação da pena-base é o momento em que o juiz, dentro dos limites abstratamente previstos pelo legislador, deve eleger, fundamentadamente, o quantum ideal de pena a ser aplicada ao condenado criminalmente, visando à prevenção e à repressão do delito praticado.

Assim, para chegar a uma aplicação justa e suficiente da lei penal, o sentenciante, dentro dessa discricionariedade juridicamente vinculada, deve atentar para as singularidades do caso concreto, guiando-se pelos oito fatores indicativos relacionados no caput do art. 59 do Código Penal, dos quais não deve se furtar de analisar individualmente, a saber: culpabilidade; antecedentes; conduta social; personalidade do agente; motivos, circunstâncias e consequências do crime; e comportamento da vítima, e indicar, especificamente, dentro destes parâmetros, os motivos concretos pelos quais as considera favoráveis ou desfavoráveis, pois é justamente a motivação da sentença que oferece garantia contra os excessos e eventuais erros na aplicação da resposta penal.

Em se tratando de crime previsto na novel Lei de Drogas, como ocorre na espécie, o juiz, na fixação da penas, deve considerar, ainda, e com preponderância sobre o previsto no art. 59 do CP, a natureza e a quantidade da substância entorpecente, a personalidade e a conduta social do agente, consoante o disposto no art. 42 da Lei n.º 11.343/06.

No caso, verifica-se que, inicialmente, foi considerada desfavorável a culpabilidade e, segundo a doutrina, na análise da referida circunstância judicial, "deve aferir-se o maior ou menor índice de reprovabilidade do agente pelo fato criminoso praticado, não só em razão de suas condições pessoais, como também em vista da situação de fato em que ocorreu a indigitada prática delituosa, sempre levando em conta a conduta que era exigível do agente, na situação em que o fato ocorreu" (DELMANTO, Celso e outros, Código Penal Comentado, 7ª ed., Renovar: RJ, 2007, p. 186).

Observados tais critérios, não há ilegalidade a ser sanada através da via eleita no que diz respeito à análise da culpabilidade, uma vez que o colegiado, dada a condição pessoal do agente - policial militar - concluiu pela maior reprovabilidade da conduta delituosa praticada, a autorizar, sim, maior apenação na primeira etapa da dosimetria.

Com efeito, verificando-se que o crime foi perpetrado por policial militar, que, ostentando tal condição, tinha maiores condições de entender o caráter ilícito dos seus atos e também porque detinha o dever funcional de garantir a segurança pública e reprimir a criminalidade, não se mostra injustificada a manutenção do acórdão no ponto em que, por conta disso, considerou um pouco mais elevada a culpabilidade do agente.

No mais, na hipótese em apreço, verifica-se que, embora as instâncias ordinárias tenham feito menção a outras circunstâncias judiciais tidas como negativas - no caso, às consequências do delito - foram especialmente consideradas desfavoráveis, nesse ponto, a natureza e a quantidade de substância entorpecente envolvida nos ilícitos em que condenado o paciente - havendo informação de que eram negociadas grandes quantidades de material tóxico, especialmente crack , entorpecente altamente nocivo à saúde pública, e que tais operações envolviam vultosas quantias em dinheiro , não se podendo, por isso, considerar ilegal o acórdão impugnado no ponto em que fixou a pena-base do crime de tráfico em apenas 2 (dois) anos acima do mínimo legalmente previsto e manteve a do delito de associação, estabelecida em 1 (um) ano acima do patamar mínimo, já que devidamente motivadas, encontrando respaldo no previsto no art. 42 da Lei nº 11.343/06.

