30 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.825.716 - SC (2019/0200554-1)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : DOMINGOS BATTISTELLA
ADVOGADO : FABIANA ROBERTA MATTANA CAVALLI E OUTRO (S) - SC016109
RECORRIDO : ITAÚ SEGUROS S/A
ADVOGADOS : LODI MAURINO SODRE - SC009587 MARARRÚBIA SODRÉ GOULART - SC017388 RICARDO ZEFERINO GOULART E OUTRO (S) - SC017739 EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA, COM BASE EM CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. CONTROVÉRSIA CONSISTENTE EM DEFINIR DE QUEM É O DEVER DE INFORMAR PREVIAMENTE O SEGURADO A RESPEITO DAS CLÁUSULAS RESTRITIVAS DE COBERTURA FIRMADA EM CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. ESTIPULANTE QUE, NA CONDIÇÃO DE REPRESENTANTE DO GRUPO DE SEGURADOS, CELEBRA O CONTRATO DE SEGURO EM GRUPO E TEM O EXCLUSIVO DEVER DE, POR OCASIÃO DA EFETIVA ADESÃO DO SEGURADO, INFORMAR-LHE ACERCA DE TODA A ABRANGÊNCIA DA APÓLICE DE SEGURO DE VIDA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se em identificar a quem incumbe o dever de prestar informação prévia ao segurado a respeito das cláusulas limitativas/restritivas nos contratos de seguro de vida em grupo, se da seguradora, se da estipulante, ou se de ambas, solidariamente.
2. Ausência, até o presente momento, de uma deliberação qualificada sobre o tema, consistente no julgamento de um recurso especial diretamente por órgão colegiado do STJ, em que se concede às partes a oportunidade de fazer sustentação oral. A despeito dessa conclusão, é de se reconhecer que a questão vem sendo julgada por esta Corte de Justiça, com base, sem exceção, em um julgado desta Terceira Turma ( Recurso Especial n. 1.449.513/SP), que não tratou, pontualmente, da matéria em questão, valendo-se de argumento feito, obter dictum, com alcance diverso do ali preconizado.
2.1 Necessidade de enfrentamento da matéria por esta Turma julgadora, a fim de proceder a uma correção de rumo na jurisprudência desta Corte de Justiça, sempre salutar ao aprimoramento das decisões judiciais.
3. Como corolário da boa-fé contratual, já se pode antever o quanto sensível é para a higidez do tipo de contrato em comento, a detida observância, de parte a parte, do dever de informação. O segurado há de ter prévia, plena e absoluta ciência acerca da abrangência da garantia prestada pelo segurador, especificamente quanto aos riscos e eventos que são efetivamente objeto da cobertura ajustada, assim como aqueles que dela estejam excluídos. Ao segurador, de igual modo, também deve ser concedida a obtenção de todas as informações acerca das condições e das qualidades do bem objeto da garantia, indispensáveis para a contratação como um todo e para o equilíbrio das prestações contrapostas.
4. Encontrando-se o contrato de seguro de vida indiscutivelmente sob o influxo do Código de Defesa do Consumidor, dada a assimetria da relação jurídica estabelecida entre segurado e segurador, a implementação do dever de informação prévia dá-se de modo particular e distinto conforme a modalidade da contratação, se "individual" ou se "em grupo".
5. A contratação de seguro de vida coletivo dá-se de modo diverso e complexo, pressupondo a existência de anterior vínculo jurídico (que pode ser de cunho trabalhista ou associativo) entre o tomador do seguro (a empresa ou a associação estipulante) e o grupo de segurados (trabalhadores ou associados).
5.1 O estipulante (tomador do seguro), com esteio em vínculo jurídico anterior com seus
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trabalhadores ou com seus associados, celebra contrato de seguro de vida coletivo diretamente com o segurador, representando-os e assumindo, por expressa determinação legal, a responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais perante o segurador.
5.2 O segurador, por sua vez, tem por atribuição precípua garantir os interesses do segurado, sempre que houver a implementação dos riscos devidamente especificados no contrato de seguro de vida em grupo, cuja abrangência, por ocasião da contratação, deve ter sido clara e corretamente informada ao estipulante, que é quem celebra o contrato de seguro em grupo.
5.3 O grupo de segurados é composto pelos usufrutuários dos benefícios ajustados, assumindo suas obrigações para com o estipulante, sobretudo o pagamento do prêmio, a ser repassado à seguradora.
6. É relevante perceber que, por ocasião da contratação do seguro de vida coletivo, não há, ainda, um grupo definido de segurados. A condição de segurado dar-se-á, voluntariamente, em momento posterior à efetiva contratação, ou seja, em momento em que as bases contratuais, especificamente quanto à abrangência da cobertura e dos riscos dela excluídos, já foram definidas pelo segurador e aceitas pelo estipulante. Assim, como decorrência do princípio da boa-fé contratual, é imposto ao segurador, antes e por ocasião da contratação da apólice coletiva de seguro, o dever legal de conceder todas as informações necessárias a sua perfectibilização ao estipulante, que é quem efetivamente celebra o contrato em comento. Inexiste, ao tempo da contratação do seguro de vida coletivo — e muito menos na fase pré-contratual — qualquer interlocução direta da seguradora com os segurados, individualmente considerados, notadamente porque, nessa ocasião, não há, ainda, nem sequer definição de quem irá compor o grupo dos segurados.
7. Somente em momento posterior à efetiva contratação do seguro de vida em grupo, caberá ao trabalhador ou ao associado avaliar a conveniência e as vantagens de aderir aos termos da apólice de seguro de vida em grupo já contratada. A esse propósito, afigura-se indiscutível a obrigatoriedade legal de bem instruir e informar o pretenso segurado sobre todas as informações necessárias à tomada de sua decisão de aderir à apólice de seguro de vida contratada. Essa obrigação legal de informar o pretenso segurado previamente à sua adesão, contudo, deve ser atribuída exclusivamente ao estipulante, justamente em razão da posição jurídica de representante dos segurados, responsável que é pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais assumidas perante o segurador. Para o adequado tratamento da questão posta, mostra-se relevante o fato de que não há, também nessa fase contratual, em que o segurado adere à apólice de seguro de vida em grupo, nenhuma interlocução da seguradora com este, ficando a formalização da adesão à apólice coletiva restrita ao estipulante e ao proponente.
8. Em conclusão, no contrato de seguro coletivo em grupo cabe exclusivamente ao estipulante, e não à seguradora, o dever de fornecer ao segurado (seu representado) ampla e prévia informação a respeito dos contornos contratuais, no que se inserem, em especial, as cláusulas restritivas.
9. Recurso especial improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 27 de outubro de 2020 (data do julgamento).
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RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:
Domingos Battistella interpõe recurso especial, fundado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
Subjaz ao presente recurso especial “ação de cobrança com pedido liminar de exibição de documentos”, promovida por Domingos Battistella contra Itaú Seguros S.A., tendo por propósito obter a indenização securitária, prevista na apólice de seguro de vida em grupo para a cobertura do risco “invalidez permanente por acidente de cônjuge”, contratada pela empregadora de sua esposa (BRF Brasil Foods S.A. – estipulante).
Em sua exordial (e-STJ, fl. 1-16), o demandante narrou, em resumo, ter adquirido patologias em sua coluna lombar e cervical, bem como nos membros superiores, devido ao trabalho realizado durante toda a sua vida, consistindo, portanto, em doenças ocupacionais, ou seja, aquelas adquiridas ou agravadas em razão da atividade laboral, equiparadas ao acidente de trabalho, a acarretar-lhe incapacidade para o trabalho.
Informou o autor, ainda, ser casado com Fátima Ana Mezacasa Battistella, funcionária da empresa Sadia S.A., atual BRF, desde 04/09/2012, e incluída em seguro de vida em grupo, o qual estabelece a cobertura para INVALIDEZ PERMANENTE TOTAL OU PARCIAL POR ACIDENTE DO CÔNJUGE, ora vindicada.
