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2 de Maio de 2024

Lei Maria da Penha não exige prova de que a vítima seja vulnerável ou hipossuficiente

há 10 anos

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, para enquadrar uma agressão contra a mulher no conceito de violência doméstica estabelecido pela Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), basta que o fato tenha ocorrido em decorrência da relação amorosa. Não é necessária a comprovação de coabitação com o agressor ou de hipossuficiência e vulnerabilidade da vítima.

O entendimento unânime da Turma, sob a relatoria da ministra Laurita Vaz, foi proferido no julgamento de recurso especial que envolveu dois atores da Rede Globo. De acordo com a acusação, o ator deu um tapa no rosto da atriz, fazendo com que ela caísse ao chão. Nesse momento, uma senhora de aproximadamente 60 anos se aproximou da atriz para socorrê-la e também foi jogada ao chão pelo ator. As agressões só terminaram depois da intervenção de seguranças e frequentadores do local onde estavam.

O juízo do Primeiro Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher condenou o ator a dois anos e nove meses de detenção, em regime inicial aberto: dois anos pela lesão corporal contra a idosa e nove meses pela agressão contra a atriz.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) declarou a incompetência do Juizado da Violência Doméstica, pois considerou que a Lei Maria da Penha não era aplicável ao caso.

Hipossuficiência e vulnerabilidade

De acordo com o tribunal fluminense, o campo de atuação e aplicação da lei está traçado pelo binômio hipossuficiência e vulnerabilidade em que se apresenta culturalmente o gênero mulher no conceito familiar, que inclui relações diversas, movidas por afetividade ou afinidade.

Para o TJRJ que levou em conta o fato de o processo envolver pessoas famosas , a indicada vítima, além de não conviver em relação de afetividade estável com o ator, não pode ser considerada uma mulher hipossuficiente ou em situação de vulnerabilidade.

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) entrou com recurso especial, ratificado pelas vítimas, no qual sustentou que a pretensão da lei é conferir tratamento diferenciado à mulher vítima de violência doméstica e familiar, por considerá-la vulnerável diante da evidente desproporcionalidade física entre agredida e agressor.

Sustentou que a lei considerou também o preconceito e a cultura vigentes, os quais se descortinam no número alarmante de casos de violência familiar e doméstica contra mulheres, em todos os níveis e classes sociais. Afirmou ainda que a vulnerabilidade deveria ser aferida na própria relação de afeto, onde o homem é, e sempre foi, o mais forte, sendo a hipossuficiência, presumida pela própria lei.

Relação de afeto

No STJ, a ministra Laurita Vaz explicou que a legislação teve o intuito de proteger a mulher da violência doméstica e familiar que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, mas o crime deve ser cometido no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto.

De acordo com a ministra, a relação existente entre agressor e agredida deve ser analisada em cada caso concreto, para se verificar a aplicabilidade da Lei Maria da Penha, sendo desnecessária a coabitação entre eles.

A relatora ressaltou que o entendimento prevalecente no STJ é o de que o namoro é uma relação íntima de afeto que independe de coabitação; portanto, a agressão do namorado contra a namorada, ainda que tenha cessado o relacionamento, mas que ocorra em decorrência dele, caracteriza violência doméstica.

Laurita Vaz considerou que a exigência imposta pelo TJRJ, de demonstração de hipossuficiência ou vulnerabilidade da mulher agredida, deve ser afastada, pois em nenhum momento o legislador condicionou esse tratamento diferenciado à demonstração desse pressuposto, que, aliás, é ínsito à condição da mulher na sociedade hodierna.

Fragilidade presumida

A ministra ponderou que a diferenciação de gênero trazida pela lei não é desproporcional, visto que a mulher seria eminentemente vulnerável no tocante a constrangimentos físicos, morais e psicológicos sofridos em âmbito privado, já que o homem sempre foi o mais forte.

Nesse sentido, a presunção de hipossuficiência da mulher, a implicar a necessidade de o estado oferecer proteção especial para reequilibrar a desproporcionalidade existente, constitui-se em pressuposto de validade da própria lei, afirmou Laurita Vaz.