Consta dos autos que o paciente integrava associação criminosa bastante organizada que desenvolvia operações de grande porte no comércio ilícito de substâncias entorpecentes no estado de Minas Gerais, tendo sido apurado, inclusive, que se aproveitou da sua função de policial militar para assegurar a prática das atividades da referida organização, conforme se depreende da leitura dos seguintes trechos do édito condenatório:

Apurou-se ainda, que o denunciado Nilson, tirava proveito de sua função pública, vez que policial militar, avisava a outros traficantes acerca de operações policiais, conforme se verifica na ligação interceptada no dia 14 de setembro de 2007, constante às fl. 119. (fls. 21)
As investigações apontam para o fato de que a quadrilha negociava vultosas quantias, sendo que apenas uma das negociações envolvia o equivalente a quantia de R$ 100.000,00 em drogas para um único comprador. (fls. 25)
As conversas transcritas nos autos demonstram que os réus negociavam grandes quantidades de drogas, em algumas situações usavam veículos como moeda de troca e movimentavam vultuosas quantias em dinheiro em suas transações. (fls. 38)

Estes fatos evidenciam que as instâncias ordinárias, na fixação da pena-base, atuaram em consonância com o disposto no art.422222 da Lei n.º11.3433333/06, considerando, com preponderância sobre o previsto no art.599999 doCPP, a natureza e a quantidade de droga envolvida nas operações da associação criminosa, a afastar o alegado constrangimento ilegal de que estaria sendo vítima o condenado nesse ponto.

A propósito, segundo orientação dessa Corte Superior de Justiça, "A natureza e a quantidade da droga apreendida, em atenção ao disposto no art. 42 da Lei n.º 11.343/2006, são circunstâncias que, por si só, justificam o aumento da pena-base acima do mínimo legal" ( HC n.º 165.387/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em XXXXX-2-2011, DJe XXXXX-2-2011).

Por essas razões, justamente porque verificada a adequação da análise das circunstâncias judiciais, não há que se falar em ilegalidade quando as sanções básicas restaram fixadas acima do mínimo legalmente previsto para cada tipo penal, já que apontados fundamentos concretos dos autos a justificar maior reprimenda.

No que tange à alegada ocorrência de bis in idem porquanto a condição de o paciente ser policial militar teria sido sopesada tanto na análise da circunstância judicial da culpabilidade como para justificar o reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso II, da Lei nº 11.343/06, cabe ressaltar que não assiste razão ao impetrante, pois, conforme bem observado no parecer ministerial: "na primeira fase de dosimetria da pena, a condição de policial militar do réu foi considerada em sentido amplo, ou seja, de que, como autoridade policial, seu dever era o de reprimir qualquer atividade ilícita, e não de praticá-la, como de fato ocorreu. Já a incidência daquela causa de aumento de pena se deu pelo fato de que o acusado, para a prática do delito, se utilizou, efetivamente, de informações que detinha em razão da função pública " (fls. 159).

De fato, dispõe o mencionado dispositivo legal que:

Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:
(...)
II - o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância;

Nesse contexto, devidamente reconhecida e aplicada a majorante, já que o condenado praticou o crime do art. 33 da Lei de Drogas prevalecendo-se de informações que detinha em razão de ser policial militar, inexistindo, desta forma, qualquer constrangimento a ser sanado nesse ponto, nem há o que se falar em bis in idem na consideração da condição de policial militar para, na primeira etapa da dosimetria, concluir pela maior culpabilidade do agente e, na terceira, reconhecer em seu desfavor a causa de aumento do art. 40, II, da Lei de Drogas, pois na primeira considerou-se a condição de policial militar em sentido amplo e, na outra, que praticou o crime valendo-se de informações que possuía, dada a função pública que exercia.