Devidamente citada, Itaú Seguros S.A. rechaçou integralmente a pretensão autoral em sua peça contestatória (e-STJ, fls. 41-55), sob o argumento central de que a situação relatada pela parte demandante não se amolda a nenhuma das hipóteses de cobertura prevista na apólice de seguro de vida em grupo em questão. Salientou a seguradora demandada inexistir cobertura para o cônjuge em eventos decorrentes de Invalidez Funcional Permanente Total por Doença. Assinalou, outrossim, que o direito à indenização securitária por Invalidez Funcional Permanente Total por Doença pressupõe a perda da existência independente do segurado, ou doença em fase terminal, conforme determinado nas Condições Gerais do Seguro, em nada se referindo à atividade laborativa
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do segurado. Asseverou, ainda, que, mesmo que se reconhecesse possível equiparar a
doença do autor a acidente do trabalho, tal situação também configuraria risco
expressamente excluído na apólice de seguro de vida em grupo.
Em primeira instância, o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de
Concórdia/SC julgou improcedente o pedido formulado na inicial, resolvendo o mérito, nos
moldes do art. 487, I, do CPC. Reconheceu-se, em suma, que o dever de informar,
sobretudo acerca das restrições à cobertura securitária, incumbe ao estipulante, e não ao
segurador. Especificamente sobre o evento narrado pelo demandante, assinalou-se que
este não se encontra, efetivamente, inserto nos riscos cobertos pela apólice de seguro de
vida em grupo.
Pela relevância, transcreve-se o seguinte excerto da fundamentação adotada
(e-STJ, fls 214-219):
Do dever de informação.
Inicialmente, quanto ao dever de informar das restrições à cobertura securitária, impende salientar que tal incumbência recai sobre o estipulante, e não sobre o segurador.
Nesse aspecto, o contrato de seguro individual destoa da modalidade em grupo, conforme bem distingue o colendo STJ:
[...]
"8. No seguro de vida em grupo, há entre o estipulante e o grupo segurado manifesta relação contratual de representatividade, situação na qual alguém, mandatário ou procurador, recebe poderes de outrem, mandante, para, em seu nome, praticar atos e administrar interesses. (...)" ( REsp 1170855/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 16/12/2015) (grifos nossos).
Segundo o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, portanto, o estipulante ocuparia a posição de mandatário dos segurados, e como representante, caberia a ele o dever de informar o segurado.
Não se pode extrair outra conclusão à luz do que preconiza a Resolução 41/2000 do Conselho Nacional dos Seguros Privados (CNSP), a qual conceitua estipulante como "a pessoa jurídica que contrata a apólice coletiva de seguros, ficando investido dos poderes de representação dos segurados perante às sociedades seguradoras".
Tal normativa simplesmente reproduz o que já preconizava o Decreto-lei 73/1966, no art. 21, § 2º.
[...]
Na mesma senda, a Resolução 107/2004 do CNSP, que no art. 3º, III prevê que é obrigação do estipulante - e não da seguradora -"fornecer ao segurado, sempre que solicitado, quaisquer informações relativas ao contrato de seguro".
Assim sendo, inexiste dever do segurador de informar o segurado, no contrato de seguro em grupo, porquanto os interesses deste são
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representados pelo estipulante, o qual deve prestar informações contratuais ao segurado.
Da cobertura securitária.
Impende esclarecer, ab initio, que a cobertura securitária para cônjuge limita-o se à invalidez permanente decorrente de acidente, consoante se extrai das "Coberturas Contratadas" disciplinados à fl. 66.
Nesse ínterim, insta afastar a almejada equiparação de doença ocupacional ao conceito de acidente pessoal no contrato de seguro em grupo, na medida em que essa analogia conspira em desfavor dos atos normativos concernentes ao tema, além dos princípios da autonomia privada e da força obrigatória dos contratos.
Cumpre consignar que o contrato acostado aos autos (fls. 118-148), o conceito de acidente é definido como "o evento com data caracterizada, exclusivo e diretamente externo, súbito, involuntário, violento e causador de lesão física, que, por si só e independentemente de toda e qualquer outra causa, tenha como consequência direta, a morte ou a invalidez permanente total ou parcial do Segurado, ou que tome necessário tratamento médico".
A documentação ofertada com a contestação também informa que são riscos excluídos da cobertura acidentária:
a) doenças profissionais (doença ortopédica relacionada ao trabalho (DORT), lesão por trauma continuado ou contínuo (LTC) ou de lesão por o esforço repetitivo (LER), quaisquer que sejam suas causas, ainda que provocadas, desencadeadas ou agravadas direta ou indiretamente por acidente, ressalvadas as infecções, estados septicêmicos e embolias, resultantes de ferimento visível;
[...]
d) as situações reconhecidas por instituições oficiais de previdência ou o assemelhadas, como "invalidez acidentaria", nas quais o evento causador da lesão não se enquadre integralmente no conceito de Acidente Pessoal, o definido nestas Condições Contratuais;
Nessa mesma toada, a Resolução n. 117/2004 da CNSP, no art. 5º, I, "b1" e O "b3" prescreve como excluídas do conceito de acidente pessoal "as doenças, incluídas as profissionais, quaisquer que sejam suas causas [...]" e "as lesões decorrentes, dependentes, predispostas ou facilitadas por esforços repetitivos ou microtraumas F -- (i) cumulativos [...] bem como as suas consequências pós-tratamentos, inclusive cirúrgicos, em o qualquer tempo".
[...]
Destarte, em atenção ao convencionado entre as partes, para fazer jus à cobertura da invalidez, a ocorrência de acidente se mostra imprescindível.
No caso em comento, consoante se infere da inicial, o autor não exibe incapacidade laborativa decorrente acidente, mas sim de doença ocupacional, razão pela qual a sua pretensão não merece acolhimento.
Irresignado, Domingos Battistella interpôs recurso de apelação (e-STJ, fls.
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223-315), ao qual o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina negou provimento, em
acórdão assim ementado (e-STJ, fls. 389-390):
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA POR INVALIDEZ PERMANENTE POR ACIDENTE DO CÔNJUGE. NULIDADE DA SENTENÇA. OFENSA AO DISPOSTO NO PARÁGRAFO PRIMEIRO DO ARTIGO 489 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECISÃO FUNDAMENTADA. DOENÇA PROFISSIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE EQUIPARAÇÃO AO ACIDENTE PESSOAL. RISCO EXCLUÍDO DA APÓLICE. GARANTIA DE INVALIDEZ FUNCIONAL POR DOENÇA (IFPD). ARTIGO 17 DA CIRCULAR N. 302/2005 DA SUSEP. NÃO OCORRÊNCIA DA "PERDA DA EXISTÊNCIA INDEPENDENTE DO SEGURADO". INCAPACIDADE NÃO VINCULADA À INVALIDEZ PROFISSIONAL. CLÁUSULA NÃO ABUSIVA. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DOS RISCOS DO CONTRATO (ART. 757 DO CÓDIGO CIVIL). INFORMAÇÕES SOBRE O CONTEÚDO DA AVENÇA. RESPONSABILIDADE DA ESTIPULANTE. INDENIZAÇÃO NEGADA. RECURSO DESPROVIDO.
"Não há falar em nulidade da decisão por ausência de fundamentação se o julgador a quo, ainda que de forma sucinta, expôs o direito aplicável ao caso" (TJSC, Apelação Cível n. 0500113-66.2012.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. em 27-4-2017).
"Salvo disposição contratual em sentido contrário, a doença ocupacional não pode ser equiparada ao conceito de 'acidente pessoal' previsto nos contratos de seguro de pessoas" (TJSC, Apelação Cível n. 0312023-80.2015.8.24.0018, de Chapecó, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. em 19-9-2017).
