10 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1791689 - SP (2020/0305837-1)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
AGRAVANTE : ALTA PAULISTA INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - MASSA FALIDA
ADVOGADO : ELY DE OLIVEIRA FARIA - ADMINISTRADOR JUDICIAL -SP201008
AGRAVADO : MARIA NEIDE PINHEIRO MEROTI
AGRAVADO : NELSON MEROTI
ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS DE SOUZA - SP086412 RODRIGO OTÁVIO DA SILVA - SP213046
INTERES. : JUNQUEIROPOLIS AGROCOMERCIAL LTDA - MASSA FALIDA
ADVOGADO : ELY DE OLIVEIRA FARIA - ADMINISTRADOR JUDICIAL -SP201008
DECISÃO
1. Cuida-se de agravo interposto por MASSAS FALIDAS de ALTA
PAULISTA INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA. e de JUNQUEIRÓPOLIS
AGROCOMERCIAL LTDA. contra r. decisão que não admitiu o seu recurso especial,
por sua vez manejado em face de v. acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DE SÃO PAULO, assim ementado:
“Agravo interno. Decisão agravada que indeferiu o pedido de concessão de
gratuidade e, de ofício, anulou decisões proferidas pelo d. magistrado
singular após a prolação de sentença. Manutenção. O estado de
recuperação judicial, por si só, não é circunstância suficiente para o
deferimento do pedido de concessão da gratuidade, ou de diferimento. A r.
sentença, ao confirmar a tutela de urgência liminarmente concedida, não
condicionou a alienação da safra ao depósito judicial do valor obtido. O
recurso de apelação interposto, por sua vez, é dotado de efeito meramente
devolutivo, motivo pelo qual nada obsta a venda da cana, sem bloqueio
dos valores arrecadados. Recurso improvido.”
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.
Nas razões do recurso especial, apontou a parte agravante (art. 105, III,
alíneas “a” e “c”, da CF) haver, além de dissídio jurisprudencial, ofensa ao disposto nos
arts. 76, 108, §3º e 115 da Lei 11.101/2005, arts. 278, 502, 505, 509, 510, 511, 512 e
1.021, §4°, do CPC/15, argumentando, em síntese, que: (1) embora tenha constatado
que as ora agravantes tenham tido sua falência decretada, o Tribunal de origem
deferiu, com supressão de instância e afronta à coisa julgada, o levantamento
prematuro do valor obtido com a alienação da safra de cana-de-açucar, R$444.145,37
com os devidos acréscimos, em favor dos agravados; (2) a falência foi decretada em
27/07/2018. Com isso, todos os ativos do patrimônio da atividade empresária das
agravantes estão vinculados à liquidação do passivo no concurso universal da falência;
(3) a decisão exarada no Tribunal de origem viola o pars conditio creditorum, (4) as
agravantes pretendem que seja autorizada a remessa do valor para integrar o monte
da falência; (5) o pedido foi indeferido pelo Tribunal de origem à justificativa de que ainda não há certeza ou liquidez no crédito eventual que as falidas titularizariam face aos agravados; (6) é ilegal a condenação ao pagamento de multa de 5% por oposição de embargos manifestamente inadmissível. Afinal, o recurso impugnou pontos específicos do acórdão que demandam esclarecimento; (7) é inviável a alteração do título executivo judicial como promovido pelo Tribunal de origem na exação do acórdão recorrido; (8) o título executivo judicial definiu que o saldo obtido da venda da cana-deaçucar deveria ser destinado à Conta Judicial e sobre o ponto operou-se a coisa julgada por não ter sido objeto de insurgência da parte contrária; (9) a retomada da posse do bem imóvel rural pelos agravados, o despejo das agravantes, não tem o condão de permitir a retenção dos valores obtidos com a venda da safra pelos parceiros agrícolas; (10) no momento da prolação da sentença que constituiu o título executivo judicial, sequer era conhecida a existência de crédito reivindicado pelos agravados, o que estava pendente de apuração em fase de liquidação de sentença; (11) em 15/07/2017, na concessão da tutela de urgência, os agravados foram autorizados exclusivamente a vender a safra de cana-de-açucar e depositar o valor apurado em Conta Judicial; (12) a liberação do numerário para quitação antecipada de crédito é uma extrapolação não autorizada em aludida decisão; (13) o mérito de toda aludida situação sequer foi examinado pelo Tribunal de origem, que considerou deserta a apelação por ausência de preparo, negando a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça e ignorando o fato de que as agravantes estão falidas; (14) o acórdão incorreu em supressão de instância e autorizou o levantamento de numerário em violação à coisa julgada; (15) medidas constritivas, ainda que se refiram a créditos anteriores à quebra, devem ser examinadas pelo Juízo Falimentar; (16) o suposto crédito dos agravados não foi sequer liquidado; (17) o crédito em questão deve ser habilitado na falência e o numerário deve ser remetido ao Juízo Falimentar; (18) a decretação da falência impõe a reunião de todos os credores e os bens da massa falida em um só processo, determina a suspensão de todas as execuções individuais.
