3 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1801991 - RJ (2020/0327959-2)
RELATOR : MINISTRO OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO)
AGRAVANTE : CLIVIO DE OLIVEIRA DE SOUZA
ADVOGADOS : ARIDIO CABRAL DE OLIVEIRA - RJ011464 TATIANA MESSNER FADUL - RJ122079 CAMILA MARIA ROCHA RANGEL
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
CORRÉU : AFONSO PINTO RIBEIRO
CORRÉU : LUIZ BENICIO RAMOS PRIVAT
CORRÉU : LUIZ RENATO RAMOS PRIVAT
CORRÉU : MARIO SERGIO LARANJA
CORRÉU : PHILIPE VALE BARROSO
DECISÃO
Trata-se de agravo interposto em face de decisão que inadmitiu o recurso
especial pela incidência da Súmula 7/STJ.
No presente agravo, a defesa afirma que a análise das razões do recurso especial
não exige reexame de provas, sendo certo, portanto, que a abordagem efetuada
trata de questões de direito.
Nas razões do especial, aponta a defesa violação aos artigos 386 do CPP e 288 do
CP, pugnando, assim, pelo provimento do agravo para que o recurso especial seja
conhecido e, no mérito, provido.
Contraminuta apresentada, manifestou-se o Ministério Público Federal pelo
desprovimento do recurso.
O agravo é tempestivo e ataca os fundamentos da decisão agravada. Passo,
portanto, à análise do mérito recursal.
O recorrente foi condenado como incurso no art. 288 do CP, à pena de 3 anos de
reclusão, em regime inicial aberto.
Interposta apelação, o recurso defensivo foi improvido.
No recurso especial, alega contrariedade ao art. 386, II, V ou VII, do CPP, tendo
em vista que a interceptação telefônica, ISOLADA DE UM CONTEXTO
PROBATÓRIO, POR SI SÓ NÃO PODE SER ADMITIDA COMO PROVA DA
MATERIALIDADE
Sustenta, ainda, violação ao art. 386, I ou II ou V do CPP, uma vez que a
condenação pela prática de contrabando e participação em associação criminosa não encontra amparo, merecendo o devido afastamento por FALTA DE FUNDAMENTO.
Aduz, nesse contexto, insuficiência de provas aptas a amparar o édito condenatório, pretendendo a absolvição do recorrente.
Por fim, aponta violação ao art. 288 do CP, pois não houve comprovação da estabilidade e da permanência exigidas para a caracterização do delito de associação criminosa, devendo ser aplicado o disposto no art. 29, caput, do CP e a desclassificação para o concurso de agentes.
Quanto à tese absolutória, o acórdão foi assim fundamentado (fls. 814-815):
CLIVIO DE OLIVEIRA DE SOUZA apelou sustentando, em síntese, insuficiência probatória da prática delitiva, vez que os diálogos capturados nas interceptações telefônicas foram utilizados de maneira isolada. Subsidiariamente, requer a fixação da pena no mínimo legal, ao argumento de que a fundamentação utilizada para a exasperação da pena seria inidônea; finalmente pede a substituição de pena, prevista no art. 44 do CP.
Segundo consta dos autos, CLIVIO fazia o transporte e segurança dos cigarros em questão, juntamente com valores em dinheiro. A prova da participação do apelante nos fatos foi feita na transcrição das conversas telefônicas , especialmente:
(...)
LUIZ X RENATO - pedido cigarro @@
RESUMO: RENATO confere pedido de cigarros (euro, blitz, madison, us, paládio) com seu pai.
LUIZ diz que CLIVIO já deve estar voltando de Jacarepaguá." "RENATO X PHILIPE - pegar ole branco @@
RESUMO: Indagado, PHILIPE confirma que já voltou.
RENATO determina que se junte com CLIVIO e ye buscar caixa de (cigarro) ole branco no galpão." "LUIZ X RENATO - entregas cigarro @@ (...)
Consta, ainda, que este apelante já havia trabalhado em outra empresa de cigarros com LUIS RENATO, conforme corroborado por este último em seu interrogatório .
