28 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - HABEAS CORPUS: HC 702492 GO 2021/0344080-0 - Decisão Monocrática
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
HABEAS CORPUS Nº 702492 - GO (2021/0344080-0)
RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK
IMPETRANTE : DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE GOIAS
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS
PACIENTE : SALENA AZEVEDO BANDEIRA RODRIGUES (PRESO)
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, com pedido de liminar, impetrado em benefício de SALENA AZEVEDO BANDEIRA RODRIGUES contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS proferido no julgamento da Apelação n. 272912-52.2017.8.09.0175.
Infere-se dos autos que a paciente foi presa em flagrante por ter cometido o crime previsto no art. 155 c/c art. 14, II, ambos do Código Penal (furto na modalidade tentada).
Ofertada a denúncia, esta foi rejeitada pelo Juízo por falta de justa causa, nos termos do art. 395, III, do Código de Processo Penal.
Irresignado, o Ministério Público interpôs recurso em sentido estrito, o qual foi provido, por acórdão que restou assim ementado:
"RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE FURTO TENTADO. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA COM BASE NO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RECURSO MINISTERIAL PELO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. ACOLHIMENTO DO RECURSO.
I - Estando presentes os requisitos do art. 41. do Código de Processo Penal, impõe-se o recebimento da denúncia.
RECURSO PROVIDO." (fl. 194)
No presente writ, a impetrante afirma que foram preenchidos os requisitos objetivos para a aplicação do principio da insignificância. Nessa senda, assevera que a conduta da paciente seria atípica, pois não teria ocorrido lesão relevante ao patrimônio da vítima, o que excluiria a tipicidade material.
Assim, requer, em liminar, a suspensão dos efeitos da decisão e, no mérito, o restabelecimento da sentença.
É o relatório.
Decido.
Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a
impetração sequer deveria ser conhecida. Todavia, considerando as alegações
expostas na inicial, mostra-se razoável a sua análise para verificar a existência de
eventual constrangimento ilegal.
No caso dos autos, o Tribunal a quo afastou o principio da insignificância, com
base nos seguintes fundamentos:
" É indiscutível a relevância do princípio da insignificância no direito penal pátrio, por afastar a incidência da norma penal daquelas condutas cujo desvalor da ação ou do resultado impliquem numa ínfima afetação ao bem jurídico tutelado, no entanto, os pressupostos para a aplicação do princípio da insignificância penal não se fazem presentes no caso em revista, pois os bens retirados das prateleiras do supermercado ((R$745,69) somam quase um saláriomínimo vigente à época (R$ 937,00), ainda que seja de pouca expressão econômica para a vítima, e restituído, além de cabível a incidência do crime de bagatela, mas não como causa de rejeição da denúncia, limitada as hipóteses do art. 396, do Código de Processo Penal, e sim de ulterior absolvição sumária, no devido momento previsto atualmente na legislação, no art. 397, inciso III, do citado código.
Estando presentes os requisitos do art. 41, do Código de Processo Penal, impõe-se o recebimento da denúncia, tendo em vista que eventual incidência do princípio da insignificância não é mais causa de rejeição da inicial acusatória, mas de absolvição sumária, nos termos do disposto no art. 397, III, do citado código." (fl. 190)
Desta forma, mostra-se descabida a aplicação do princípio da insignificância,
ante o expressivo valor resultante da soma dos bens que foram objetos da subtração,
como bem apontado pelo Tribunal a quo "os bens retirados das prateleiras do
supermercado ((R$745,69) somam quase um salário-mínimo vigente à época (R$
937,00)". Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. FURTO. INSIGNIFICÂNCIA. VALOR SUPERIOR A 10% DO SALÁRIO-MÍNIMO. HABITUALIDADE DELITIVA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Esta Corte Superior tem seguido, na última década, o entendimento de que para a aplicação do princípio da insignificância deverão ser observados os seguintes vetores: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) ausência periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do
agente e d) inexpressividade da lesão jurídica. Tais vetores interpretativos encontram-se expostos de forma analítica no HC 84.412, Rel. Min.
CELSO DE MELLO, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/10/2004, DJ 19/11/2004.
É certo, ainda, que a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, para aferir a relevância do dano patrimonial, leva em consideração o salário mínimo vigente à época dos fatos, considerando irrisório o valor inferior a 10% do salário mínimo, independentemente da condição financeira da vítima.
2. No caso em análise, o furto teria sido praticado no dia 4/8/2018, quando o salário mínimo estava fixado em R$ 954,00 (novecentos e cinquenta e quatro reais). Nesse contexto, seguindo a orientação jurisprudencial desta Corte, a res furtiva avaliada em R$ 114,50 (cento e quatorze reais e cinquenta centavos) não pode ser considerada de valor ínfimo, por superar 10% do salário mínimo vigente à época dos fatos.
3. Para reconhecimento da habitualidade delitiva em crimes patrimoniais cujo valor da res é de pequena monta, diferentemente do que acontece com a reincidência, não há a necessidade de que o paciente ostente condenações transitadas em julgado.
4. Agravo Regimental no habeas corpus desprovido. (AgRg no HC 625.422/SP, de minha relatoria, QUINTA TURMA, DJe 24/09/2021).
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. FURTO TENTADO. PEDIDO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. VALOR DOS BENS SUPERIOR A 10%. ENTENDIMENTO DESTA CORTE. FORTES INDÍCIOS DE CONTUMÁCIA DELITIVA. REEXAME FÁTICO.
1. Os bens furtados ultrapassam o valor de 10% do salário mínimo vigente à época dos fatos (um aparelho liquidificador e um faqueiro avaliados em R$ 199,89) , além de ter havido muita ousadia da conduta criminosa, dentro de um shopping center, quando o paciente tentou empreender fuga, com o risco de lesionar as pessoas de dentro do estabelecimento, causando insegurança.
2. Agravo regimental improvido.
(AgRg no HC 641.046/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 17/09/2021).
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME DE FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. BENS FURTADOS. VALOR NÃO ÍNFIMO. RELEVÂNCIA DA LESÃO PATRIMONIAL. HABITUALIDADE CRIMINOSA. DECISÃO MANTIDA.
1. A aplicação do princípio da insignificância, segundo a orientação do Supremo Tribunal Federal,
demanda a verificação da lesividade mínima da conduta, apta a torná-la atípica, considerando-se: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) a inexistência de periculosidade social na ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. O Direito Penal não deve ocupar-se de condutas que, diante do desvalor do resultado produzido, não representem prejuízo relevante para o titular do bem jurídico tutelado ou para a integridade da própria ordem social.
2. Quando o valor dos bens furtados não é considerado ínfimo, segundo critério utilizado pelo STJ para aferição da relevância da lesão patrimonial, não se aplica o princípio da insignificância.
3. A habitualidade criminosa impede a aplicação do princípio da insignificância.
4. Mantém-se integralmente a decisão agravada cujos fundamentos estão em conformidade com o entendimento do STJ sobre a matéria suscitada.
5. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC 634.763/PR, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUINTA TURMA, DJe 06/08/2021).
Por tais razões, indefiro liminarmente o presente habeas corpus, nos termos do
art. 34, XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.
Publique-se.
Intimem-se.
Brasília, 28 de outubro de 2021.
JOEL ILAN PACIORNIK
Relator