Foi certificada a ausência de apresentação de contrarrazões de recurso especial à fl. 1792.
Crivo negativo de admissibilidade ao recurso (fls. 1799-1802).
Contra aludida decisão, as recorrentes interpõem o agravo (fls. 1805-1853).
Foi certificada a ausência de apresentação de contraminuta ao agravo em recurso especial à fl. 1865.
É o relatório.
DECIDO.
2. Em suas razões recursais, apontou a parte ora agravante haver, além de dissídio jurisprudencial, ofensa ao disposto nos arts. 76, 108, §3º e 115 da Lei 11.101/2005, arts. 278, 502, 505, 509, 510, 511, 512 e 1.021, §4°, do CPC/15, argumentando, em síntese, que: (1) embora tenha constatado que as ora agravantes tenham tido sua falência decretada, o Tribunal de origem deferiu, com supressão de instância e afronta à coisa julgada, o levantamento prematuro do valor obtido com a alienação da safra de cana-de-açucar, R$444.145,37 com os devidos acréscimos, em favor dos agravados; (2) a falência foi decretada em 27/07/2018. Com isso, todos os ativos do patrimônio da atividade empresária das agravantes estão vinculados à liquidação do passivo no concurso universal da falência; (3) a decisão exarada no Tribunal de origem viola o pars conditio creditorum, (4) as agravantes pretendem que seja autorizada a remessa do valor para integrar o monte da falência; (5) o pedido foi indeferido pelo Tribunal de origem à justificativa de que ainda não há certeza ou liquidez no crédito eventual que as falidas titularizariam face aos agravados; (6) é ilegal a condenação ao pagamento de multa de 5% por oposição de embargos manifestamente inadmissível. Afinal, o recurso impugnou pontos específicos do
acórdão que demandam esclarecimento; (7) é inviável a alteração do título executivo judicial como promovido pelo Tribunal de origem na exação do acórdão recorrido; (8) o título executivo judicial definiu que o saldo obtido da venda da cana-de-açucar deveria ser destinado à Conta Judicial e sobre o ponto operou-se a coisa julgada por não ter sido objeto de insurgência da parte contrária; (9) a retomada da posse do bem imóvel rural pelos agravados, o despejo das agravantes, não tem o condão de permitir a retenção dos valores obtidos com a venda da safra pelos parceiros agrícolas; (10) no momento da prolação da sentença que constituiu o título executivo judicial, sequer era conhecida a existência de crédito reivindicado pelos agravados, o que estava pendente de apuração em fase de liquidação de sentença; (11) em 15/07/2017, na concessão da tutela de urgência, os agravados foram autorizados exclusivamente a vender a safra de cana-de-açucar e depositar o valor apurado em Conta Judicial; (12) a liberação do numerário para quitação antecipada de crédito é uma extrapolação não autorizada em aludida decisão; (13) o mérito de toda aludida situação sequer foi examinado pelo Tribunal de origem, que considerou deserta a apelação por ausência de preparo, negando a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça e ignorando o fato de que as agravantes estão falidas; (14) o acórdão incorreu em supressão de instância e autorizou o levantamento de numerário em violação à coisa julgada; (15) medidas constritivas, ainda que se refiram a créditos anteriores à quebra, devem ser examinadas pelo Juízo Falimentar; (16) o suposto crédito dos agravados não foi sequer liquidado; (17) o crédito em questão deve ser habilitado na falência e o numerário deve ser remetido ao Juízo Falimentar; (18) a decretação da falência impõe a reunião de todos os credores e os bens da massa falida em um só processo, determina a suspensão de todas as execuções individuais.