Devido o pagamento da indenização securitária decorrente de invalidez funcional permanente por doença quando o quadro clínico apresentado pelo segurado inviabilizar, de forma irreversível, o pleno exercício de suas relações autonômicas.
A responsabilidade pelas informações sobre o conteúdo do contrato, condições gerais e cláusulas limitativas é da estipulante e não da seguradora, pois àquela compete representar os interesses do segurado, nos casos de seguro "G de vida em grupo, em razão da natureza jurídica desse tipo de contratação.
Opostos embargos de declaração (e-STJ, fls. 401-424), estes foram
rejeitados (e-STJ, fls. 428-435).
Domingos Battistella, nas razões do seu recurso especial, defende a
ocorrência de violação dos arts. 489 e 1.022 do Código de Processo Civil; 2º, 3º, 4º, 6º, 14,
46, 47, 51, IV, e § 1º, e 54 do Código de Defesa do Consumidor; 19, 20 e 21 da Lei
8.213/1991; 166 do Código Civil; 54, inciso I, II, III, 58, § 12, 60, 63 e 64 da Resolução
117/2004 CNSP ; e art. 97 da Circular n. 302/2005 da Susep, além de dissenso
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jurisprudencial.
Para tanto, argumenta, de início, que, a título de"prova nova", mediante a consulta pública realizada perante a Susep, esta declarou que o dever de informação é tanto da estipulante, como da seguradora. Afirma, no ponto, inexistir qualquer comprovação de que as condições gerais foram disponibilizadas ao proponente previamente à sua adesão, o que contraria a declaração da Susep, também em consulta pública, quanto à necessidade de que tais documentos sejam apresentados previamente.
Em preliminar, pondera que o Tribunal de origem incorreu em negativa de prestação jurisdicional, pois deixou de demonstrar a superação do entendimento do STJ no AgRg no AREsp 589.599/RS (DJe 7/3/2016), que reconhece ser da seguradora o dever de esclarecer o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado. Registra"que a decisão constante no AgRg no AREsp 589.599 é a mesma constante no Recurso Especial julgado sob a sistemática dos Recursos Repetitivos 1.449.513"(e-STJ, fl. 456). Aduz, ainda, que a Corte estadual não demonstrou a ocorrência de mudança de posicionamento no âmbito do STJ, que continua a entender que doença ocupacional se equipara a acidente.
Alega, também, que o Tribunal de origem não se manifestou sobre os dispositivos legais indicados como violados.
No mérito, defende, em síntese, ser dever da seguradora, e não apenas do estipulante, prestar as informações aos segurados sobre as cláusulas limitativas de cobertura, inclusive previamente à adesão à apólice de seguro, devendo-se interpretar de forma favorável ao consumidor. Pondera não existir, nos autos, nenhum comprovante de ciência das condições da apólice e condições complementares tanto para a estipulante quanto para o consumidor.
Anota, no ponto, que (e-STJ, fl. 475):
a SUSEP demonstra que a Resolução CNSP 117/04 aplica-se ao caso dos seguros de vida em grupo,"seguro de pessoas"e uma vez que impera o fato de que a norma específica se sobrepõe a norma geral deve ser assegurado ao consumidor a aplicação das normas previstas na Resolução 117/2004, notadamente o dever de a seguradora prestar a cada componente do grupo segurado as informações necessárias, daí porque mais uma vez necessária a reforma da decisão.
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Reitera, assim, que"as condições de cobertura continham Informações que levavam o entendimento do consumidor de haver cobertura para doença ocupacional, pois NÃO LHE FOI EXPLICADO O ALCANCE DO CONCEITO DE ACIDENTE. HOUVE FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO"(e-STJ, fl. 481). Anota, pois, ser" incontroverso que a apólice emitida pela recorrida não informa quanto à excludente por ela invocada, muito pelo contrário, pois faz presumir para o trabalhador, que aderiu ao seguro dentro de seu ambiente de trabalho, intermediado por sua empregadora, que as doenças ocupacionais estariam cobertas pelo seguro "(e-STJ, fls. 481-482).
Assinala, inclusive, que,"no caso concreto, não há o mínimo de destaque das cláusulas contratuais limitativas de direitos - sendo que negritar a cláusula, segundo o STJ não é destacá-la - de modo que não há que se falar em sua aplicação, ante a total abusividade das mesmas, daí porque A DECLARAÇÃO ASSINADA não tem validade, daí porque a decisão violou o artigo supra mencionado [art. 54, § 4º, do CDC]"(e-STJ, fl. 496).
Sustenta, também, que"uma vez existindo o conceito de acidente de trabalho e tendo a apólice a cobertura para 'INVALIDEZ PERMANENTE TOTAL OU PARCIAL POR ACIDENTE' e uma vez que o conceito de acidente de trabalho equipara a doença profissional com o acidente, conforme artigos acima transcritos [arts. 19, 20 e 21 da Lei 8.213/1991], a decisão merece reforma, pois 'existindo ACIDENTE não pode haver distinção entre acidente pessoal e acidente de trabalho decorrente de doença ocupacional, JÁ QUE O CONCEITO DE ACIDENTE É UM SÓ, não podendo valer 'somente para uns e deixar de existir para outros"' (e-STJ, fl. 509).
Acrescenta que,"no Recurso Especial julgado sob a sistemática dos Recursos Repetitivos 1.449.513, o Superior Tribunal de Justiça, analisando caso de seguro de vida em grupo, muito embora tenha entendido que não é abusiva a cobertura de IFPD, igualmente deixou consignado na ementa do julgado que [...]: 'De qualquer modo, a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não induzi-los em erro. ( REsp 1.449.513/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Boas Cueva, Terceira Turma, julgado em 05/03/2015, DJe 19/03/2015)'"- fls. 512-513 (e-STJ).
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Por fim, aponta a existência de dissenso jurisprudencial.
A parte adversa apresentou contrarrazões às fls.678-693 (e-STJ). É o relatório.
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VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR):
A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se, precipuamente, em identificar a quem incumbe o dever de prestar informação prévia ao segurado a respeito das cláusulas limitativas/restritivas nos contratos de seguro de vida em grupo , se da seguradora, se da estipulante, ou se de ambas, solidariamente.
Antes, propriamente, de adentrar a análise da questão posta, reputo necessário tecer algumas considerações quanto à relevância da presente deliberação, na medida em que pode significar – e, segundo penso, é o mais acertado a se fazer –, uma correção de rumos nas decisões sobre a matéria que têm sido proferidas unipessoalmente pela totalidade dos Ministros integrantes das Turmas de Direito Privado do STJ, e confirmadas em agravo interno.
Para bem situar a questão que ora se coloca, registre-se que um número significativo de casos, em sua grande maioria advindos do Estado de Santa Catarina, aportou no Superior Tribunal de Justiça, veiculando idêntica questão jurídica: identificar de quem é o dever de prestar informações ao segurado , no âmbito do contrato de seguro de vida em grupo , se da Seguradora, se do estipulante, ou se de ambos, solidariamente.
Justamente em virtude dessa multiplicidade de casos, o Presidente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, valendo-se do disposto no § 1º do art. 1.036 do CPC, reputou oportuno e conveniente selecionar alguns recursos especiais, como representativos da controvérsia.
Um desses recursos, a título de exemplo, foi o REsp 1.782.032/SC, distribuído ao eminente Ministro Marco Buzzi, que, sem deixar de exaltar a salutar iniciativa do TJSC, indeferiu a afetação, por reconhecer que a questão, até aquele momento, não tinha sido enfrentada, detidamente em seu mérito, pelas Turmas integrantes de Direito Privado, deixando assente, inclusive, que os julgados desta Corte de Justiça que reconhecem ser da seguradora o dever de informação ao consumidor/segurado foram exarados no bojo de contrato de seguro de vida individual, e não em seguro de vida
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coletivo, como são os casos em questão, que possuem possivelmente tratamento
particular.