No que se refere à sustentada ilegalidade tocante à não incidência da causa especial de diminuição prevista no 4º do art. 33 da nova Lei de Drogas in casu , verifica-se que Corte impetrada manteve o afastamento de tal minorante, pelos seguintes argumentos:

[...] O apelante comandava uma quadrilha bem articulada com o fim exclusivo da traficância ilícita, com vários integrantes, com ramificações em outros municípios, do qual era a droga comprada diretamente para a distribuição sistemática em aglomeradas da Capital Mineira. Tal circunstância vem caracterizar uma organização criminosa, em razão da divisão de tarefas, do comando centrado e da participação dele, agente público, sendo certo que há notícia nos autos que ele, visando a manutenção da prática delitiva, informava os demais integrantes da quadrilha sobre operações policiais nos aglomerados. (fls. 95)

Sobre a referida causa especial de diminuição de pena, cumpre destacar que, na esteira do entendimento adotado por este Tribunal Superior, "a expressiva quantidade de droga apreendida, aliada a outras circunstâncias próprias do caso concreto , ora pode impedir a incidência da minorante prevista no art. 333,4ºº, da Lei11.3433/06, caso em que estará evidenciada a dedicação à atividade criminosa (Precedentes), ora como fator que, embora não impeça a aplicação da causa de diminuição, será tomada como parâmetro para definir o quantum da redução da pena " ( REsp n.º 1.021.782/RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em XXXXX-2-2010, DJe XXXXX-3-2010).

E, na hipótese que se apresenta, infere-se que o Tribunal a quo afastou o benefício tendo em vista que as provas produzidas nos autos, após longa investigação policial, permitem concluir que o réu seria integrante de uma organização criminosa votada à prática de tráfico ilícito de entorpecentes, tanto que findou condenado por violação ao art. 35 da Lei 11.343/06.

Argumenta o impetrante, nesse ponto, que não se poderia considerar a associação permanente, especialmente voltada para a prática do narcotráfico, da qual fazia parte o paciente, uma "organização criminosa", salientando que tal seria aquela em que o crime seria "de fato organizado, com ramificações internacionais e com tentáculos em todos os poderes do Estado" , lembrando, ainda que, ademais, "não existe no Brasil legislação que defina com propriedade os critérios legais norteadores da aferição se a instituição criminosa pode ser considerada integrante de"crime organizado"ou não" (fls. 11 e 12), não se podendo, outrossim, considerar que tenha vida dedicada às atividades ilícitas tão-somente por fazer parte de associação criminosa.

De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, a definição de organização criminosa é aquela estabelecida na Convenção das Nações Unidas sobre Crime Organizado Transnacional, de XXXXX-11-2000, conhecida como "Convenção de Palermo", aprovada pelo Decreto Legislativo 231, de XXXXX-5-2003, e promulgada pelo Decreto 5.015, de XXXXX-3-2004, a saber: grupo criminoso organizado é aquele "estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material" . Essa, aliás, é a orientação dada pelo Conselho Nacional de Justiça na Recomendação n. 3, de XXXXX-5-2006.

Nesse norte, tem-se:

HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. INCISO VII DO ART. 1.º DA LEI N.º 9.613/98. APLICABILIDADE. ORGANIZAÇAO CRIMINOSA. CONVENÇAO DE PALERMO APROVADA PELO DECRETO LEGISLATIVO N.º 231, DE 29 DE MAIO DE 2003 E PROMULGADA PELO DECRETO N.º 5.015, DE 12 DE MARÇO DE 2004. AÇAO PENAL. TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA A PERSECUÇAO PENAL.
1. Hipótese em que a denúncia descreve a existência de organização criminosa que se valia da estrutura de entidade religiosa e empresas vinculadas, para arrecadar vultosos valores, ludibriando fiéis mediante variadas fraudes mormente estelionatos , desviando os numerários oferecidos para determinadas finalidades ligadas à Igreja em proveito próprio e de terceiros, além de pretensamente lucrar na condução das diversas empresas citadas, algumas por meio de “testas-de-ferro”, desvirtuando suas atividades eminentemente assistenciais, aplicando seguidos golpes.
2. Capitulação da conduta no inciso VII do art. 1.º da Lei n.º 9.613/98, que não requer nenhum crime antecedente específico para efeito da configuração do crime de lavagem de dinheiro, bastando que seja praticado por organização criminosa, sendo esta disciplinada no art. 1.º da Lei n.º 9.034/95, com a redação dada pela Lei n.º 10.217/2001, c.c. o Decreto Legislativo n.º 231, de 29 de maio de 2003, que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, promulgada pelo Decreto n.º 5.015, de 12 de março de 2004. Precedente.
3. O recebimento da denúncia, que se traduz em mera admissibilidade da acusação diante da existência de sérios indícios de autoria e materialidade, mostra-se adequado, inexistindo a alegada inépcia, porquanto preenchidos todos seus pressupostos legais.
4. Nesta fase inaugural da persecução criminal, não é exigível, tampouco viável dentro do nosso sistema processual penal, a demonstração cabal de provas contundentes pela acusação. Esse grau de certeza é reservado para a prolação do juízo de mérito. Este sim deve estar calcado em bases sólidas, para eventual condenação.
5. Mostra-se, portanto, prematuro e temerário o acolhimento do pedido da defesa de trancamento da ação penal, de maneira sumária, retirando do Estado, de antemão, o direito e, sobretudo, o dever de investigar e processar, quando há elementos mínimos necessários para a persecução criminal.
6. Ordem denegada.
( HC XXXXX/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 30/05/2008, DJe 22/09/2008 - grifamos)