De outra parte, os acórdãos recorridos consignaram o seguinte sobre os temas devolvidos ao exame:
Fls. 834-835
“Com efeito, o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial, por si só, não é circunstância suficiente para a concessão da gratuidade, tampouco do diferimento do pagamento das custas ao final do processo. De fato, como já observado, para o deferimento do pleito seria necessária efetiva comprovação de impossibilidade de arcar com as custas e despesas processuais, o que não ocorreu nestes autos, em que as postulantes ao benefício se restringem a alegar a situação de crise econômica, não acompanhando o pedido com documentos hábeis para demonstrar a incapacidade financeira . Nesse contexto, deve ser mantida a decisão que indeferiu o pedido de concessão da gratuidade, e facultou às postulantes a comprovação do recolhimento do preparo recursal. Por sua vez, também não prospera a irresignação dirigida à anulação das decisões proferidas pelo magistrado singular após proferida sentença. Sobre o tema, de início, cumpre observar que o juízo universal também se sujeita o duplo grau de jurisdição, de modo que as decisões proferidas pelo d. magistrado singular podem ser objeto de discussão nesta Instância. Além disso, como exposto na r. decisão objeto do presente agravo interno, a r. sentença, ao confirmar o deferimento do pedido de tutela de urgência, autorizando o processamento e a alienação da cana, o fez com a observação de que as requeridas poderiam obstar a retomada da safra pelos autores, mediante a purgação da mora. Não foi imposta, portanto, qualquer condição para a reintegração de posse, senão a observância do prazo para as requeridas, caso considerassem oportuno, pagarem o débito em aberto . Transcorrido tal prazo, o processamento e a alienação da safra pelos autores é autorizada pelos termos da própria sentença, sem demais condicionamentos, como o depósito judicial do preço obtido . Aliás, a apelação interposta contra referida sentença não é dotada de efeito suspensivo, motivo pelo qual a decisão passou a surtir efeitos imediatamente, o que autoriza a
alienação da safra. Nesse contexto, as posteriores decisões proferidas na origem com o objetivo de determinar o depósito são eivadas de nulidade, porquanto exaurida a jurisdição com a prolação da sentença. Por fim, reiterando o quanto já observado, a eventual reversão do julgado não resultará em prejuízo para as apelantes, na medida em que, caso seja apurado crédito em seu favor, poderão elas proceder com as medidas judiciais adequadas em face dos autores. Ante o exposto, nego provimento ao recurso.” (g n).
Fls. 1441-1442
“O recurso não pode ser conhecido, uma vez que não foi instruído com a guia comprobatória do recolhimento do preparo recursal, sendo, portanto, deserto. Frise-se que o indeferimento do pedido de concessão da gratuidade, bem como a determinação de recolhimento do preparo nos termos do art. 1.007, §4°, do CPC/2015, foram disponibilizados no DJe em 22.11.2018. Nesse contexto, e não versando sobre o tema os embargos de declaração opostos pelas apelantes, conclui-se que o termo final para a comprovação de recolhimento do preparo recaiu em 14.12.2018, sem que as requeridas tenham atendido à determinação. Denota-se, portanto, que o presente recurso não preenche os pressupostos de admissibilidade.”