Em face da pertinência dos fundamentos adotados na referida decisão,
publicada em 21/5/2019, reproduzo-os abaixo:
1. Cinge-se a discussão em definir a seguinte tese jurídica:"Identificação da responsabilidade do dever de informação ao segurado a respeito das cláusulas contratuais limitativas/restritivas nos contratos de seguro de vida em grupo, se da seguradora, se da estipulante, ou solidariamente de ambas".
Com efeito, não se desconhece a relevância dos temas envolvidos na presente discussão, contudo, observando-se a regra do art. 1.036 do NCPC c/c art. 256 do RISTJ, inviável a admissão do presente recurso especial ao rito dos repetitivos.
A Segunda Seção tem adotado, como salvaguarda da segurança jurídica, o posicionamento de somente afetar ao rito dos recursos repetitivos aqueles temas que já tenham sido objeto de jurisprudência consolidada no âmbito das Turmas que a integram (ut. REsp 1.686.022/MT, desta Relatoria, DJe de 04/12/2017; REsp 1.667843/SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Dje de 10/12/2017).
Em pesquisa jurisprudencial no âmbito desta Corte Superior não foram localizados precedentes nos quais a temática envolvendo o dever de informação da estipulante tenha sido analisado, no mérito, bem ainda, quanto à seguradora, verificou-se que os julgados nos quais foi responsabilizada pelo não cumprimento do dever de informação são vinculados a seguros de vida individuais e não coletivos como é do presente caso.
Dessa forma, verifica-se que o tema não está suficientemente discutido, tampouco há entendimento amadurecido sobre ele, revelando-se, nesse contexto, a teor do art. 1.036, do NCPC, inadequado atribuir-lhe os efeitos que advirão de um julgamento de natureza repetitiva.
Assim, é conveniente a não afetação, por ora, do tema objeto da presente controvérsia ao julgamento sob o rito do art. 1.030 do Código de Processo Civil de 2015, devendo a questão subjacente ao presente recurso especial ser melhor analisada pelo colegiado das Turmas quem compõem a eg. Segunda Seção.
2. Do exposto, nos termos do art. 256-F, § 4º, do RISTJ, rejeita-se a indicação do presente recurso especial como representativo de controvérsia.
Determinada a desafetação do presente apelo do procedimento dos recursos repetitivos, comunique-se o teor da presente decisão aos demais integrantes da Segunda Seção, aos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal.
Efetivamente, parece-me absolutamente correta e fidedigna à realidade dos
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fatos a constatação de que o tema em questão – responsabilidade pelo dever de informação em contrato de seguro de vida coletivo – não foi objeto de uma"deliberação qualificada", nos dizeres da Ministra Nancy Andrighi, consistente no julgamento de um recurso especial diretamente por órgão colegiado do STJ, em que se concede às partes a oportunidade de fazer sustentação oral.
A despeito dessa conclusão, os recursos especiais acima mencionados, vem sendo julgados, monocraticamente, pela totalidade dos Ministros integrantes das Turmas de Direito Privado do STJ, com base, sem exceção, em um julgado desta Terceira Turma que – a mim me parece – não tratou, pontualmente, da matéria em questão.
Refiro-me ao Recurso Especial n. 1.449.513/SP (Terceira Turma, DJe 19/03/2015), em que a discussão ali tratada, corretamente delimitada pelo relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva em seu voto, cingiu-se a" definir se o seguro de Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (FPD ou IPD-F) exige, para fins de pagamento de indenização securitária, a incapacidade definitiva e total do segurado para a sua atividade laborativa específica ou se possui outros pressupostos, sem correlação com a profissão do contratante ".
Para a discussão ali travada, como se vê, mostrou-se absolutamente indiferente saber se a cobertura em questão teria se dado no bojo de um seguro de vida individual, ou se no bojo de um seguro de vida coletivo. Por acaso, no referido recurso especial, a discussão quanto à legalidade da cobertura questionada deu-se no âmbito de um contrato de seguro coletivo.
Relevante destacar, principalmente, que não houve, no bojo do aludido recurso especial, nenhuma discussão pontual a respeito de a quem incumbiria o dever de informar, controvertendo-se, basicamente, se seria ou não abusiva a cláusula contratual que exige a invalidez total e permanente do segurado para quaisquer atividades, a fim de que se considere verificado o sinistro. Essa conclusão pode ser extraída a partir da delimitação feita pelo Relator, acima transcrita, absolutamente consentânea com a matéria devolvida pela parte recorrente, constante no relatório do acórdão.
Note-se que o Relator, em seu judicioso voto, após reconhecer a validade da disposição contratual, anotou a necessidade, inquestionável, ressalta-se, de se observar o princípio da informação, tão caro às relações consumeristas.
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Esse apontamento, constou da ementa, que ora se transcreve, com
destaque em negrito:
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO COM ADICIONAL DE COBERTURA POR INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA - IFPD. PATOLOGIA DA COLUNA LOMBAR CONTROLADA POR CIRURGIA.
INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE PARA A PROFISSÃO. DESEMPENHO DE ATIVIDADES LABORAIS LEVES. DEFINIÇÃO DA APÓLICE: INVALIDEZ FUNCIONAL. ATIVIDADES AUTONÔMICAS DA VIDA DIÁRIA. PRESERVAÇÃO.
INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA INDEVIDA.
1. A Circular SUSEP nº 302/2005 vedou o oferecimento da cobertura de Invalidez Permanente por Doença (IPD), em que o pagamento da indenização estava condicionado à impossibilidade do exercício, pelo segurado, de toda e qualquer atividade laborativa, pois era difícil a sua caracterização ante a falta de especificação e de transparência quanto ao conceito de"invalidez"nas apólices, havendo também confusão entre o seguro privado e o seguro social, o que gerou grande número de disputas judiciais. Em substituição, foram criadas duas novas espécies de cobertura para a invalidez por doença: Invalidez Laborativa Permanente Total por Doença (ILPD ou IPD-L) e Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD ou IPD-F).
2. Na Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD), a garantia do pagamento da indenização é no caso de invalidez consequente de doença que cause a perda da existência independente do segurado, ocorrida quando o quadro clínico incapacitante inviabilizar de forma irreversível o pleno exercício das relações autonômicas do segurado. Já na cobertura de Invalidez Laborativa Permanente Total por Doença (ILPD), há a garantia do pagamento de indenização em caso de invalidez laborativa permanente total, consequente de doença para a qual não se pode esperar recuperação ou reabilitação com os recursos terapêuticos disponíveis no momento de sua constatação, para a atividade laborativa principal do segurado.
Logo, a garantia de invalidez funcional não tem nenhuma vinculação com a invalidez profissional.
3. Embora a cobertura IFPD (invalidez funcional) seja mais restritiva que a cobertura ILPD (invalidez profissional ou laboral), não há falar em sua abusividade ou ilegalidade, tampouco em ofensa aos princípios da boa-fé objetiva e da equidade, não se constatando também nenhuma vantagem exagerada da seguradora em detrimento do consumidor. De qualquer modo, a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não induzi-los em erro.
4. Recurso especial não provido.
( REsp 1449513/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/03/2015, DJe 19/03/2015)
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É dizer, a partir de um apontamento feito, obter dictum, no voto condutor, proferido ao ensejo do julgamento do REsp 1.449.513/SP, constante da ementa, passou-se a concluir que a questão em comento estaria pacificada.
Mais do que a mera reprodução dessa assertiva feita como reforço argumentativo (na medida em que não era essa a questão central em julgamento) – o que, em si, já se me afigura imprópria a subsidiar a afirmativa de que a questão estaria pacificada no âmbito deste Tribunal Superior –, é forçoso reconhecer, a meu juízo, que as decisões desta Corte de Justiça que se seguiram, de um modo geral, passaram a aplicar tal assertiva, inclusive, de modo equivocado.
