10 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
Superior Tribunal de Justiça
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.994.013 - SP (2021/0322514-4)
RELATOR : MINISTRO PRESIDENTE DO STJ
AGRAVANTE : COMPANHIA DO METROPOLITANO DE SAO PAULO
ADVOGADOS : JORDANA DY THAIAN ISAAC ANTONIOLLI - SP202266 GUILHERME VIEIRA DE CAMARGO - SP369485
AGRAVADO : MARILZA RONDINONI GOMES
ADVOGADO : VANESSA DE OLIVEIRA BARROS SARAIVA - SP355439
DECISÃO
Cuida-se de agravo apresentado por COMPANHIA DO METROPOLITANO DE SÃO PAULO contra a decisão que não admitiu seu recurso especial.
O apelo nobre fundamentado no artigo 105, inciso III, alínea "a" da CF/88, visa reformar acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, assim resumido:
RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATO DE TRANSPORTE. QUEDA DA AUTORA NO VÃO EXISTENTE ENTRE O TREM E A PLATAFORMA, DURANTE O DESEMBARQUE, DEVIDO À AGLOMERAÇÃO DE PESSOAS E A PARADA DESALINHADA DA COMPOSIÇÃO COM OS REDUTORES EXISTENTES NA PLATAFORMA. CONSIDERAÇÃO DE QUE O ACIDENTE OCASIONOU A AUTORA, À ÉPOCA COM 74 ANOS DE IDADE, ESCORIAÇÕES E HEMATOMAS GRAVES. EXCLUDENTES DE FATO DE TERCEIRO OU DE CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO CARATERIZADOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA TRANSPORTADORA. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE CONFIGURADO, UMA VEZ QUE CONSTITUI OBRIGAÇÃO DA TRANSPORTADORA CONDUZIR SEUS PASSAGEIROS DE FORMA SEGURA ATÉ O SEU LOCAL DE DESTINO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. INDENIZAÇÃO ARBITRADA EM R0.000,00, TENDO EM VISTA AS PECULIARIDADES DO CASO. TERMO INICIAL DA CORREÇÃO MONETÁRIA DESDE O ARBITRAMENTO (DATADO ACÓRDÃO). INTELIGÊNCIA DA SÚMULA N. 362, DO STJ. JUROS LEGAIS DE MORA CONTADOS A PARTIR DA CITAÇÃO, POR SE TRATAR DE RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REFORMADA. PEDIDO INICIAL JUGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO, EM PARTE, PROVIDO
Quanto à primeira controvérsia, alega violação do art. 186 do CC, no que concerne à indispensabilidade da demonstração do nexo causal para aplicação N195
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de dano moral por acidente ocorrido em estação de metrô, trazendo os seguintes argumentos:
No caso, a contrariedade e negativa de vigência ao artigo 186 do Código Civil de 2002 restam evidentes. A Recorrida claramente amparou a sua causa de pedir em uma possível omissão da Companhia do Metrô e de seus funcionários, que, teriam permitido que fosse empurrada por outros usuários quando embarcava na composição, gerando os danos morais descritos na exordial. As imagens, já juntadas aos autos, demonstram, inclusive, que não houve qualquer empurrão. No entanto, ainda assim entenderam os Ilustres Desembargadores que a responsabilidade da Cia. do Metrô prescindiria de culpa, aplicando ao caso a responsabilização objetiva, com fulcro no art. 734 do Código Civil de 2002.
E neste ponto é que constou a contrariedade e negativa de vigência ao artigo 186 do Código Civil, eis que como bem apontado pelo v. acórdão acima transcrito, a responsabilidade civil do Estado, por omissão, não pode se entender objetiva, e sim subjetiva!
Tal é o que já por reiteradas vezes entendeu o E. Supremo Tribunal Federal.
Se a responsabilidade da Companhia do Metrô independe de culpa e é, portanto, objetiva, deveria a Recorrida ter apontado assim como
deveriam os v. acórdãos recorridos ter expressamente reconhecido a
conduta comissiva ou omissiva voluntária praticada pela Recorrente, a sua culpa ou dolo pelo evento danoso produzido, bem assim caracterizando o suposto ato ilícito; elementos estes exigidos pelo referido dispositivo para gerar o dever de indenizar.
Assim, deveria a Recorrida ter demonstrado a existência de todos os requisitos estabelecidos no artigo 186 do Código Civil (ação ou omissão voluntária, dolo ou culpa, dano e nexo causal) já que neste caso, conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial, a responsabilidade civil é de índole SUBJETIVA (fls. 263/264).
Quanto à segunda controvérsia, alega violação dos arts. 734 do CC e 14, § 3º, II, do CDC, no que concerne à inexistência de responsabilidade do transportador por ocorrência de dano causado por culpa exclusiva da vítima, trazendo os seguintes argumentos:
Assim, eventuais danos causados por culpa exclusiva da vítima não devem ser suportados pelo transportador, no caso, a Recorrente, uma vez que não praticou ela qualquer conduta, em sentido amplo, capaz de produzir o evento danoso. Se responsabilidade existiu, esta é, única e exclusivamente do consumidor.
