30 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1825716 - SC (2019/0200554-1)
RELATOR : MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA
EMBARGANTE : DOMINGOS BATTISTELLA
ADVOGADOS : FABIANA ROBERTA MATTANA CAVALLI E OUTRO(S) - SC016109 RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO - DF032147
EMBARGADO : PRUDENTIAL DO BRASIL VIDA EM GRUPO S.A.
ADVOGADOS : LODI MAURINO SODRE - SC009587 MARARRÚBIA SODRÉ GOULART - SC017388 RICARDO ZEFERINO GOULART E OUTRO(S) - SC017739
DECISÃO
Trata-se de embargos de divergência interpostos contra acórdão da Terceira
Turma deste Tribunal Superior, assim ementado (e-STJ fls. 711/712):
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA, COM BASE EM CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. CONTROVÉRSIA CONSISTENTE EM DEFINIR DE QUEM É O DEVER DE INFORMAR PREVIAMENTE O SEGURADO A RESPEITO DAS CLÁUSULAS RESTRITIVAS DE COBERTURA FIRMADA EM CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. ESTIPULANTE QUE, NA CONDIÇÃO DE REPRESENTANTE DO GRUPO DE SEGURADOS, CELEBRA O CONTRATO DE SEGURO EM GRUPO E TEM O EXCLUSIVO DEVER DE, POR OCASIÃO DA EFETIVA ADESÃO DO SEGURADO, INFORMAR-LHE ACERCA DE TODA A ABRANGÊNCIA DA APÓLICE DE SEGURO DE VIDA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se em identificar a quem incumbe o dever de prestar informação prévia ao segurado a respeito das cláusulas limitativas/restritivas nos contratos de seguro de vida em grupo, se da seguradora, se da estipulante, ou se de ambas, solidariamente.
2. Ausência, até o presente momento, de uma deliberação qualificada sobre o tema, consistente no julgamento de um recurso especial diretamente por órgão colegiado do STJ, em que se concede às partes a oportunidade de fazer sustentação oral. A despeito dessa conclusão, é de se reconhecer que a questão vem sendo julgada por esta Corte de Justiça, com base, sem exceção, em um julgado desta Terceira Turma (Recurso Especial n. 1.449.513/SP), que não tratou, pontualmente, da matéria em questão, valendo-se de argumento feito, obter dictum, com alcance diverso do ali preconizado.
2.1 Necessidade de enfrentamento da matéria por esta Turma julgadora, a fim de proceder a uma correção de rumo na jurisprudência desta Corte de Justiça, sempre salutar ao aprimoramento das decisões judiciais.
3. Como corolário da boa-fé contratual, já se pode antever o quanto sensível é para a higidez do tipo de contrato em comento, a detida observância, de parte a parte, do dever de informação. O segurado há de ter prévia, plena e absoluta ciência acerca da abrangência da garantia prestada pelo segurador, especificamente quanto aos riscos e eventos que são efetivamente objeto da cobertura ajustada, assim como aqueles que dela estejam excluídos. Ao
segurador, de igual modo, também deve ser concedida a obtenção de todas as informações acerca das condições e das qualidades do bem objeto da garantia, indispensáveis para a contratação como um todo e para o equilíbrio das prestações contrapostas.
4. Encontrando-se o contrato de seguro de vida indiscutivelmente sob o influxo do Código de Defesa do Consumidor, dada a assimetria da relação jurídica estabelecida entre segurado e segurador, a implementação do dever de informação prévia dá-se de modo particular e distinto conforme a modalidade da contratação, se "individual" ou se "em grupo".
5. A contratação de seguro de vida coletivo dá-se de modo diverso e complexo, pressupondo a existência de anterior vínculo jurídico (que pode ser de cunho trabalhista ou associativo) entre o tomador do seguro (a empresa ou a associação estipulante) e o grupo de segurados (trabalhadores ou associados).
5.1 O estipulante (tomador do seguro), com esteio em vínculo jurídico anterior com seus trabalhadores ou com seus associados, celebra contrato de seguro de vida coletivo diretamente com o segurador, representando-os e assumindo, por expressa determinação legal, a responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais perante o segurador.
5.2 O segurador, por sua vez, tem por atribuição precipua garantir os interesses do segurado, sempre que houver a implementação dos riscos devidamente especificados no contrato de seguro de vida em grupo, cuja abrangência, por ocasião da contratação, deve ter sido clara e corretamente informada ao estipulante, que é quem celebra o contrato de seguro em grupo.
5.3 O grupo de segurados é composto pelos usufrutuários dos benefícios ajustados, assumindo suas obrigações para com o estipulante, sobretudo o pagamento do prêmio, a ser repassado à seguradora.
6. É relevante perceber que, por ocasião da contratação do seguro de vida coletivo, não há, ainda, um grupo definido de segurados. A condição de segurado dar-se-á, voluntariamente, em momento posterior à efetiva contratação, ou seja, em momento em que as bases contratuais, especificamente quanto à abrangência da cobertura e dos riscos dela excluídos, já foram definidas pelo segurador e aceitas pelo estipulante. Assim, como decorrência do princípio da boa-fé contratual, é imposto ao segurador, antes e por ocasião da contratação da apólice coletiva de seguro, o dever legal de conceder todas as informações necessárias a sua perfectibilização ao estipulante, que é quem efetivamente celebra o contrato em comento. Inexiste, ao tempo da contratação do seguro de vida coletivo —
e muito menos na fase pré-contratual — qualquer interlocução direta da seguradora com os segurados, individualmente considerados, notadamente porque, nessa ocasião, não há, ainda, nem sequer definição de quem irá compor o grupo dos segurados.