A aplicação equivocada do referido argumento periférico, conforme se demonstrará, confunde-se com o próprio mérito da questão posta em julgamento, que merecerá, por isso, maior aprofundamento. Mas é oportuno, desde já, explicitá-lo, a fim de demonstrar a necessidade de se proceder a propalada correção de rumos.
Como dito, após reconhecer a validade da disposição contratual, consignou o Relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a necessidade, inquestionável, de se observar o princípio da informação, nos seguintes termos:"De qualquer modo, a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não induzi-los em erro".
Por se tratar de argumento acessório, como visto, mostrou-se desnecessário maior imersão na questão. Em todo caso, em análise mais acurada da matéria, quer me parecer – especialmente porque o relator tomou o cuidado de especificar o tipo de seguro entre parênteses – que a proposição, em verdade, foi a de que cabe à seguradora sempre esclarecer previamente o consumidor, no caso de contrato de seguro individual, e ao estipulante, no caso de seguro em grupo ,"sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não induzilos a erro".
Essa leitura que ora se pretende explicitar – sem embargo da interpretação
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autêntica de seu prolator –, mostra-se consentânea com a disciplina legal do contrato de
seguro de vida, que confere tratamento particular e diferenciado nas modalidades
" individual e em grupo ", no tocante às posições jurídicas assumidas pela seguradora,
pelo estipulante e pelo segurado em cada qual.
Não tem sido esse, entretanto, o norte adotado por esta Corte de Justiça,
nos casos que se seguiram, que tratam, de fato, da questão consistente em identificar de
quem é a responsabilidade pelo dever de informação no contrato de seguro de vida em
grupo.
Nesses casos, embora se reconheça a inexistência, em si, de ilegalidade
das cláusulas restritivas postas no seguro de vida em grupo , esta Corte de Justiça, em
decisões monocráticas (sob a premissa de que a questão estaria pacificada), confirmadas
em agravo interno, tem conferido provimento ao recurso especial do segurado para
atribuir a responsabilidade pelo dever de informação à seguradora , e não à
estipulante, como reconhecido pelo Tribunal local, determinando-se a devolução dos autos
à origem, para que se apure, no caso em concreto, se tal obrigação teria sido ou não
observada.
É o que se verifica dos seguintes julgados das duas Turmas de Direito
Privado desta Corte de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. INDICAÇÃO DO RECURSO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA PELA COMISSÃO GESTORA DE PRECEDENTES. NÃO VINCULAÇÃO DO MINISTRO RELATOR SORTEADO EM RELAÇÃO À DECISÃO DE AFETAÇÃO. RISTJ. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. SEGURADORA. DEVER DE INFORMAÇÃO SOBRE AS DISPOSIÇÕES CONTRATUAIS. 1. Ação de cobrança de indenização securitária.
2. Nos despachos, prolatados pelo Min. Presidente da Comissão de Precedentes, de indicação dos recursos como representativos a qualificação do recurso como candidato à afetação à sistemática dos repetitivos não vincula o relator sorteado, que é o competente para analisar o preenchimento dos requisitos de admissibilidade do recurso para submeter a questão ao Plenário Virtual a fim de possível afetação da matéria ao rito dos repetitivos.
4. A seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não os induzir a erro. Súmula 568/STJ.
5. Agravo interno não provido.
Documento: 1996499 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 12/11/2020 Página 15 de 4
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( AgInt no REsp 1846398/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/06/2020, DJe 10/06/2020)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. CLÁUSULA LIMITATIVA DO CONTRATO. DEVER DE INFORMAÇÃO. INCUMBÊNCIA DA ESTIPULANTE E DA SEGURADORA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83 DO STJ. REAVALIAÇÃO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS N. 5 e 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA.
1. Inadmissível o recurso especial quando o entendimento adotado pelo Tribunal de origem coincide com a jurisprudência do STJ (Súmula n. 83/STJ).
2."Nos termos da jurisprudência desta Corte, a seguradora tem o dever de prestar informações ao segurado, mesmo nos contratos de seguro de vida em grupo. Tal responsabilidade não pode ser transferida integralmente à estipulante, eximindo a seguradora"( AgInt no REsp 1.848.053/SC, Relator Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 10/3/2020, DJe 2/4/2020).
3. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem interpretação de cláusula contratual ou revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmulas n. 5 e 7 do STJ).
4. No caso concreto, o Tribunal de origem assentou que não há elementos que comprovem que a seguradora cumpriu o dever de prestar as informações ao segurado acerca das cláusulas limitativas de seu direito. Entender de modo contrário exigiria nova análise da matéria fática, providência vedada em sede de recurso especial, a teor das Súmulas n. 5 e 7 do STJ.
5. Agravo interno a que se nega provimento.
( AgInt no AREsp 1559165/PR, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 07/05/2020)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. COBERTURA DE INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA (IFPD). CIRCULAR SUSEP N. 302/2005. DESCUMPRIMENTO DO DEVER DE INFORMAÇÃO ACERCA DOS LIMITES DA COBERTURA CONTRATADA. INCUMBÊNCIA DA SEGURADORA. DEVER DE INDENIZAR EVIDENCIADO. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. AGRAVO DESPROVIDO.
1. A Terceira Turma desta Casa, em julgado de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, consignou que"a Circular SUSEP nº 302/2005 vedou o oferecimento da cobertura de Invalidez Permanente por Doença (IPD), em que o pagamento da indenização estava condicionado à impossibilidade do exercício, pelo segurado, de toda e qualquer atividade laborativa, pois era difícil a sua caracterização ante a falta de especificação e de transparência quanto ao conceito de 'invalidez' nas apólices, havendo também confusão entre o seguro privado e o seguro social, o que gerou grande número de disputas
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judiciais. Em substituição, foram criadas duas novas espécies de cobertura para a invalidez por doença: Invalidez Laborativa Permanente Total por Doença (ILPD ou IPD-L) e Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD ou IPD-F)"( REsp 1.449.513/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 5/3/2015, DJe 19/3/2015).
[...]
Não obstante o alcance da cobertura IFPD ser mais restritivo do que o da cobertura ILPD, inexiste abusividade, ilegalidade ou afronta ao princípio da boa-fé objetiva, porquanto não caracterizado nenhum benefício excessivo da seguradora em detrimento do segurado.
3. No entanto, o acórdão diverge da orientação consolidada no precedente desta Casa acima mencionado, no sentido de que"a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não induzi-los em erro"( AgRg no AREsp 589.599/RS, Relator o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 1º/3/2016, DJe 7/3/2016).
4. Agravo interno desprovido.
( AgInt no REsp 1853182/SC, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/04/2020, DJe 24/04/2020)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. CLÁUSULAS RESTRITIVAS. DEVER DE INFORMAÇÃO. SEGURADORA.
NECESSIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Consoante a jurisprudência desta Corte,"a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e suas consequências, de modo a não induzi-los em erro"( AgInt no REsp 1.644.779/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/08/2017, DJe de 25/08/2017).
2. Tendo a Corte local assinalado que o dever de informação acerca dos termos do seguro cabia à estipulante do seguro, e não à seguradora, está justificada a reforma do acórdão atacado para determinar que aquele verifique eventual falha no cumprimento desse dever, a fim de se adequar ao entendimento do STJ.
3. Agravo interno a que se nega provimento.
( AgInt no REsp 1.842.559/SC, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 31/03/2020)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA DA DEMANDADA.
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1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a seguradora tem o dever de prestar informações ao segurado, mesmo nos contratos de seguro de vida em grupo. Precedentes de ambas Turmas de Direito Privado.
2. Tal responsabilidade não pode ser transferida, eximindo a seguradora, integralmente à estipulante, pois essa, segundo o artigo 801, § 1º, do Código Civil,"não representa o segurador perante o grupo segurado, e é o único responsável, para com o segurador, pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais" .
