9 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Superior Tribunal de Justiça
AgRg no HABEAS CORPUS Nº 582.831 - MT (2020/0117660-5)
RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ
AGRAVANTE : MARCOS LEVI BERVIG
ADVOGADOS : JIANCARLO LEOBET - MT010718 ALCIR FERNANDO CESA - MT017596 DARI LEOBET JUNIOR - MT021919 WESLEY DE ALMEIDA PEREIRA - MT023350
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME PREVISTO NO ART. 68 DA LEI N. 9.605/1998. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. DECISUM QUE CONCLUIU PELA INEXISTÊNCIA DE HIPÓTESES DE REJEIÇÃO DA INICIAL ACUSATÓRIA OU DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE DESOBEDIÊNCIA. TRANCAMENTO DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NÃO CABIMENTO. ANÁLISE SOBRE A MATERIALIDADE E A AUTORIA DO DELITO QUE NÃO PODE SER PROCEDIDA NA VIA ELEITA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Na hipótese dos autos, o Agravante foi denunciado, em 1.º/04/2016, como incurso no art. 68 da Lei n. 9.605/1998, sob a acusação de que, no mês de julho de 2013, deixou de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental, porquanto, não obstante tenha sido embargada a área de 457,167 hectares da sua propriedade rural pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, arrendou-a, "onde foi realizada colheita de arroz e milho, bem como plantio de soja" (fl. 59).
2. Apesar de sucinta, a decisão que manteve o recebimento da denúncia apontou, fazendo referência à acusação apresentada pelo Réu, que inexistem as hipóteses de rejeição da inicial acusatória ou de desclassificação para o delito de desobediência.
3. Nessa perspectiva, o entendimento está conformado à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificada no sentido de que "[...] a decisão que recebe a denúncia (CPP, art. 396) e aquela que rejeita o pedido de absolvição sumária (CPP, art. 397) não demandam motivação profunda ou exauriente, considerando a natureza interlocutória de tais manifestações judiciais, sob pena de indevida antecipação do juízo de mérito, que somente poderá ser proferido após o desfecho da instrução criminal , com a devida observância das regras processuais e das garantias da ampla defesa e do contraditório" (RHC 60.582/MT, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016; sem grifos no original).
4. O trancamento do processo-crime pela via do habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, a atipicidade do fato, a ausência de indícios capazes de fundamentar a acusação ou, ainda, a extinção da punibilidade, circunstâncias não evidenciadas no caso em apreço.
Superior Tribunal de Justiça
5. Não se pode impedir o Estado, antecipadamente, de exercer a função jurisdicional, coibindo-o de realizar o levantamento dos elementos de prova para a verificação da verdade dos fatos – o que constitui hipótese de extrema excepcionalidade, não evidenciada na espécie. É prematuro, pois, determinar desde já o trancamento do processo-crime, sendo certo que, no curso da instrução processual – que, segundo as informações prestadas pela Magistrada de primeiro grau, ainda não foi encerrada em razão da insistência da Defesa na oitiva de testemunha (fl. 337) –, poderá a Defesa demonstrar a veracidade das alegações.
6. Agravo regimental desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Antonio Saldanha Palheiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 15 de setembro de 2020 (Data do Julgamento)
MINISTRA LAURITA VAZ
Relatora
Superior Tribunal de Justiça
AgRg no HABEAS CORPUS Nº 582.831 - MT (2020/0117660-5)
AGRAVANTE : MARCOS LEVI BERVIG
ADVOGADOS : JIANCARLO LEOBET - MT010718 ALCIR FERNANDO CESA - MT017596 DARI LEOBET JUNIOR - MT021919 WESLEY DE ALMEIDA PEREIRA - MT023350
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ:
Trata-se de agravo regimental interposto por MARCOS LEVI BERVIG contra a
decisão de fls. 392-397, por intermédio da qual foi denegada a ordem de habeas corpus . O
decisum foi assim ementado (fl. 392):
"HABEAS CORPUS. CRIME PREVISTO NO ART. 68 DA LEI N. 9.605/1998. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. DECISUM QUE CONCLUIU PELA INEXISTÊNCIA DE HIPÓTESES DE REJEIÇÃO DA INICIAL ACUSATÓRIA OU DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE DESOBEDIÊNCIA. TRANCAMENTO DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NÃO CABIMENTO. ANÁLISE SOBRE A MATERIALIDADE E A AUTORIA DO DELITO QUE NÃO PODE SER PROCEDIDA NA VIA ELEITA. ORDEM DENEGADA."