Nos seguintes termos a condenação do apelante:
O réu CLIVIO é apontado pelo MPF como o responsável pela segurança do transporte de cigarros contrabandeados e de valores em dinheiro. Em suas alegações finais (fls. 447/465), a defesa do acusado CLIVIO DE OLIVEIRA SOUZA alega a inépcia da denúncia (já devidamente apreciada e rechaçada) e, no mérito, nega a imputação sob o argumento de que o acusado não era formalmente funcionário de nenhum do corréus e apenas prestava serviços esporádicos como segurança na entrega de cargas cujo conteúdo desconhecia. A realidade dos autos não condiz com a versão defensiva. Em várias passagens, a conversas monitoradas dão conta de que o acusado tinha plena consciência de que se prestava a garantir o transporte
e entrega de cigarros contrabandeados do Paraguai (vide, por exemplo, a conversa entre Renato e Philipe no dia 19.08.2011, às 13:45:01). Neste ponto, a própria defesa dos acusados LUIZ BENICIO e LUIZ RENATO deixa claro que o motivo da contratação de segurança era o fato que a atividade comercial sabidamente exercida por estes dois acusados, qual seja a venda e entrega de cigarros, é de alto risco (fl. 493). Noutro giro, as datas das diversas comunicações interceptadas não deixam dúvidas quanto à razoável estabilidade a atuação criminosa do grupo .
Por fim, vale lembrar que, em sede policial (fl. 100 do IPL 0001/2011-4, autos n. 20115110000364-0), o acusado LUIZ RENATO disse que CLIVIO é velho conhecido e já trabalhava anteriormente para outra empresa de cigarros (NOT TABACOS).
Pelo exposto, entendo que o acusado CLIVIO DE OLIVEIRA SOUZA incorreu, de forma consciente e voluntária, na prática dos crimes previstos, respectivamente, no art. 334, par. 1°, c' e no art. 288, todos do CP.
Os fundamentos judiciais acima reproduzidos devem ser corroborados, dada a coerência e precisão da análise em relação ao acervo probatório, razão pela qual os integro como razão de decidir deste julgado.
De acordo com a jurisprudência desta Corte, é possível a utilização das provas colhidas durante a fase inquisitiva para embasar a condenação, desde que corroboradas por outras provas colhidas em Juízo.
Verifica-se que o recorrente foi condenado pela prática do crime de associação criminosa e, para fundamentar a condenação, o acórdão combatido se amparou em diversos elementos de prova, especialmente interceptações telefônicas que foram em parte transcritas, elementos que foram corroborados durante a fase instrutória.
Consignou o juízo sentenciante que Em várias passagens, a conversas monitoradas dão conta de que o acusado tinha plena consciência de que se prestava a garantir o transporte e entrega de cigarros contrabandeados do Paraguai.
No que se refere ao pleito de desclassificação para o concurso de agentes, o Tribunal de origem assim dispôs (fl. 887):
Quanto ao pedido pela desclassificação do crime de associação criminosa, do art. 288 do CP, a estabilidade de sua participação também foi tratada no fragmento reproduzido no voto, em que o mm juiz singular expõe que "Em várias passagens, a conversas monitoradas dão conta de que o acusado tinha plena consciência de que se prestava a garantir o transporte e entrega de cigarros contrabandeados do Paraguai (vide, por exemplo, a conversa entre Renato e Philipe no dia 19.08.2011, às 13:45:01). Neste ponto, a própria defesa dos acusados LUIZ BENICIO e LUIZ RENATO deixa claro que o motivo da contratação de segurança era o fato que a atividade comercial sabidamente exercida por estes dois acusados, qual seja a venda e entrega de cigarros, é de alto risco (fl. 493)." O voto embargado consignou ainda que "Importante notar que, segundo a norma penal, não
somente o importador da mercadoria proibida é o sujeito ativo do contrabando e do descaminho, mas também aquele que, sabendo disso, tira proveito da mercadoria introduzi da clandestinamente no país ou importada de maneira fraudulenta."
Como se vê, a condenação não foi fundamentada somente em elementos colhidos na fase inquisitorial, via interceptação telefônica, mas na presença de elementos probatórios que ensejaram o resultado dado ao processo, comprovando-se por intermédio de mais de um elemento probante a autoria delitiva do recorrente, sendo destacado que a própria defesa dos acusados LUIZ BENICIO e LUIZ RENATO deixa claro que o motivo da contratação de segurança era o fato que a atividade comercial sabidamente exercida por estes dois acusados, qual seja a venda e entrega de cigarros, é de alto risco (fl. 493). Nesse sentido, destaco, mutatis mutandi: AgRg no HC 574604 / PR, Relator(a): Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, Data da Publicação/Fonte: DJe 25/06/2020; RHC 47938 / CE, Relator(a): Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, Data da Publicação/Fonte: DJe 21/11/2017.