3. Agravo interno desprovido.
( AgInt no REsp 1835185/SC, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 27/11/2019)
Destacam-se, ainda: AgInt no REsp 1.834.913/SC, Rel. Ministra Nancy
Andrighi, Terceira Turma, julgado em 10/08/2020, DJe 14/08/2020; AgInt no AREsp
1.399.405/SC, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, TerceiraTurma, julgado em
20/04/2020, DJe 27/04/2020; AgInt no REsp 1.848.053/SC, Rel. Ministro Raul Araújo,
Quarta Turma, julgado em 10/03/2020, DJe 02/04/2020; AgInt no REsp 1.844.380/SC, Rel.
Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 23/03/2020, DJe 30/03/2020;
AgInt no AREsp 1.565.877/MS, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma,
julgado em 09/03/2020, DJe 13/03/2020; AgInt no AREsp 1.379.200/MS, Rel. Ministro Raul
Araújo, Quarta Turma, julgado em 20/08/2019, DJe 09/09/2019; AgInt no AREsp
1.345.204/PR, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 11/12/2018, DJe
19/12/2018; AgInt no AREsp 1.272.015/SC, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira
Turma, julgado em 26/06/2018, DJe 29/06/2018; AgInt no REsp 1.697.809/SC, Rel. Ministro
Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 05/12/2017, DJe 19/12/2017.
Em decisões monocráticas, citam-se: REsp 1.892.855, Relator Ministro
Moura Ribeiro, DJe 15/09/2020; REsp 1.884.926/SC, Relator Ministro Moura Ribeiro, DJe
15/09/2020; REsp 1.835.033/SC, Relator Ministro Antônio Carlos, DJe 11/09/2020; REsp
1.892.113/SC, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 04/09/2020; REsp 1.877.559/SC,
Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 02/09/2020; REsp 1.861.424/SC, Relator
Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 02/09/2020; REsp 1.849.767/SC, Relator Ministro
Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 02/09/2020; REsp 1.845.850/SC, Relator Ministro Ricardo
Villas Bôas Cueva, DJe 02/09/2020; AREsp 1.708.805/SC, Relator Ministro Luis Felipe
Salomão, DJe 1º/09/2020; AREsp 1.705.001/SC, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, DJe
1º/09/2020; REsp 1.878.499/SC, Relator Ministro Marco Buzzi, DJe 1º/07/2020; REsp
1.861.405/SC, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 10/06/2020; REsp
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1.859.240/SC, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 10/06/2020; REsp 1.857.138/SC, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 10/06/2020; REsp 1.847.975/SC, Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, DJe 20/02/2020; REsp 1.847.953/SC, Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, DJe 20/02/2020; .
Por conseguinte, seja para confirmar a diretriz hoje adotada, lastreada, doravante, em julgado específico a esse propósito, seja para proceder a uma correção de rumos – o que, em última análise, mostra-se sempre salutar ao aprimoramento das decisões judiciais –, revela-se indispensável o enfrentamento pontual da matéria posta por esta Turma julgadora.
Pois bem. Em preliminar aventada, rejeito a tese de negativa de prestação jurisdicional, na medida em que a Corte estadual apreciou todas as questões relevantes para o deslinde da causa, devolvidas no âmbito recursal, constando de seus acórdãos suficiente e idônea fundamentação.
No mérito, consigna-se, de plano, que para a identificação do responsável pelo dever de informar previamente o segurado a respeito das cláusulas limitativas/restritivas nos contratos de seguro de vida em grupo é indispensável analisar a estrutura dessa relação contratual, bem delimitando a posição jurídica de cada ator – seguradora, estipulante e segurado – , segundo a disciplina legal própria; as relações jurídicas estabelecidas entre si e em paralelo; assim como o conteúdo e a extensão das respectivas obrigações em cada fase do contrato, sobretudo, na pré-contratual.
A partir do disposto no art. 757 do Código Civil – pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo –, extraem-se, como elementos constitutivos do contrato de seguro, a garantia, o interesse segurável, o risco, o prêmio e a empresarialidade.
Assim, independentemente do modo como o contrato de seguro é estipulado – seja individualmente, seja em grupo –, o segurador assume a obrigação de pagar a indenização securitária, na hipótese de se implementar o risco, futuro e incerto, especificamente determinado no contrato, que recai sobre um interesse legítimo do segurado (bem ou pessoa), mediante o pagamento de prêmio.
Como corolário da boa-fé contratual, já se pode antever o quanto sensível é
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para a higidez desse tipo de contrato, a detida observância, de parte a parte, do dever de informação. O segurado há de ter prévia, plena e absoluta ciência acerca da abrangência da garantia prestada pelo segurador, especificamente quanto aos riscos e eventos que são efetivamente objeto da cobertura ajustada, assim como àqueles que dela estejam excluídos. Ao segurador, de igual modo, também deve ser concedido a obtenção de todas as informações acerca das condições e das qualidades do bem objeto da garantia, indispensáveis para a contratação como um todo e para o equilíbrio das prestações contrapostas.
Encontrando-se o contrato de seguro indiscutivelmente sob o influxo do Código de Defesa do Consumidor, dada a assimetria da relação jurídica estabelecida entre segurado e segurador, a implementação do dever de informação prévia dá-se de maneira particular e distinta conforme a modalidade da contratação, se"individual"ou"em grupo".
É o que se passa a demonstrar, a respeito do seguro de pessoas, especificamente, o seguro de vida.
Em se tratando de seguro individual, celebrado entre o segurador e o titular do direito segurado, dúvidas não pairam, para o propósito ora discutido, quanto ao dever do segurador de informar previamente o segurado sobre todos os contornos do ajuste, sobretudo acerca das cláusulas restritivas de direito (excludente de cobertura).
Nessa modalidade de contratação de seguro, também é possível atribuir o dever de informar, eventualmente, ao corretor de seguros, caso em que este intermediário atua, perante o segurado, como verdadeiro representante da seguradora, o que justifica, inclusive, a responsabilidade solidária de ambos, já que se encontram, indiscutivelmente, na cadeia de fornecimento.
Corroboram essa compreensão: REsp 1.077.911/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 04/10/2011, DJe 14/10/2011; REsp 534.675/SP, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, julgado em 20/04/2004, DJ 10/05/2004.
Por sua vez, a contratação de seguro vida coletivo dá-se de forma diversa e complexa, pressupondo a existência de anterior vínculo jurídico (que pode ser de cunho trabalhista ou associativo) entre o tomador do seguro (a empresa ou a associação
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estipulante) e o grupo de segurados (trabalhadores ou associados).
Será, então, a partir desse vínculo jurídico anterior, que o estipulante fica
investido de poderes para, em representação aos possíveis segurados, celebrar contrato
de seguro coletivo com o segurador. Em se tratando de representação legal, lastreado em
vínculo jurídico preexistente, o estipulante atua para preservar os interesses, primeiro, dos
possíveis segurados, e, após a adesão, do grupo de segurados, propriamente.
Diz-se possíveis segurados, porque tal condição apenas se concretiza, se,
posteriormente (ou seja, após a celebração do contrato de seguro), houver interesse do
trabalhador ou do associado de aderir aos termos da apólice (a essa altura) já contratados.
O tratamento legal ofertado ao seguro coletivo de pessoas não deixa dúvidas
quanto à necessidade de haver anterior vínculo jurídico entre o estipulante e o grupo de
segurados e, principalmente, quanto à atribuição à estipulante da qualidade de
representante do grupo de segurados.
O Decreto-Lei n. 73/1966, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Seguros
Privados e regula as operações de seguros e resseguros, define a figura do estipulante em
seu art. 21, §§ 1º e 2º, nos seguintes termos:
Art. 21. Nos casos de seguros legalmente obrigatórios, o estipulante equipara-se ao segurado para os efeitos de contratação e manutenção do seguro.
§ 1º Para os efeitos deste decreto-lei, estipulante é a pessoa que contrata seguro por conta de terceiros, podendo acumular a condição de beneficiário.