Nas razões recursais, aduz o Agravante que sofre constrangimento ilegal, "pois
arguiu diversas matérias capazes de extinguir de plano a ação penal, porém, foi mantida a
sua tramitação sem sequer serem analisadas com clareza as teses aventadas" (fl. 408).
Argumenta que não houve a prolação de uma decisão saneadora fundamentada e com
enfrentamento das teses defensivas, pois apenas "manteve o recebimento da denúncia de
forma genérica" (fl. 412).
Requer, ao final, a submissão do feito ao Colegiado para, acolhido o agravo
regimental, seja concedida a ordem de habeas corpus em favor do Agravante, reconhecendo-se
a nulidade da decisão que recebeu a denúncia ou o trancamento da ação penal ante a ausência
de justa causa.
É o relatório.
Superior Tribunal de Justiça
AgRg no HABEAS CORPUS Nº 582.831 - MT (2020/0117660-5)
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME PREVISTO NO ART. 68 DA LEI N. 9.605/1998. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. DECISUM QUE CONCLUIU PELA INEXISTÊNCIA DE HIPÓTESES DE REJEIÇÃO DA INICIAL ACUSATÓRIA OU DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE DESOBEDIÊNCIA. TRANCAMENTO DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NÃO CABIMENTO. ANÁLISE SOBRE A MATERIALIDADE E A AUTORIA DO DELITO QUE NÃO PODE SER PROCEDIDA NA VIA ELEITA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Na hipótese dos autos, o Agravante foi denunciado, em 1.º/04/2016, como incurso no art. 68 da Lei n. 9.605/1998, sob a acusação de que, no mês de julho de 2013, deixou de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental, porquanto, não obstante tenha sido embargada a área de 457,167 hectares da sua propriedade rural pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, arrendou-a, "onde foi realizada colheita de arroz e milho, bem como plantio de soja" (fl. 59).
2. Apesar de sucinta, a decisão que manteve o recebimento da denúncia apontou, fazendo referência à acusação apresentada pelo Réu, que inexistem as hipóteses de rejeição da inicial acusatória ou de desclassificação para o delito de desobediência.
3. Nessa perspectiva, o entendimento está conformado à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificada no sentido de que "[...] a decisão que recebe a denúncia (CPP, art. 396) e aquela que rejeita o pedido de absolvição sumária (CPP, art. 397) não demandam motivação profunda ou exauriente, considerando a natureza interlocutória de tais manifestações judiciais, sob pena de indevida antecipação do juízo de mérito, que somente poderá ser proferido após o desfecho da instrução criminal , com a devida observância das regras processuais e das garantias da ampla defesa e do contraditório" (RHC 60.582/MT, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016; sem grifos no original).
4. O trancamento do processo-crime pela via do habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, a atipicidade do fato, a ausência de indícios capazes de fundamentar a acusação ou, ainda, a extinção da punibilidade, circunstâncias não evidenciadas no caso em apreço.
5. Não se pode impedir o Estado, antecipadamente, de exercer a função jurisdicional, coibindo-o de realizar o levantamento dos elementos de prova para a verificação da verdade dos fatos – o que constitui hipótese de extrema excepcionalidade, não evidenciada na espécie. É prematuro, pois, determinar desde já o trancamento do processo-crime, sendo certo que, no curso da instrução processual – que, segundo as informações prestadas pela Magistrada de primeiro grau, ainda não foi encerrada em razão da insistência da Defesa na oitiva de testemunha (fl. 337) –, poderá a Defesa demonstrar a veracidade das alegações.
6. Agravo regimental desprovido.
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VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (RELATORA):
A irresignação não prospera.
No caso, o Agravante foi denunciado, em 1.º/04/2016, como incurso no art. 68 da
Lei n. 9.605/1998, sob a acusação de que, no mês de julho de 2013, deixou de cumprir obrigação
de relevante interesse ambiental, porquanto, não obstante tenha sido embargada a área de
457,167 hectares da sua propriedade rural pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, arrendou-a, "onde foi realizada colheita de arroz e
milho, bem como plantio de soja" (fl. 59).