Considerando que a vulnerabilidade e hipossuficiência da mulher são presumidas pela própria lei, a Quinta Turma cassou o acórdão do TJRJ, restabeleceu a sentença penal condenatória e declarou de ofício a extinção de punibilidade do ator em relação ao crime contra a atriz, em virtude da prescrição. A condenação contra a segunda vítima ficou mantida.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

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15 Comentários

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Ou seja, numa relação de namoro, o entendimento é que vale a Lei Maria da Penha de violência doméstica. Mulheres, sempre hipossuficientes e frágeis...

Ah! Valha-me!

A maior força das mulheres é sua aparência de fragilidade. Embora estatisticamente sejam inferiores em força bruta, elas sabem agredir homens emocionalmente e psicologicamente. Quando residentes com um homem, a fragilidade física não as impede de usar venenos, facas e tantos artifícios que as tornam igualmente algozes de seus companheiros.

Em resumo: a Lei Maria da Pena é sexista e inconstitucional!

Uma lei que tipifica um crime na qual a mulher nunca pode ser ré, apenas vítima, e o homem nunca pode ser vítima, apenas réu, é um absurdo, um descalabro. Uma lei justa para violência doméstica trataria indistintamente o sexo da vítima. continuar lendo

A aparência é de uma boa decisão. Contudo, a Justiça continua sendo obra que se faz de caso a caso. E não verifico que vem sendo bem realizada esta obra, porque são demasiados os casos de inocentes encarcerados, com base apenas na palavra da vítima, sem o cotejo com outras provas. Seria muito desejável que perícias sociográficas e exames de antecedentes se fizessem examinados antes de decretos de prisão. Sobretudo, o direito precisa voltar a funcionar neste país, acompanhando a tendência de punir todos os comportamentos, que só não faz mesmo encarcerados, definitivamente, os políticos corruptos. continuar lendo

O problema é que a violência domestica se da exatamente dentro de casa Luiz Bernardes, muitas vezes sem testemunhas, então se a apalavra da vítima não for considerada prova fica esvaziada a função da lei. Perícias e exames, são desejáveis, mas caros e ainda longe da nossa realidade de todo dia. continuar lendo

Inicialmente acreditei nesta Lei. Tenho 60 anos e presenciei muitos fatos e atos inconcebiveis contra as mulheres. A desigualdade, aposição social, e outros fatores que deixavam a merce a pessoa feminina.
Infelizmente está se colocando a prova os direitos Constitucionais sobre o Direito. A defesa deve existir sim. Este radicalismo vai desencadear simplesmente o fim das relações maritais. Numa casa que tudo mundo manda já não dá certo esta anarquia, quanto mais uma mulher que por qualquer motivo liga para a Policia e faz uma denuncia praticamente baseada na sua verdade, na sua vontade. Para mim felizmente vou me isolar de relações por mais simples que sejam. Tenho uma tristeza muito grande no que vai virar este nosso mundo sem a família constituida, porque nossa Siciedade esta baseada em hieraquia mesmo sendo doméstica. Se querem reverter o papel da mulher nesta sociedade, tornando-a Matriarcal absolutista, podem ficar a vontade...o mundo acabou. continuar lendo

Parabéns Francisco.
Vamos jogar a toalha. Já deu.
Primeiro "elas" reivindicam direitos iguais alegando terem as mesmas condições, muitas vezes com ares de superioridade. (aplausos)
Impuseram seus direitos de serem reconhecidas e buscando seu espaço pela igualdade. (aplausos)
Agora, com interesse construir um grande escudo para proteger suas manhas e vontades, busca a lei que dá amplos poderes de "segurança" e "superioridade" perante seu companheiro, namorado, marido.
Em vez de aproximar e construir lares e relacionamentos sólidos, me parece que as leis estão desestruturando enfraquecendo e, por que não dizer, destruindo o velho e saudoso conceito de FAMÍLIA. continuar lendo

Essa mesma dificuldade de interpretação da lei acontecerá, ainda em maior intensidade, se alguém criar legislação específica para crimes contra homossexuais... Se não conseguem entrar em entendimento sobre o que é crime contra a mulher/esposa/namorada por falta de consenso na definição da relação, imaginem como será difícil distinguir e provar quem é hétero e quem é homossexual, e principalmente, se a opção sexual foi fator motivador de fato para o crime! Vamos caprichar no voto desse ano para os deputados federais para que os legisladores, nossos representantes, não façam lambança criando leis a torto e a direito. continuar lendo