§ 2º Nos seguros facultativos o estipulante é mandatário dos segurados.
O art. 801 do Código Civil, ao tratar do seguro de pessoas em grupo,
também é claro em definir a posição jurídica assumida pela estipulante nessa contratação,
incumbindo-lhe, na condição de representante do grupo de segurados – e não do
segurador, ressalta-se – a responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações
contratuais.
Assim estabelece o dispositivo legal em comento:
Art. 801. O seguro de pessoas pode ser estipulado por pessoa natural ou jurídica em proveito de grupo que a ela, de qualquer modo, se vincule.
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cumprimento de todas as obrigações contratuais.
Por seu turno, a Resolução CNPS n. 107/2004, da Susep (Superintendência
de Seguros Privados) dispõe em seu art. 1º:
Art. 1º. Estipulante é a pessoa física ou jurídica que contrata apólice coletiva de seguros, ficando investido dos poderes de representação dos segurados perante as sociedades seguradoras, nos termos desta Resolução.
Parágrafo único. As apólices coletivas em que o estipulante possua, com o grupo segurado, exclusivamente, o vínculo de natureza securitária, referente à contratação do seguro, serão consideradas apólices individuais, no que concerne ao relacionamento dos segurados com a sociedade seguradora.
Constata-se, assim, que o estipulante (tomador do seguro), com esteio em
vínculo jurídico anterior com seus trabalhadores ou com seus associados, celebra contrato
de seguro de vida coletivo diretamente com o segurador, representando-os e assumindo,
por expressa determinação legal, a responsabilidade pelo cumprimento de todas as
obrigações contratuais perante o segurador.
O segurador, por seu lado, tem por atribuição precípua garantir os interesses
do segurado, sempre que houver a implementação dos riscos devidamente especificados
no contrato de seguro de vida em grupo, cuja abrangência, por ocasião da contratação,
deve ter sido clara e corretamente informada ao estipulante, que, como assinalado,
é quem celebra o contrato de seguro em grupo.
O grupo de segurados, por fim, é composto pelos usufrutuários dos
benefícios ajustados, assumindo suas obrigações para com o estipulante, sobretudo o
pagamento do prêmio, a ser repassado à seguradora.
Essa estrutura do contrato de seguro de vida em grupo, com a delimitação
das posições jurídicas de seus atores, foi bem explicitada em julgado da Quarta Turma do
STJ, cuja ementa ficou assim conformada:
RECURSOS ESPECIAIS. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA PROTEÇÃO E DEFESA DOS CONSUMIDORES E BENEFICIÁRIOS DE PLANOS E APÓLICES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE. NATUREZA DO PEDIDO. CONTRATO DE SEGURO. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. ESTIPULANTE E GRUPO DE SEGURADOS. RELAÇÃO DE MANDATO. DECISÃO PROFERIDA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALCANCE TERRITORIAL DE SEUS EFEITOS.
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VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO.
1. Não há violação ao artigo 535, II do CPC, pois embora rejeitados os embargos de declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da recorrente.
2. É entendimento assente do Superior Tribunal de Justiça a exigência do prequestionamento dos dispositivos tidos por violados, ainda que a contrariedade tenha surgido no julgamento do próprio acórdão recorrido. Incidem por analogia, na espécie, as Súmulas 282 do STF e 211 do STJ.
3. Conforme entendimento consolidado no âmbito do STJ, as entidades sindicais e as associações têm legitimidade ativa ad causam na defesa, em juízo, dos direitos coletivos ou individuais homogêneos de toda a categoria que representa ou de apenas parte dela.
Precedentes.
4. Nos termos da jurisprudência do STJ, a ação civil pública pode gerar comando condenatório, declaratório, constitutivo, autoexecutável ou mandamental.
5. O contrato de seguro é ajuste por meio do qual o segurador assume obrigação de pagar ao segurado certa indenização, caso o risco a que está sujeito o segurado, futuro, incerto e especificamente previsto, venha a se realizar.
6. No contrato de seguro de vida em grupo, cuja estipulação é feita em favor de terceiros, três são as partes interessadas: estipulante, responsável pela contratação com o segurador; segurador, que garante os interesses com a cobertura dos riscos especificados e o grupo segurado, usufrutuários dos benefícios, que assumem suas obrigações para com o estipulante.
7. Nos termos da Resolução n. 41/2000, do Conselho Nacional de Seguros Privados, estipulante é"a pessoa jurídica que contrata a apólice coletiva de seguros, ficando investido dos poderes de representação dos segurados perante as sociedades seguradoras".
8. No seguro de vida em grupo, há entre o estipulante e o grupo segurado manifesta relação contratual de representatividade, situação na qual alguém, mandatário ou procurador, recebe poderes de outrem, mandante, para, em seu nome, praticar atos e administrar interesses.
9. Mostra-se evidentemente inconveniente o fato de uma empresa pertencente ao mesmo grupo econômico de uma seguradora exercer, simultaneamente, o mister de estipulante de seguro em grupo para com a mesma seguradora.
10. Apesar da constatação da inconveniência feita, a solução da questão não pode ser a conversão compulsória das apólices coletivas em individuais, tendo em vista o risco enorme de com essa providência seja criado um problema sistêmico.
11. A solução que se apresenta viável para o caso dos autos é a proibição da contratação de novos seguros, seja para renovação dos já existentes, seja para os contratos futuros, nos moldes do voto
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condutor.
12. A verificação dos efeitos de determinada sentença não se condiciona ao território onde é proferida. Toda sentença atinge determinados sujeitos (alcance subjetivo) e refere-se à certa questão fático-jurídica (alcance objetivo), independentemente do limite territorial.
13. A partir do julgamento do recurso da seguradora, representado nos itens acima, questões como a referente à taxa de administração, cuja restituição foi requerida na ação original, e à multa fixada para a obrigação de fazer, que deixou de existir, porque a obrigação de conversão das apólices também deixou de existir, ficaram prejudicadas, fazendo com que deixassem de existir as pretensões passíveis de execução, com consequências econômicas, portanto, a evidenciar a subsistência, apenas, de direito difuso dos consumidores de que não sejam mais pactuados pela seguradora novos contratos, nos moldes originais.
14. Recursos especiais parcialmente providos, nos termos da fundamentação.
( REsp 1170855/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 16/12/2015)
Para bem identificar o responsável pelo dever de informação prévia de
todos os contornos do contrato, em especial das cláusulas restritivas, é relevante perceber
que, por ocasião da contratação do seguro de vida coletivo, não há, ainda, um grupo
definido de segurados.
A representação exercida pela estipulante, como anotado, decorre do vínculo
jurídico anteriormente existente, de cunho trabalhista ou associativo. A condição de
segurado dar-se-á, voluntariamente, em momento posterior à efetiva contratação, ou seja,
na oportunidade em que as bases contratuais, especificamente quanto à abrangência da
cobertura e dos riscos dela excluídos, já foram definidas pelo segurador e aceitas pela
estipulante.
Assim, como decorrência do princípio da boa-fé contratual, é imposto ao
segurador, antes e por ocasião da contratação da apólice coletiva de seguro, o dever legal
de fornecer todas as informações necessárias a sua perfectibilização para a estipulante,
que é quem efetivamente celebra o contrato em comento.
Inexiste, ao tempo da contratação do seguro de vida coletivo – e muito
menos na fase pré-contratual – qualquer interlocução direta da seguradora com os
segurados, individualmente considerados, notadamente porque, nessa ocasião, não
existe, ainda, sequer a definição de quem irá compor o grupo dos segurados.
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Celebrado o contrato de seguro de vida em grupo entre a seguradora e a estipulante, este é válido e eficaz entre as partes. À estipulante incumbirá promover as providências necessárias à adesão de seus trabalhadores ou associados, cabendo-lhe identificar e individualizar os membros do grupo de segurados.