7. Somente em momento posterior à efetiva contratação do seguro de vida em grupo, caberá ao trabalhador ou ao associado avaliar a conveniência e as vantagens de aderir aos termos da apólice de seguro de vida em grupo já contratada. A esse propósito, afigura-se indiscutível a obrigatoriedade legal de bem instruir e informar o pretenso segurado sobre todas as informações necessárias á tomada de sua decisão de aderir à apólice de seguro de vida contratada. Essa obrigação legal de informar o pretenso segurado previamente à sua adesão, contudo, deve ser atribuída exclusivamente ao estipulante, justamente em razão da posição jurídica de representante dos segurados, responsável que é pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais assumidas perante o segurador. Para o adequado tratamento da questão posta, mostra-se relevante o fato de que não há, também nessa fase contratual, em que o segurado adere à apólice de seguro de vida em grupo, nenhuma interlocução da seguradora com este, ficando a
formalização da adesão á apólice coletiva restrita ao estipulante e ao proponente.
8. Em conclusão, no contrato de seguro coletivo em grupo cabe exclusivamente ao estipulante, e não à seguradora, o dever de fornecer ao segurado (seu representado) ampla e prévia informação a respeito dos contornos contratuais, no que se inserem, em especial, as cláusulas restritivas.
9. Recurso especial improvido.
Defende a embargante a existência de dissenso jurisprudencial entre o aresto embargado e o entendimento firmado pela Quarta Turma do STJ, a respeito da
obrigação de comunicação ao segurado sobre as cláusulas restritivas da apólice de seguro em grupo.
Eis os julgados apresentados para fins de comprovação do suscitado
dissenso:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. CLÁUSULAS RESTRITIVAS. DEVER DE INFORMAÇÃO. SEGURADORA. NECESSIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Consoante a jurisprudência desta Corte, "a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e suas consequências, de modo a não induzi-los em erro" (AgInt no REsp 1.644.779/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/08/2017, DJe de 25/08/2017).
2. Tendo a Corte local assinalado que o dever de informação acerca dos termos do seguro cabia à estipulante do seguro, e não à seguradora, está justificada a reforma do acórdão atacado para determinar que aquele verifique eventual falha no cumprimento desse dever, a fim de se adequar ao entendimento do STJ.
3. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no REsp 1.842.559/SC, Relator Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 10/3/2020, DJe 31/3/2020.)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. DOENÇA OCUPACIONAL. EQUIPARAÇÃO A ACIDENTE PESSOAL. DEVER DE INFORMAÇÃO DA SEGURADORA. NECESSIDADE DE RETORNO DOS AUTOS. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a seguradora tem o dever de prestar informações ao segurado, mesmo nos contratos de seguro de vida em grupo. Tal responsabilidade não pode ser transferida integralmente à estipulante, eximindo a seguradora.
2. Impõe-se, no caso, o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que examine se foi adequadamente observado o dever de informação por parte da seguradora.
3. Agravo interno provido para dar parcial provimento ao recurso especial.
(AgInt no REsp 1.848.053/SC, Relator Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 10/3/2020, DJe 2/4/2020.)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA -DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA DA DEMANDADA.
1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a seguradora tem o dever de prestar informações ao segurado, mesmo nos contratos de seguro de vida em grupo. Precedentes de ambas Turmas de Direito Privado.
2. Tal responsabilidade não pode ser transferida, eximindo a seguradora, integralmente à estipulante, pois essa, segundo o artigo 801, § 1º, do Código Civil, "não representa o segurador perante o grupo segurado, e é o único responsável, para com o segurador, pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais".
3. Agravo interno desprovido.
(AgInt no REsp 1.835.185/SC, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 27/11/2019.)
Sustenta a parte embargante que seria indevida a restrição de cobertura
securitária que não foi previamente informada ao consumidor pela seguradora, não
sendo ônus exclusivo da estipulante comunicar o segurado sobre os termos
contratuais.
Assim, postula o provimento dos embargos.
É o relatório.
Decido.
Os presentes embargos são tempestivos e indicam divergência entre acórdão da Terceira Turma e julgado da Quarta Turma desta Corte Superior.
A recorrente realizou o necessário cotejo analítico entre as decisões, de maneira que, aparentemente, constata-se divergência em relação ao dever de
comunicação ao segurado sobre as cláusulas restritivas da apólice de seguro coletivo.
Vale registrar, ainda, que tanto no acórdão embargado quanto nos
paradigmas, foi apreciado o mérito da questão suscitada nestes embargos de divergência.
Desse modo, considerando que, em princípio, foram observados os
requisitos do art. 266, caput e § 4º, do RISTJ, ADMITO os embargos de divergência.
Dê-se vista ao embargado para impugnação, no prazo de 15 (quinze) dias
(art. 267 do RISTJ).
Após, ao Ministério Público Federal (art. 266, § 4º, do RISTJ).
Publique-se e intimem-se.
Brasília, 19 de abril de 2021.
Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA
Relator