Desta forma, não se pode dizer que as instâncias ordinárias incidiram em constrangimento ilegal, pois, entendendo que o paciente não satisfazia as exigências para a aplicação do 4º do art.333333 da Lei n.º11.3433333/06, fundamentadamente rechaçaram a sua incidência na hipótese, ao concluírem que o paciente efetivamente seria integrante de organização criminosa, destacando os elementos determinantes para a sua caracterização, acima transcritos.

Outrossim, quanto à alegada nulidade da sentença em virtude da referida causa especial de diminuição da pena haver sido analisada equivocadamente na segunda fase da dosimetria pelo magistrado singular , cumpre esclarecer que, conforme muito bem ressaltado pelo ilustre Sub-Procurador Geral da República em seu parecer: "como a conclusão foi pela não incidência da minorante, a inversão em nada afetou a pena aplicada ao Paciente " (fls. 160), assim, não há que se falar em nulidade do édito condenatório por violação do sistema trifásico de fixação da pena, até porque não se pode olvidar que o acórdão ora impugnado reformou a parte da sentença referente à dosimetria, de modo que a nova decisão substituiu aquela que supostamente seria nula.

No que tange à pretendida fixação do modo aberto para o cumprimento da pena imposta ao delito previsto no art. 35 da Lei n.º 11.343/06, melhor sorte não socorre o impetrante.

Segundo o disposto no art. 111 da Lei de Execução Penal, "Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição."

E, na hipótese que se apresenta, verifica-se que o paciente foi condenado por 2 (dois) crimes, em concurso material, cujas penas, somadas, ultrapassam o montante de 8 (oito) anos de reclusão, pelo que de rigor a manutenção do regime inicial fechado de cumprimento de pena, nos termos do art. 33, , a , do CP.

Ausente, assim, qualquer ilegalidade a ser sanada através da via eleita.

Ante o exposto, denega-se a ordem.

É o voto.

CERTIDAO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA
Número Registro: 2010/XXXXX-1
PROCESSO ELETRÔNICO
HC 163.422 / MG
Números Origem: XXXXX 24077821668
MATÉRIA CRIMINAL
EM MESA JULGADO: 07/02/2012
Relator
Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO XAVIER PINHEIRO FILHO
Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS
AUTUAÇAO
IMPETRANTE : HEBERT AUGUSTO DIAS DA SILVA
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
PACIENTE : NILSON JOSÉ RIBEIRO (PRESO)
ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas - Tráfico de Drogas e Condutas Afins
CERTIDAO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por unanimidade, denegou a ordem."
Os Srs. Ministros Março Aurélio Bellizze e Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Gilson Dipp e Laurita Vaz.

Documento: XXXXX Inteiro Teor do Acórdão - DJe: 15/02/2012
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/21265791/inteiro-teor-21265792

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