A inicial acusatória foi recebida pelo Juízo de primeira instância no dia 05/07/2016
nos seguintes termos (fl. 129):
"Encontrando-se presentes os indícios da autoria e da materialidade, recebo a denúncia em todos os seus termos e para todos os efeitos legais, contra Marcos Levi Bervig (cópia do documento de identificação à fl. 45), como incurso nas penas do artigo 68 da Lei n. 9.605/98.
Encaminhe-se o presente inquérito policial ao cartório distribuidor, a fim de ser convertido em ação penal.
Cite-se o acusado para oferecer resposta à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias (CPP, artigo 396), momento em que poderá arguir preliminares e alegar o que interessar à sua defesa, oferecer documentos e justificações, inclusive especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas (CPP, Artigo 396-A)."
Rechaçadas as hipóteses para o trancamento da ação penal, o Juízo a quo
ratificou o recebimento da inicial acusatória, in verbis (fl. 165):
"Em análise à defesa preliminar apresentada às fls. 72/93, inexistem quaisquer das hipóteses previstas nos incisos do artigo 397 do CPP.
A preliminar arguida pela defesa não merece acolhida, pois em análise aos autos verifico a comprovação da materialidade das infrações penais descritas na denúncia e indícios suficientes de autoria, consignando-se que o exame de corpo de delito, no presente caso, é dispensável ."
Na audiência de instrução e julgamento, o Magistrado, mais uma vez, indeferiu os
pleitos preliminares, sob a motivação de que as matérias se confundiam com o mérito da ação
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penal.
O Colegiado de origem, por sua vez, expôs as seguintes razões ao denegar a
ordem de habeas corpus (fls. 308-312; sem grifos no original):
"Consoante se depreende dos autos, a defesa, em sua resposta à acusação, suscitou várias preliminares, a saber: 1) nulidade da ação penal pela inépcia da denúncia; 2) desclassificação para o delito de desobediência; e 3) prescrição em relação ao delito de desobediência.
No mérito, negou a participação no crime descrito na peça acusatória.
[...]
A despeito da singeleza da decisão proferida pela autoridade coatora, não visualizo demonstrado o malsinado constrangimento ilegal a autorizar a concessão da ordem vindicada.
[...]
Apesar do posicionamento adotado pela 2ª Câmara Criminal, a meu viso, os argumentos empregados pela autoridade coatora, conquanto sucintos, se revelam suficientes para o prosseguimento da ação penal , pois examinou, ainda de maneira superficial, as alegações defensivas, não se podendo falar em carência de fundamentação.
[...]
A toda a evidência, a denúncia descreveu, com clareza solar, a conduta do denunciado, que, não obstante a interdição da área, supostamente a arrendou, descumprindo, assim, obrigação de relevante valor ambiental imposta pelo IBAMA .
Some-se a isso que eventual desclassificação de sua conduta para o delito de desobediência, por óbvio, é matéria que demanda dilação probatória, devendo ser analisada por ocasião do mérito da ação penal, se for o caso.
Neste ponto, faço minhas as palavras do Procurador de Justiça, Luiz Alberto Esteves Scaloppe, que, em seu substancioso parecer, assim se posicionou:
'Com efeito, repisa-se, no que concerne às preliminares suscitadas, as mesmas se tratam de matérias de mérito, cuja apreciação não cabe neste momento processual, sendo sua análise relegada ao momento da prolação da sentença.
Nesse ponto, vale ressaltar que a audiência de instrução e julgamento, a qual os impetrantes pretendiam suspender, já ocorreu, conforme se depreende das informações apresentadas pelo Juízo de primeiro grau, ocasião em que foi oportunizado ao paciente prazo para se manifestar acerca do interesse no acordo de não persecução penal'(ID n. XXXXX).
No tocante à pretensão do trancamento da ação penal, o Habeas Corpus presta-se a esse objetivo quando presente a falta de justa causa, ou seja, quando desponta, induvidosamente, sem a necessidade de avaliação profunda dos fatos, indícios e provas, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.
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[...]
Há indícios que apontam a relação do paciente com a conduta criminosa a ele imputada, corroborados pelos documentos que acompanharam a inicial e serviram para abalizar o entendimento do Juízo singular de piso para o recebimento da denúncia e determinar o prosseguimento da persecução penal'.
