28 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1969612 RJ 2021/0355942-7 - Decisão Monocrática
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
RECURSO ESPECIAL Nº 1969612 - RJ (2021/0355942-7)
RELATOR : MINISTRO JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT)
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RECORRIDO : J V DA S
ADVOGADO : FLAVIANE SOUZA FREITAS - RJ176590
DECISÃO
Trata-se de recurso especial interposto por MINISTÉRIO PÚBLICO DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO , com fundamento no art. 105, inciso III, alínea a , da
Constituição da República, contra o v. acórdão prolatado pelo eg. Tribunal de Justiça
daquele Estado.
Consta dos autos que a parte recorrida foi condenada à pena de 08 (oito) anos
de reclusão, em regime inicial semiaberto , pela prática do delito previsto no art. 217-A,
do Código Penal (fls. 117-122).
Irresignada, a defesa apelou da referida decisão. O eg. Tribunal a quo, por
maioria, negou provimento à apelação , mantendo a condenação pelo crime de estupro
de vulnerável (fls. 170-178), em decisão assim ementada (fls. 170-172):
“APELAÇÃO. ARTIGO 217-A DO CÓDIGO PENAL.
RECURSO DEFENSIVO PRETENDENDO A ABSOLVIÇÃO POR
INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. RECURSO A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. Do conjunto probatório – Ao contrário do sustentado
pela defesa, a prova carreada aos autos se mostra robustae suficiente
no sentido de proclamar o real envolvimento do acusado na prática da
conduta delituosa em questão. Encerrada a instrução criminal, restou
demonstrado, de forma inequívoca, ter o acusado cometido ato
libidinoso diverso da conjunção carnal, consistente em passar a mão na
genitália de menino de sete anos de idade, no interior de transporte
público. Consoante as peças dos autos, o acusado entrou no ônibus e
sentou-se no banco traseiro, ao lado do menino, cuja genitora se
encontrava no assento da frente. Durante o percurso o apelante colocou
a mão, por duas vezes, na perna da criança, a primeira na altura do
joelho e, posteriormente, na coxa. A atitude do acusado chamou a
atenção de outro passageiro, o qual passou a reparar nos movimentos
do réu, percebendo quando ele colocou a mão na virilha do menino. In casu, a materialidade e a autoria da conduta restaram sobejamente demonstradas pelos depoimentos das testemunhas de acusação, que estão em consonância com as declarações prestadas pela vítima, em sede policial, e, ratificada na entrevista com a equipe de psicologia do Ministério Público, como se infere do parecer psicológico. Com efeito, a negativa de autoria, por parte do réu, não tem o condão de infirmar a prova acusatória. Impõe ressaltar que o próprio acusado declara não se recordar do que aconteceu no dia. Como se vê, a prova produzida é segura e suficiente para embasar com convicção a prolação de um decreto condenatório, uma vez que confirma de forma inequívoca a prática pelo acusado do crime descrito na exordial. Cumpre ressaltar que a ausência de exame pericial não afasta a materialidade do delito, principalmente, diante da espécie de ato libidinoso imputado ao acusado. Como sabido, nos delitos sexuais praticados contra menor de 14 anos, a violência é presumida. Demais disso, infere-se dos autos que o ato libidinoso praticado pelo réu foi invasivo ao corpo da vítima, restando caracterizada a conduta prevista no art. 217-A, do CP e, não a contravenção penal de constrangimento ilegal, como ventilado pela defesa, e nem o delito de importunação sexual. Precedentes judiciais. Destarte, a prova produzida é segura e suficiente para manter o decreto condenatório. Dosimetria e regime prisional A reprimenda inicial manteve-se no patamar inicial, quantum que se tornou definitivo na ausência de fatores moduladores nas demais etapas do cálculo. l. Mantida a pena estabelecida pela sentença, eis que em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Reputa-se correta a adoção do regime prisional semiaberto, considerando a quantidade de reprimenda impingida. Recurso a que se nega provimento”
Opostos embargos infringentes (fls. 201-206), estes foram conhecidos e
providos, em prestígio ao voto minoritário, para desclassificar a conduta do acusado para o delito do artigo 215-A, do Código Penal, restando estabelecida a resposta penal em 01
(um) ano de reclusão, em regime aberto , declarando-se extinta a pena privativa de liberdade, em razão do seu cumprimento (fls. 237-243). Veja-se a ementa:
Eis a ementa do v. acórdão (fls. 237-238):
“Embargos Infringentes e de Nulidade. Recurso interposto com base no voto minoritário da lavra da Desembargadora ADRIANA LOPES MOUTINHO DAUDT D’OLIVEIRA, dando parcial provimento ao pleito defensivo para readequar a classificação dos fatos para a prevista no art. 215-A, do C. P., aplicando-se a pena de 01 (um) ano de reclusão, em regime aberto. O parecer da Procuradoria de Justiça foi no sentido do não provimento dos embargos. 1. O Acórdão proferido
