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19 de Abril de 2024

Igreja é condenada a indenizar vítima de padre pedófilo

há 10 anos

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Igreja Católica deve ser responsabilizada civilmente, de maneira solidária e objetiva, pelos danos advindos de delito cometido por algum de seus padres.

No recurso especial que envolveu a Mitra Diocesana de Umuarama (PR) e padre que cometeu crimes sexuais contra menor, o colegiado também discutiu o prazo prescricional para ajuizamento de ação reparatória de danos morais pela vítima, quando a ação penal é proposta pelo Ministério Público dentro do prazo de três anos.

A vítima ajuizou ação de compensação por danos morais contra a mitra e o padre, que havia confessado o crime no processo penal. A sentença reconheceu o ato ilícito do padre, que ofendeu a integridade moral do menor, e condenou tanto ele quanto a mitra a pagar indenização no valor de R$ 100 mil, metade para cada um, de forma solidária.

O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) negou provimento às apelações, reconhecendo a responsabilidade solidária da igreja, já que o padre era subordinado a ela.

Em recurso ao STJ, a mitra alegou ofensa a dispositivos do Código Civil, do Código de Processo Civil e do Decreto 7.107/10, que promulgou acordo entre o governo brasileiro e a Santa Sé para adoção do Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil.

A entidade eclesiástica sustentou que não haveria responsabilidade solidária e objetiva de sua parte, visto que a autoria do delito era de terceiro. Alegou ainda que a pretensão da vítima, de reparação na esfera civil por danos morais, estaria prescrita, pois a ação teria sido ajuizada mais de três anos após os fatos.

Preposição

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, lembrou que a própria mitra afirmou que o padre acusado desenvolvia trabalho voluntário e vocacional de ordem religiosa, vinculado à entidade, cumprindo funções, horários e normas da administração da paróquia. Esse fato é suficiente para configurar a relação de preposição, nos termos do artigo 932 do Código Civil de 2002 (CC/02), pois, conforme prega a doutrina, a preposição tem por essência a subordinação afirmou a ministra.

Segundo Nancy Andrighi, o STJ ampliou o conceito de preposição há muito tempo, para além das relações empregatícias, ao decidir que não é preciso que exista um contrato típico de trabalho, sendo suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem (REsp 304.673).

A regra, conforme mencionou a ministra, é a responsabilidade civil individual, porém, existem situações em que o ordenamento jurídico atribui a alguém, independentemente de culpa sua, a responsabilidade solidária por ato de outrem, considerando, para tanto, determinada relação jurídica havida entre eles (artigos 932 e 933 do CC/02).

A relatora alertou que mais do que uma simples relação de subordinação, o ministro ordenado é para os fiéis a própria personificação da Igreja Católica, no qual, em razão do desempenho de tão importante papel, depositam justas expectativas de retidão moral e santidade.

Nesse contexto, acrescentou, mostra-se ainda mais reprovável o comportamento do réu, que, sob o manto do sacerdócio e aproveitando-se dele, abusando, pois, da lídima crença que lhe era devotada em razão de sua qualidade de padre, convencia as vítimas menores a pernoitar na casa paroquial em sua companhia, para praticar atos libidinosos.

Por isso, segundo a ministra, é necessário que se lance um olhar mais crítico e realista acerca da relação havida entre as instituições eclesiásticas e seus servidores. A igreja não pode ser indiferente em especial no plano da responsabilidade civil, frise-se aos atos praticados por quem age em seu nome ou em proveito da função religiosa que se lhe atribui, sob pena de trair a confiança que nela própria depositam os fiéis.

Prescrição

A relatora explicou que, no âmbito civil, aquele que por ato ilícito causa dano a outrem tem o dever de repará-lo (artigo 927 do CC/02). E no âmbito penal, um dos efeitos da condenação é tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime (artigo 91, I, do Código Penal).

Dessa forma, quem pretende ser ressarcido dos danos sofridos com a prática do delito pode escolher, de duas, uma: ajuizar a correspondente ação reparatória ou aguardar o desfecho da ação penal, para, então, executar ou liquidar o título constituído, conforme o caso.

De acordo com Nancy Andrighi, no momento em que toma conhecimento do autor do crime, nasce para o ofendido a pretensão de exigir reparação, que se extingue no prazo de três anos, em tese. Mas se, nesse período, for iniciado procedimento criminal para apuração do mesmo fato, a prescrição fica suspensa até a sentença penal definitiva. Nesse sentido, a relatora citou precedentes do STJ como o AgRg no AREsp 268.847, de relatoria própria, e o REsp 665.783, do ministro Aldir Passarinho Junior.

Por isso, continuou a ministra, se o procedimento criminal não for iniciado no lapso temporal de três anos, não há falar em suspensão da prescrição da pretensão reparatória no juízo cível, de modo que, nesse caso, a inércia da parte em propor a ação de conhecimento naquele prazo será punida com a extinção da pretensão, restando-lhe apenas a possibilidade de executar a sentença definitivamente proferida pelo juízo criminal.

No caso julgado, conforme ressaltou a ministra, não houve prescrição na área civil, porque o crime havia sido cometido em 2002 e a denúncia oferecida pelo Ministério Público ao juízo criminal foi recebida em 2004 dentro, portanto, dos três anos, o que levou à suspensão do prazo prescricional.

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7 Comentários

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Sou um católico progressista, abertamente de esquerda, mas, com todo o espírito humanitário que transborda em mim — até mais do que deveria —, não consigo fazer concessões a um pedófilo. Menos ainda, em se tratando de padres. Além da reparação financeira que deveria ser bancada pelo Vaticano, defendo que esses criminosos de batina sejam trancafiados numa cela pelo resto da vida. continuar lendo

No artigo acima, fala de crime contra menor, não entendi os argumentos de que estaria a pretensão prescrita. A lei garante que a prescrição não corre contra menor absolutamente incapaz. continuar lendo

Deve se tratar de menor relativamente incapaz (17 anos). continuar lendo

No Brasil e no mundo tem pedofilia e tem que pagar .Mas ladrão pedo falo , 171 nas igrejas evangélicas no Brasil um absurdo . Não estou falando de todas . Mais tem uns que não e de acreditar os malandros em cima de pessoas de pouco conhecimentos . Tinha que estar na cadeia todos os bandidos . continuar lendo

Não. O padre é quem deve responder por seus atos, já que a igreja não o autorizou, portanto, e tampouco teria condições de fiscaliza-lo em tempo integral. Ele sim, fez duas vítimas: a vítima humana e a vítima instituição a qual entrou indevida e maliciosamente para desonra-la. continuar lendo

Responsabilidade objetiva. Não há de se concordar que apenas por se tratar de religioso, uma pessoa seja imune às penas comuns. Mais do que isso, penso que justamente por isso, incidem agravantes. E não vejo a instituição como vítima, mas como co-responsável, à medida que tais fatos ocorrem com grande frequencia (segundo noticiado) e a igreja sempre tenta abafar os casos, sem punir os criminosos. Logo, além de omissa, é conivente. continuar lendo