Como é cediço, 'em sede de habeas corpus somente deve ser obstada a ação penal se restar demonstrada, de forma indubitável, a atipicidade da conduta, a ocorrência de circunstância extintiva da punibilidade e a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito' [STJ, RHC 63.019/RO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 24/11/2015, DJe 01/12/2015].
A propósito, assim já decidiu este Sodalício:
'[...] O trancamento da ação penal pela estreita via do writ é medida que se admite em circunstância de excepcionalidade, apenas quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a falta de justa causa, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade [...]' [TJMT, HC XXXXX/2015, DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA, TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 03/02/2016, Publicado no DJE 18/02/2016].
'[...] O trancamento da ação penal é pretensão que deve ser acatada, exclusivamente, quando demonstrada, de plano, a inexistência do nexo causal entre a conduta do paciente e o ilícito que lhe foi imputado, o que não é o caso dos autos. [...]' [TJMT, HC XXXXX/2015, DES. RONDON BASSIL DOWER FILHO, SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 04/11/2015, Publicado no DJE 10/11/2015].
Segundo profícuo escólio de Renato Brasileiro de Lima, 'a expressão justa causa deve ser entendida como um lastro probatório mínimo indispensável para a instauração de um processo penal (prova da materialidade e indícios de autoria), funcionando como uma condição de garantia contra o uso abusivo do direito de acusar' [Manual de Processo Penal, 4. ed., Salvador: Editora Juspodivm, p. 1274].
A despeito dos relevantes argumentos fáticos e jurídicos aduzidos pelos impetrantes, não visualizo a propalada ausência de justa causa a desautorizar o prosseguimento da ação penal ."
No que se refere à alegação de ausência de fundamentação para o recebimento
da denúncia, constato que, apesar de sucinta, a decisão apontou, fazendo referência à acusação
apresentada pelo Réu, que inexistem as hipóteses de rejeição da inicial acusatória ou de
desclassificação para o delito de desobediência.
Nessa perspectiva, o entendimento desta Corte Superior de Justiça é no sentido
de que:
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"[...] a decisão que recebe a denúncia (CPP, art. 396) e aquela que rejeita o pedido de absolvição sumária (CPP, art. 397) não demandam motivação profunda ou exauriente, considerando a natureza interlocutória de tais manifestações judiciais, sob pena de indevida antecipação do juízo de mérito, que somente poderá ser proferido após o desfecho da instrução criminal , com a devida observância das regras processuais e das garantias da ampla defesa e do contraditório." (RHC 60.582/MT, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016; sem grifos no original.)
Cito, ainda, o seguinte precedente:
"PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. CRIME DE AMEAÇA. CONTRAVENÇÕES DE PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE E DO TRABALHO. RESPOSTA À ACUSAÇÃO. NULIDADE DA DECISÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO VERIFICAÇÃO. 2. IMPOSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO DO MÉRITO. DESNECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO EXAUSTIVA. 3. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE. 4. INÉPCIA DA DENÚNCIA. OBSERVÂNCIA DO ART. 41 DO CPP. AMPLA DEFESA PRESERVADA. 5. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NÃO VERIFICAÇÃO. MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA NARRADOS. COMPROVAÇÃO DOS FATOS. MOMENTO NÃO APROPRIADO. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL. 6. RECURSO EM HABEAS CORPUS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
[...]
2. Não se pode abrir muito o espectro de análise da resposta à acusação, sob pena de se invadir a seara relativa ao próprio mérito da demanda, que depende de prévia instrução processual para que o julgador possa formar seu convencimento . De fato, mostrar-se-ia temerário analisar certas teses, quer para acolher quer para rejeitar, antes da colheita de provas, principalmente em momento processual que autoriza a absolvição sumária apenas nas hipóteses elencadas de forma expressa pelo art. 397 do Código de Processo Penal.
3. O trancamento da ação penal somente é possível na via estreita do habeas corpus em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito.
4. Não há se falar em inépcia da inicial, haja vista os fatos se encontrarem devidamente narrados, em observância ao art. 41 do Código de Processo Penal. Com efeito, a recorrente teria, em tese, perturbado a tranquilidade da vítima, perturbando-a no trabalho e a ameaçando de forma velada, por e-mail, mensagens e telefonemas, fatos estes suficientes a subsidiar o início da ação penal. Dessarte, mister se faz que os fatos narrados sejam devidamente esclarecidos, durante a instrução probatória, momento apropriado para se obter a efetiva comprovação ou não da
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ocorrência dos fatos, da forma como narrados na inicial.