O v. acórdão recorrido, ao imputar responsabilidade civil à Companhia do Metrô contrariou o artigo 14, § 3º, inciso II do Código de Defesa do Consumidor, bem como o artigo 734 do Código civil, negando-lhes vigência (fl. 271).
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É, no essencial, o relatório. Decido.
No que concerne ao recurso apresentado, quanto à primeira e à segunda controvérsia, na espécie, o Tribunal de origem se manifestou nos seguintes termos:
De pronto, cumpre deixar assentado que não se controverte nestes autos acerca da queda da autora no vão situado entre o trem e a plataforma, ao desembarcar na estação Penha, ocasionando-lhe o acidente escoriações e hematomas graves, conforme fotografias de fls. 17/27 e formulário de atendimento de primeiros socorros de fls. 180/181.
Suplantada esta questão, insta realçar que, respeitado o entendimento perfilhado pelo d. magistrado, o evento de que cuidam estes autos não merece ser catalogado como fato de terceiro, estranho ao contrato de transporte, equiparando-se a fortuito externo, tampouco se trata aqui de hipótese de culpa exclusiva da vítima, de molde a excluir a responsabilidade civil da transportadora, tendo em vista que os fatos narrados expressam na verdade manifesta falha na prestação do serviço de transporte, que, como é sabido, deve ser prestado de forma adequada e segura, conforme dispõe o artigo 734, do Código Civil.
Bem é de ver que a responsabilidade da transportadora pelo fato que nestes autos se lhe imputa é contratual e objetiva, razão pela qual constituía seu dever conduzir a passageira incólume ao seu destino, o que, lamentavelmente, não ocorreu, tanto é que, por evidente falta de segurança, veio ela a cair no espaço existente entre o trem e a plataforma, devido à aglomeração de pessoas, aliado ao desalinhamento da parada do trem com os redutores existentes na plataforma, ao desembarcar na estação Penha, ocasionando-lhe o episódio lesão corporal consistente em escoriações e hematomas, conforme laudo médico de fls. 106/112, além de constrangimento, angústia e sofrimento passíveis de indenização, tendo o evento atingido também a integridade emocional da lesada.
Vale ressaltar que a aglomeração de pessoas nas composições metroviárias, em horários de pico, que gera empurra-empurra no embarque e desembarque, sem qualquer fiscalização ou organização por parte de prepostos do Metrô, são práticas corriqueiras e evidenciam falha e insuficiência na prestação do serviço de transporte, conferindo verossimilhança à alegação de que “estava dentro do vagão, quando a composição ferroviária estacionou para permitir o desembarque dos passageiros, e na grande aglomeração de pessoas forçou a saída dos vagões, eis que a requerente ao desembarcar acabou caindo no vão entre o trem e a plataforma, tendo sido resgatada pelos populares que a retiraram do vão. A plataforma da Estação é protegida por um Extensor de Borracha - elastômetro, ou seja, um redutor de vão instalado entre a plataforma e o trem nos trechos onde abrem as portas para tornar o embarque/desembarque dos passageiros seguro, evitando com que os usuários coloquem os pés, e ou as pernas no vão. Ocorre que, a parada
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do trem se deu fora da mencionada proteção, fazendo com que a usuária caísse de corpo inteiro, ficando somente com os membros superiores e o pescoço fora do vão.” (fls. 02).
No caso em comento, ainda que a autora não tenha sido empurrada por outro passageiro em razão da lotação da composição naquele horário [fato alegado na contestação (fls. 122/146)], a queda da autora no vão entre o trem e plataforma, no momento do desembarque [fato incontroverso] demonstra a falta de cumprimento do dever geral de qualidade, segurança e eficiência, imposta ao fornecedor, em afronta ao disposto no artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor.
Bem por isso, tem-se como inquestionável a responsabilidade da ré em reparar os danos morais experimentados pela autora, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, em decorrência da dor e do abalo psicológico a que foi submetida em virtude do acidente em exame no feito (fl.).
Assim, incide o óbice da Súmula n. 7 do STJ (“A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”), uma vez que o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do acervo fático-probatório juntado aos autos.
Nesse sentido: “O recurso especial não será cabível quando a análise da pretensão recursal exigir o reexame do quadro fático-probatório, sendo vedada a modificação das premissas fáticas firmadas nas instâncias ordinárias na via eleita (Súmula n. 7/STJ)”. (AgRg no REsp n. 1.773.075/SP, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 7/3/2019.)
Confiram-se ainda os seguintes precedentes: AgInt no AREsp n. 1.679.153/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 1/9/2020; AgInt no REsp n. 1.846.908/RJ, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe de 31/8/2020; AgInt no AREsp n. 1.581.363/RN, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 21/8/2020; e AgInt nos EDcl no REsp n. 1.848.786/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 3/8/2020; AgInt no AREsp n. 1.311.173/MS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 16/10/2020.
Ante o exposto, com base no art. 21-E, V, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, conheço do agravo para não conhecer do recurso especial.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 29 de novembro de 2021.
MINISTRO HUMBERTO MARTINS
Presidente
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