Logo, somente em momento posterior à efetiva contratação do seguro de vida em grupo, caberá ao trabalhador ou ao associado avaliar a conveniência e as vantangens de aderir aos termos da apólice de seguro de vida em grupo já contratada. A esse propósito, afigura-se indiscutível a obrigatoriedade legal de bem instruir e informar o pretenso segurado sobre todas as informações necessárias à tomada de sua decisão de aderir à apólice de seguro de vida contratada.
Essa obrigação legal de informar o pretenso segurado previamente a sua adesão, contudo, deve ser atribuída à estipulante, justamente em razão da posição jurídica de representante dos segurados, responsável que é pelo cumprimento de todas as obrigações contratuais assumidas perante o segurador.
Para o adequado tratamento da questão posta, mostra-se relevante o fato de que não há, também nessa fase contratual, em que o segurado adere à apólice de seguro de vida em grupo, nenhuma interlocução da seguradora com este, ficando a formalização da adesão à apólice coletiva restrita à estipulante e ao proponente.
Aliás, a Resolução CNSP n. 107/2004, da Susep, coerente com a posição de representante assumida pelo estipulante também ali preconizada, impõe-lhe o dever de bem informar o proponente, por ocasião de sua adesão à apólice coletiva, devendo a este apresentar proposta da contratação e fazer constar do correlato instrumento a assinatura de ambos (estipulante e proponente), com especial destaque para a declaração de conhecimento prévio do segurado da íntegra das condições gerais.
Essa é a conclusão que se extrai de seu art. 6º, in verbis:
Art. 6º. A contratação de seguros por meio de apólice coletiva deve ser realizada mediante apresentação obrigatória de proposta de contratação assinada pelo estipulante e pelo sub-estipulante, se for o caso, e pelo corretor de seguros, ressalvada a hipótese de contratação direta.
Parágrafo único. A adesão à apólice deverá ser realizada mediante a assinatura, pelo proponente, de proposta de adesão e desta deverá constar cláusula na qual o proponente declara ter conhecimento prévio da íntegra das condições gerais.
Documento: 1996499 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 12/11/2020 Página 25 de 4
Superior Tribunal de Justiça
Não há, como se constata, nenhuma participação da seguradora no ato
de adesão do segurado à apólice coletiva, tampouco no momento que lhe
antecede, afigurando-se de todo descabido, em análise mais acurada da questão,
impor-lhe alguma responsabilidade por eventual inobservância do dever de
informar o segurado a respeito de cláusulas limitativas de direito. Essa obrigação, a
partir das posições jurídicas que cada ator contratual assume e pelo modo pelo
qual se operacionaliza o contrato de seguro devida em grupo, é exclusivamente da
estipulante.
Apenas para corroborar tal conclusão, ressai claro das obrigações legais
impostas à estipulante, pertinentes a sua posição jurídica de representante do grupo de
segurados, devidamente explicitadas na Resolução CNSP n. 107/2004, da Susep,
incumbir-lhe precipuamente o dever de bem informar o segurado a respeito da
abrangência da apólice, não apenas por ocasião de sua adesão, mas durante toda a sua
vigência.
Confira-se o teor de seu art. 3º:
Art. 3º. Constituem obrigações do estipulante:
I - fornecer à sociedade seguradora todas as informações necessárias para a análise e aceitação do risco, previamente estabelecidas por aquela, incluindo dados cadastrais;
II - manter a sociedade seguradora informada a respeito dos dados cadastrais dos segurados, alterações na natureza do risco coberto, bem como quaisquer eventos que possam, no futuro, resultar em sinistro, de acordo com o definido contratualmente;
III - fornecer ao segurado, sempre que solicitado, quaisquer informações relativas ao contrato de seguro;
IV - discriminar o valor do prêmio do seguro no instrumento de cobrança, na forma estabelecida pelo art. 7º desta Resolução, quando este for de sua responsabilidade;
V - repassar os prêmios à sociedade seguradora, nos prazos estabelecidos contratualmente:
VI - repassar aos segurados todas as comunicações ou avisos inerentes à apólice, quando for diretamente responsável pela sua administração;
VII - discriminar a razão social e, se for o caso, o nome fantasia da sociedade seguradora responsável pelo risco, nos documentos e comunicações referentes ao seguro, emitidos para o Segurado;
VIII - comunicar, de imediato, à sociedade seguradora, a ocorrência de qualquer sinistro, ou expectativa de sinistro,
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referente ao grupo que representa, assim que deles tiver conhecimento, quando esta comunicação estiver sob sua responsabilidade;
IX- dar ciência aos segurados dos procedimentos e prazos estipulados para a liquidação de sinistros;
X comunicar, de imediato, à SUSEP, quaisquer procedimentos que considerar irregulares quanto ao seguro contratado;
XI - fornecer à SUSEP quaisquer informações solicitadas, dentro do prazo por ela estabelecido; e
XII - informar a razão social e, se for o caso, o nome fantasia da sociedade seguradora, bem como o percentual de participação no risco, no caso de co-seguro, em qualquer material de promoção ou propaganda do seguro, em caracter tipográfico maior ou igual ao do estipulante.
Conclui-se, portanto, que, no contrato de seguro coletivo em grupo, cabe à
estipulante, e não à seguradora, o dever de fornecer ao segurado (seu representado)
ampla e prévia informação a respeito dos contornos contratuais, no que se inserem, em
especial, as cláusulas restritivas.
Por fim, no tocante à suposta ilicitude da cláusula restritiva em questão, em
relação à qual o recorrente dedicou poucas linhas em seu recurso especial, registre-se
que, de acordo com a compreensão exarada no multicitado REsp 1.449.513/SP (que não
foi julgado sob o rito dos recurso repetitivos, conforme equivocadamente aduz a parte
recorrente), embora o alcance da cobertura por invalidez funcional seja mais restritivo do
que o da cobertura por invalidez laborativa, inexiste abusividade, ilegalidade ou afronta ao
princípio da boa-fé objetiva, porquanto não caracterizado nenhum benefício excessivo da
seguradora em detrimento do segurado.
No ponto, assinala-se que, conforme consignado pelas instâncias ordinárias,
de modo uníssono, a cobertura securitária para cônjuge estabelecida na apólice de seguro
em grupo em questão limita-se à" invalidez permanente decorrente de acidente ", definido
este como"o evento com data caracterizada, exclusivo e diretamente externo, súbito,
involuntário, violento e causador de lesão física, que, por si só e independentemente de
toda e qualquer outra causa, tenha como consequência direta, a morte ou a invalidez
permanente total ou parcial do segurado, ou que [torne] necessário tratamento médico",
não equiparável, portanto, à situação descrita pelo demandante ou ao chamado acidente
de trabalho, para efeito de previdência social.
Ademais, a pretensão exarada, no ponto, pelo recorrente, consistente em
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nova interpretação à cláusula contratual em comento, esbarra, claramente, no enunciado n. 5 da Súmula do STJ.
Em arremate, na esteira dos fundamentos acima delineados, nego provimento ao recurso especial.
É o voto.
Superior Tribunal de Justiça
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2019/0200554-1 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.825.716 / SC
Números Origem: 0 3019158620158240019 0 3019158620158240019 50001 3019158620158240019
3019158620158240019 50001
PAUTA: 27/10/2020 JULGADO: 27/10/2020
Relator
Exmo. Sr. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS ALPINO BIGONHA
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : DOMINGOS BATTISTELLA
ADVOGADO : FABIANA ROBERTA MATTANA CAVALLI E OUTRO (S) - SC016109
RECORRIDO : ITAÚ SEGUROS S/A
ADVOGADOS : LODI MAURINO SODRE - SC009587 MARARRÚBIA SODRÉ GOULART - SC017388 RICARDO ZEFERINO GOULART E OUTRO (S) - SC017739
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Seguro
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.