5. Da mesma forma, presente a justa causa, porquanto demonstrada a materialidade delitiva dos delitos imputados bem como os indícios de autoria, observando-se que as condutas descritas se mostram, em tese, típicas. Dessarte, não é possível, na via eleita, aferir a veracidade ou não da narrativa, por se tratar de matéria probatória, cuja sede própria para exame é durante a instrução processual. De fato, não se tratando de alegação aferível de pronto, sem a necessidade de revolvimento de provas, seu exame revela-se incompatível com o rito sumário do mandamus.
6. Recurso em habeas corpus a que se nega provimento." (RHC 90.684/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 03/05/2018, DJe 09/05/2018, sem grifos no original.)
Lado outro, o trancamento do processo-crime pela via do habeas corpus é
medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, sem a necessidade de exame
valorativo do conjunto fático ou probatório, a atipicidade do fato, a ausência de indícios capazes
de fundamentar a acusação ou, ainda, a extinção da punibilidade, circunstâncias não evidenciadas
no caso em apreço.
A denúncia descreve que (fl. 59; sem grifos no original):
"Consta que no mês de julho de 2013, na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, localizada no município de Santa Carmem/MT, termo desta cidade e comarca de Sinop/MT, o denunciado MARCOS LEVI BERVIG, consciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, deixou, tendo o dever legal de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental, consoante cópia do procedimento administrativo (fls. 4/17 e 21/27).
Restou apurado que o denunciado MARCOS LEVI BERVIG é proprietário da Fazenda Nossa Senhora Aparecida, localizada no município de Santa Carmem/MT, e, no dia 21 de fevereiro de 2013, foram embargados 457,167 hectares de área pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
Por fim, também restou apurado que o denunciado, mesmo com a aludida área embargada, interditada e suspensa de qualquer atividade, arrendou os 457,167 hectares de terra, onde foi realizada colheita de arroz e milho, bem como plantio de soja, descumprindo, assim, obrigação de relevante valor ambiental , imposta pelo IBAMA."
Para reconhecer como verdadeiras as alegações da Defesa de negativa de
autoria e materialidade do crime descrito na denúncia seria necessário, inevitavelmente, o
aprofundado reexame do conjunto fático-probatório, que é impróprio nesta via.
Dessa forma, não se pode impedir o Estado, antecipadamente, de exercer a
função jurisdicional, coibindo-o de realizar o levantamento dos elementos de prova para a
Superior Tribunal de Justiça
verificação da verdade dos fatos – o que constitui hipótese de extrema excepcionalidade, não evidenciada na espécie. É prematuro, pois, determinar desde já o trancamento do processo-crime, sendo certo que, no curso da instrução processual – que, segundo as informações prestadas pela Magistrada de primeiro grau, ainda não foi encerrada em razão da insistência da Defesa na oitiva de testemunha (fl. 337) –, poderá a Defesa demonstrar a veracidade das alegações.
Dessa forma, na ausência de argumento relevante que infirme as razões consideradas no julgado ora agravado, deve ser mantida a decisão por seus próprios fundamentos.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo regimental.
É o voto.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEXTA TURMA
AgRg no
Número Registro: 2020/0117660-5 HC 582.831 / MT
MATÉRIA CRIMINAL
Número Origem: XXXXX20208110000
EM MESA JULGADO: 15/09/2020
Relatora
Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. DOMINGOS SAVIO DRESCH DA SILVEIRA
Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
AUTUAÇÃO
IMPETRANTE : ALCIR FERNANDO CESA E OUTROS
ADVOGADOS : JIANCARLO LEOBET - MT010718 ALCIR FERNANDO CESA - MT017596 DARI LEOBET JUNIOR - MT021919 WESLEY DE ALMEIDA PEREIRA - MT023350
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
PACIENTE : MARCOS LEVI BERVIG
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO
ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes contra o Meio
Ambiente e o Patrimônio Genético
AGRAVO REGIMENTAL
AGRAVANTE : MARCOS LEVI BERVIG
ADVOGADOS : JIANCARLO LEOBET - MT010718 ALCIR FERNANDO CESA - MT017596 DARI LEOBET JUNIOR - MT021919 WESLEY DE ALMEIDA PEREIRA - MT023350
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Antonio
Superior Tribunal de Justiça
Saldanha Palheiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.