Fls. 1686-1688
“De fato, as questões apontadas pelas agravantes já foram abordadas e rejeitadas na decisão proferida em fls. 1618/1619 dos autos principais. Com efeito, observou-se que mesmo questões de ordem pública, conquanto possam ser apreciadas a qualquer tempo e grau de jurisdição, não se sujeitando à preclusão temporal, sujeitam-se, todavia, à preclusão consumativa, vale dizer, uma vez apreciadas, não podem ser reiteradamente submetidas à apreciação. Além disso, também se constatou que as arguições de nulidade não prosperavam, eis que dependiam da eventual análise das matérias de ordem pública suscitadas, o que já se rejeitou. Ante o exposto, nego provimento ao recurso e, com fundamento no art. 1.021, §4°, do CPC, condeno as agravantes ao pagamento de multa fixada em 5% (cinco por cento) do valor atualizado da causa.”
3. Com relação à suposta ofensa aos arts. 76, 108, §3º e 115 da Lei 11.101/2005, arts. 278, 502, 505, 509, 510, 511, 512 do CPC/15, o recurso especial não reúne condições para ser conhecido, pois aludidos dispositivos não foram sequer objeto de menção nos acórdãos recorridos na parte que examinou a pretensão recursal das ora agravantes.
Portanto, a matéria referente aos mencionados dispositivos de lei federal não foi objeto de discussão no acórdão recorrido, apesar da oposição de embargos de declaração, não se configurando o prequestionamento, o que impossibilita a sua apreciação na via especial (Súmulas 282/STF e 211/STJ).
A propósito, não se configura o prequestionamento implícito quanto sequer a tese jurídica correspondente à suposta violação do dispositivo tenha sido objeto de exame pelo Tribunal de origem. A oposição de embargos de declaração rejeitados e sem efeito integrativo não atende ao requisito do prequestionamento.
4. Outrossim, tem-se que as razões de recurso especial - relativas à ilegalidade da autorização de levantamento do valor obtido com a venda da safra de cana-de-açucar, relativa à violação da coisa julgada, relativa à violação do pars conditio creditorum - são completamente dissociadas do objeto dos acórdãos recorridos. Com efeito, nos pontos destacados, as razões do recurso especial encontram-se absolutamente dissociadas dos fundamentos do acórdão recorrido, circunstância que faz incidir a Súmula 284/STF.
5. Quanto à fundamentação do acórdão recorrido de que seus recursos não eram manifestamente inadmissíveis, o recurso especial não apresentou impugnação específica especialmente quanto ao fundamento de que as agravantes não comprovaram efetiva necessidade de gratuidade de justiça, não efetuaram o recolhimento do preparo nem após a abertura de prazo para tanto em Segundo Grau de jurisdição.
Com efeito, os acórdãos recorridos estão assentados em mais de um fundamento suficiente para mantê-los e as agravantes não cuidaram de impugná-los, como seria de rigor.
A subsistência de fundamento inatacado apto a manter a conclusão do aresto impugnado impõe o não-conhecimento da pretensão recursal, a teor do entendimento disposto na Súmula nº 283/STF: “É inadmissível o recurso extraordinário quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.”
6. Sobretudo a versão dos fatos defendida em sede de recurso especial claramente desafiou as premissas fáticas estabelecidas no acórdão de origem. No presente caso, constato que o acolhimento da pretensão recursal demandaria a alteração das premissas estabelecidas pelo acórdão recorrido, com o revolvimento das provas carreadas aos autos, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos do enunciado da Súmula 7 do STJ. Ressalto que o recurso especial não está vocacionado ao debate dos fatos e das provas, cuja versão se firma por meio do acórdão exarado em Segundo Grau.
Merece destaque, sobre o tema, o consignado no julgamento do REsp 336.741/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 07/04/2003, "(...) se, nos moldes em que delineada a questão federal, há necessidade de se incursionar na seara fáticoprobatória, soberanamente decidida pelas instâncias ordinárias, não merece trânsito o recurso especial, ante o veto da súmula 7-STJ".
7. Ante o exposto, nego provimento ao agravo em recurso especial.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 01 de junho de 2021.
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator