3 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1930404 SP 2021/0094704-2
Publicado por Superior Tribunal de Justiça
Detalhes da Jurisprudência
Processo
REsp 1930404 SP 2021/0094704-2
Publicação
DJ 27/04/2021
Relator
Ministro SÉRGIO KUKINA
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Decisão
RECURSO ESPECIAL Nº 1930404 - SP (2021/0094704-2) DECISÃO Trata-se de recurso especial manejado pelo Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo com fundamento no art. 105, III, a e c, da CF, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, assim ementado (fl. 239): TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. MULTA ADMINISTRATIVA FIXADA EM SALÁRIOS MÍNIMOS. ILEGALIDADE. ANUIDADES. NATUREZA TRIBUTÁRIA. FIXAÇÃO DELEGADA AOS CONSELHOS VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ADI 1717/DF. APELAÇÃO DESPROVIDA 1. As sanções pecuniárias do Conselho Regional de Farmácia são estabelecidas pela Lei nº 5.724/71 e fixadas em salários mínimos. O Pleno do E. Supremo Tribunal Federal considerou que a fixação da multa administrativa em número de salários mínimos, ofende o artigo 7º, inciso IV, da CF. 2. Conclui-se que o art. 1º, da Lei nº 5.724/71, não foi recepcionado pela Constituição Federal, razão pela qual é nula a cobrança da multa que utiliza o salário mínimo como critério de fixação. 3. Os conselhos de classe profissional têm natureza de autarquia sendo, portanto, pessoas jurídicas de direito público interno, assim, as anuidades exigidas por eles detém natureza jurídica tributária, razão pela qual se submetem aos princípios constitucionais da legalidade e da anterioridade, inclusive no tocante à fixação e alteração de alíquotas e base de cálculo, nos termos dos artigos 149 e 150, inciso I da Constituição Federal. 4. Por ocasião do julgamento da ADI nº 1.717, o E. Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade material do artigo 58 da Lei nº 9.649/98, que autorizava os conselhos de fiscalização profissional a fixar suas contribuições anuais. 5. Desse modo, em observância princípio da legalidade tributária conclui-se que as anuidades cobradas não podem ser criadas ou majoradas por meio de simples resolução. Esta interpretação se estende à Lei n.º 11.000/2004, que delegou aos conselhos competência para fixação das anuidades (contribuição à entidade profissional), visto que em clara ofensa ao princípio da legalidade tributária. 6. No caso em apreço, o título executivo relativo à cobrança das anuidades tem como fundamento legal o artigo 22, parágrafo único da Lei n. 3.820/60, que apenas estabelece a obrigatoriedade do pagamento de anuidade s pelas empresas que exploram serviços para os quais sejam necessárias atividades profissionais farmacêuticas. O referido diploma normativo não estabelece o valor das anuidades, ao revés, em seu artigo 25 estabelece que as taxas e anuidades serão fixadas pelos Conselhos Regionais. 7. Tratando-se de cobrança de dívida contendo débito cujo valor não consta de lei, conclui-se que a cobrança da anuidade é indevida. 8. Apelo desprovido. Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados ante a inexistência dos vícios elencados no art. 1022 do CPC. A parte recorrente aponta, além de divergência jurisprudencial, violação ao art. 24 da Lei n. 3.820/60, com a redação dada pelo art. 1º da Lei n. 5.724/71. Sustenta, em síntese, que não há óbice para a fixação de multa em salários mínimos, porquanto não se trata de indexação à política econômica, mas da estrita aplicação do Direito Administrativo Sancionador. É O RELATÓRIO. SEGUE A FUNDAMENTAÇÃO. A irresignação não prospera. Ao dirimir a controvérsia, a Corte regional consignou (fls. 237/238): O E. Supremo Tribunal Federal tem entendimento no sentido que o artigo 7º, IV, da Constituição Federal veda a utilização do salário mínimo como fator de indexação, confira-se: CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MULTA. SALÁRIO MÍNIMO. C.F., art. 7º, IV. I. - O que a Constituição veda, no art. 7º, IV, é a utilização do salário-mínimo para servir, por exemplo, como fator de indexação. Precedentes do STF: AI 169.269-AgR/MG e AI 179.844-AgR/MG, Galvão, 1ª Turma; AI 177.959-AgR/MG, Marco Aurélio, 2ª Turma e RE 230.528-AgR/MG, Velloso, 2ª Turma. II. - Agravo não provido. (AI 387594 AgR, Relator (a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 13/05/2003, DJ 06-06-2003 PP-00035 EMENT VOL-02113-05 PP-00862) O Pleno do E. Supremo Tribunal Federal examinou questão análoga no RE 237.965 e considerou que a fixação da multa administrativa em número de salários mínimos, ofende o artigo 7º, inciso IV, da CF, conforme havia sido assentado na ADI 1.425. Eis a ementa: Fixação de horário de funcionamento para farmácias no Município. Multa administrativa vinculada a salário mínimo. - Em casos análogos ao presente, ambas as Turmas desta Corte (assim a título exemplificativo, nos RREE 199.520, 175.901 e 174.645) firmaram entendimento no sentido que assim vem sintetizado pela ementa do RE 199.520: "Fixação de horário de funcionamento para farmácia no Município. Lei 8.794/78 do Município de São Paulo. - Matéria de competência do Município. Improcedência das alegações de violação aos princípios constitucionais da isonomia, da livre concorrência, da defesa do consumidor, da liberdade de trabalho e da busca ao pleno emprego. Precedente desta Corte. Recurso extraordinário conhecido, mas não provido". - Dessa orientação não divergiu o acórdão recorrido. - O Plenário desta Corte, ao julgar a ADIN 1425, firmou o entendimento de que, ao estabelecer o artigo 7º, IV, da Constituição que é vedada a vinculação ao salário -mínimo para qualquer fim,"quis evitar que interesses estranhos aos versados na norma constitucional venham a ter influência na fixação do valor mínimo a ser observado". Ora, no caso, a vinculação se dá para que o salário -mínimo atue como fator de atualização da multa administrativa, que variará com o aumento dele, o que se enquadra na proibição do citado dispositivo constitucional. - É, portanto, inconstitucional o § 1º do artigo 4º da Lei 5.803, de 04.09.90, do Município de Ribeirão Preto. Recurso extraordinário conhecido em parte e nela provido, declarando-se a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 4º da Lei 5.803, de 04.09.90, do Município de Ribeirão Preto. (RE nº 237.965, Rel. Min. Moreira Alves, j. 10.02.2000, Plenário, Dj 31/03/2000) Assim, conclui-se que o art. 1º, da Lei nº 5.724/71, não foi recepcionado pela Constituição Federal, razão pela qual é nula a cobrança da multa que utiliza o salário mínimo como critério de fixação. Verifica-se que o Tribunal de origem, ao concluir pela inviabilidade de fixação de multa com base no salário mínimo, adotou fundamentos eminentemente constitucionais, matéria insuscetível de ser apreciada na via do recurso especial, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. Fica prejudicada, pelo mesmo motivo, a análise do dissídio jurisprudencial. ANTE O EXPOSTO, não conheço do recurso especial. Levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, impõe-se à parte recorrente o pagamento de honorários advocatícios equivalentes a 20% (vinte por cento) do valor a esse título já fixado no processo (art. 85, § 11, do CPC/2015). Publique-se. Brasília, 22 de abril de 2021. Sérgio Kukina Relator