pela Egrégia Oitava Câmara Criminal deste Tribunal negou provimento ao recurso defensivo, mantendo a condenação pela prática do crime do artigo 217-A, do Código Penal, tendo sido sentenciado a 08 (oito) anos de reclusão, em regime semiaberto, a despeito do voto vencido, da lavra da Desembargadora Revisora ADRIANA LOPES MOUTINHO DAUDT D’OLIVEIRA. 2. Narra a denúncia que no dia 15/01/2019, por volta das 14hs, na Rua Monsenhor Bacelar, Centro, Petrópolis, o denunciado, de forma livre e consciente, praticou ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos, a vítima K. de P. das C., que contava com 7 (sete) anos à época do fato. 3. A divergência prendese à classificação dos fatos imputados ao embargante. 4. Assiste razão ao embargante. A conduta narrada pela exordial acusatória que restou incontroversa foi “o denunciado passou a acariciar a vítima com as mãos, alisando suas pernas por certo período.”, satisfazendo assim a sua própria lascívia. 5. Assim, a hipótese é de desclassificação da conduta, para a descrita no artigo 215-A, do CP, novo tipo penal introduzido pela Lei 13.718/2018. 6. In casu, as provas colhidas evidenciam que o dolo do acusado era de praticar contra a criança ofendida, de tenra idade, ato libidinoso diverso da conjunção carnal, consistente passar a mão na sua perna e na parte íntima. Esse tipo de comportamento, antes considerado estupro, ganha uma definição legal própria. 7. Cabe o ajuste da dosimetria. O acusado é primário e possui bons antecedentes e a gravidade do delito não ultrapassou o âmbito de normalidade previsto no tipo penal. Portanto, entendo que a pena-base deve ser fixada no mínimo legal. 10. Considerando o redimensionamento da pena e que o acusado está preso desde 15/01/2019, deixo de tecer considerações acerca do regime prisional e da substituição da pena para declarar extinta a sanção privativa de liberdade pelo seu cumprimento. 8. Embargos conhecidos e providos, em prestígio ao voto minoritário, para desclassificar a conduta do acusado para o delito do artigo 215-A, do Código Penal, restando estabelecida a resposta penal em 01 (um) ano de reclusão, em regime aberto, declarando-se extinta a pena privativa de liberdade em razão do seu cumprimento, observando-se que o acusado está preso desde 15/01/2019. Expeça-se alvará de soltura e oficie-se"
Nas razões do recurso especial (fls. 259-289), o Parquet sustenta que o v.
acórdão vergastado "negou vigência ao artigo 217-A do Código Penal, na medida em que reconheceu a presença de todos seus elementos constitutivos, igualmente contrariando o
artigo 215-Ado referido diploma legal, ao dar-lhe alcance que não possui, interpretação que se mostra totalmente divergente da Jurisprudência desse E. SUPERIOR TRIBUNAL
DE JUSTIÇA" (fl. 264).
Alega que "o estupro de vulnerável se aperfeiçoa com a simples prática de
conjunção carnal ou outros atos libidinosos com criança ou adolescente menor de 14 (quatorze) anos, isto independentemente de quaisquer outras considerações, sejam acerca da sexualidade da vítima, sejam sobre a “proporcionalidade” ou não da sanção cominada" (fl. 278).
Afirma que "não compete ao julgador, SOB A ALEGAÇÃO DE “PROPORCIONALIDADE/RAZOABILIDADE”, reconhecer a prática do estupro de vulnerável e aplicar tipo penal mais brando, sob pena de se negar vigência ao comando das normas penais" (fl. 279).
Aponta que "v. Acórdão expressamente reconheceu que os atos praticados são considerados libidinosos e, além disto, foram praticados com a finalidade de satisfazer a lascívia do ora recorrido" (fl. 284).
Requer, portanto, o restabelecimento da r. sentença.
Apresentadas as contrarrazões (fls. 304-310), o recurso foi admitido na origem e os autos ascenderam a esta eg. Corte de Justiça.
O Ministério Público Federal apresentou parecer pelo provimento do recurso especial (fls. 333-345).
É o relatório.
Decido.
A questão a ser analisada cinge-se na delimitação do alcance das regras previstas nos artigos 217-A e 215-A, ambos do Código Penal.
Verifica-se, no entanto, que a Terceira Seção afetou os Recursos Especiais n. 1.959.697/SC, 1.957.637/MG, 1.958.862/MG e 1.954.997/SC , da relatoria do Ministro Ribeiro Dantas, ao rito dos recursos repetitivos (RISTJ, art. 257-C) e suspendeu a tramitação de processos com recurso especial e/ou agravo em recurso especial interposto, em tramitação na origem e/ou no STJ, delimitando a questão de direito a ser definida nos seguintes termos: "possibilidade ou não de se desclassificar o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP) para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP)." .
Ilustrativamente:
"PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. DIREITO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. IMPORTUNAÇÃO SEXUAL.
POSSIBILIDADE OU NÃO DE DESCLASSIFICAÇÃO.
1. Delimitação da controvérsia: possibilidade ou não de se desclassificar o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP) para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP).
2. Afetação do recurso especial ao rito dos arts. 1.036 e ss. do CPC/2015 e 256 e ss. do RISTJ." (ProAfR no REsp 1959697/SC, Terceira Seção , Rel. Ministro Ribeiro Dantas , DJe 06/12/2021).
Há que se observar, portanto, a decisão de suspensão do processamento de
todos os feitos pendentes, que versem acerca da questão delimitada e tramitem nesta Corte de Justiça.
Ante o exposto, determino a suspensão do curso do feito a fim de que se aguarde os julgamentos dos recursos repetitivos, pela Terceira Seção deste Superior
Tribunal de Justiça.
Brasília, 10 de dezembro de 2021.
Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT)
Relator