No caso, o pronunciamento das instâncias ordinárias encontra respaldo nas provas obtidas a partir da instrução criminal, sob o pálio do devido processo legal e com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Dessume-se da fundamentação que as instâncias ordinárias, com apoio nas provas dos autos, firmaram compreensão no sentido de que, ao contrário do que alega a defesa, restaram comprovadas a estabilidade e a permanência da associação criminosa entre os réus, sendo destacado que as datas das diversas comunicações interceptadas não deixam dúvidas quanto à razoável estabilidade a atuação criminosa do grupo [...] CLIVIO fazia o transporte e segurança dos cigarros em questão, juntamente com valores em dinheiro. [...] Consta, ainda, que este apelante já havia trabalhado em outra empresa de cigarros com LUIS RENATO, conforme corroborado por este último em seu interrogatório.
Sendo assim, é certo que a desconstituição das premissas fáticas, com o fim de reconhecer a absolvição do recorrente, demandaria o revolvimento do conjunto fáticoprobatório, inadmissível a teor da Súmula 7/STJ. A esse respeito:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. [...]. QUADRILHA. MATERIALIDADE E AUTORIA. CONCLUSÕES FORMADAS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM A PARTIR DE AMPLO E PROFUNDO REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. VEDAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. [...].
[...]
3. No que se refere à verificação da materialidade e autoria dos crimes previstos no art. 288 do CP e art. 244-B do ECA, é de se observar que as conclusões alcançadas pelas instâncias ordinárias estão calcadas em intensa análise do contexto fático-probatório dos autos.
4. Tanto com relação à estabilidade e permanência da associação criminosa
como no tocante ao envolvimento do menor de 18 (dezoito) anos na prática
delitiva o acórdão recorrido faz expressa remissão às provas disponíveis. A revisão pretendida pelos recorrentes na via especial, portanto, é inviabilizada pelo óbice da Súmula 7/STJ.
[...]
8. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 760.284/DF, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 10/05/2016, DJe 16/05/2016.)
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ABSOLVIÇÃO. VÍNCULO ASSOCIATIVO. ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. Rever a conclusão consignada pelas instâncias ordinárias pela existência de elementos concretos e coesos que comprovaram a existência do vínculo de estabilidade e de permanência necessários à condenação dos agravantes pelo crime de formação de quadrilha demandaria imprescindível revolvimento do acervo fático-probatório delineado nos autos, procedimento vedado em recurso especial, a teor da Súmula n. 7 do STJ .
2. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 760.501/RN, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 17/12/2015, DJe 02/02/2016).
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME MILITAR. PECULATO. ABSOLVIÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. AGRAVANTE GENÉRICA PREVISTA NO ART. 70, II, "L", DO CÓDIGO PENAL MILITAR - CPM. APLICAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. AGRAVO DESPROVIDO.
1. No que tange à pretendida desclassificação, sob o argumento de que não há provas suficientes para a condenação pelo crime de peculato, inafastável a incidência do verbete n. 7 da Súmula do STJ, pois entender de forma diversa do Tribunal de origem demandaria necessariamente no revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado nesta instância especial.
2. "A 3ª Seção desta Corte Superior, em 08/05/2019, por ocasião do exame do AgRg nos EDv nos EAREsp 868.628/RJ, decidiu que a agravante genérica do art. 70, II, "l", do CPM pode ser aplicada aos militares que, em serviço, cometem o delito de concussão, já que a circunstância de "estar em serviço" não é elementar do tipo do art. 305 do CPM" (AgRg no AgRg na PET no AREsp 87.668/RJ, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, DJe 24/9/2019).
3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1853686 / SC, Relator(a) Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, Data da Publicação/Fonte: DJe 29/05/2020).
Ante o exposto, nego provimento ao agravo em recurso especial.
Publique-se.
Intimem-se.
Brasília, 01 de junho de 2021.
OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO)
Relator