14 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1842652 - SP (2019/XXXXX-7)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
AGRAVANTE : MK ELETRODOMESTICOS MONDIAL S.A
AGRAVADO : CESDE INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ELETRODOMÉSTICOS LTDA
ADVOGADOS : TICIANE HOLANDA TOMAZ DE OLIVEIRA MARINHO - CE021728 GIOVANNI AUGUSTO BALUZ ALMEIDA - CE014399
INTERES. : MK ELETRODOMESTICOS MONDIAL S.A
ADVOGADO : SÔNIA CARLOS ANTÔNIO - SP084759
DECISÃO
Trata-se de agravo interno interposto por MK ELETRODOMÉSTICOS
MONDIAL S.A. contra a decisão de fls. 385/387 e-STJ, que não conheceu do recurso
especial.
Em suas razões, a agravante alega que
"(...) as razões do recurso especial são claras e precisas em
evidenciar que o E. Tribunal de Justiça de São Paulo, ao rejeitar o pedido de
reparação dos danos, tidos como presumidos na seara da propriedade
industrial, afrontou os dispositivos legais indicados (arts. 208, 209 e 210 da
Lei 9.279/96), não havendo como se acordar com entendimento contrário."
(fl. 394 e-STJ)
Defende, ainda, que
"(...)
Exigir do ofendido prova do dano ou do termo inicial da violação
em nada altera a premissa de decidir do Tribunal de origem que, em última
instância, foi condicionar o dano à existência de prova (no caso, do termo
inicial da violação), o que é igualmente dispensado pela lei e jurisprudência,
pois, como já consignado, trata-se de questão a ser apurada na fase de
liquidação." (fl. 395 e-STJ)
Ao final, requer a reconsideração da decisão agravada ou a sua submissão
ao crivo do Colegiado.
Impugnação às fls. 399/413 e-STJ.
É o relatório.
DECIDO.
O acórdão impugnado pelo recurso especial foi publicado na vigência do
Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
De fato, impressionam as razões recursais, motivo pelo qual reconsidero a
decisão agravada e passo ao reexame do recurso especial.
Trata-se de recurso especial interposto por M.K. ELETRODOMÉSTICOS
MONDIAL S.A. e outra, fundamentado no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da
Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo assim ementado:
"CONCORRÊNCIA DESLEAL - Trade dress - Embalagem de ventilador -Criação anterior comprovada pela autora - Embalagens substancialmente semelhantes, inclusive no uso da cor verde e branca - Situação em que ré emprega a mesma tonalidade da cor verde, e na mesma posição da embalagem da autora - Conduta injustificada - Disposição dos componentes gráficos constantes na embalagem dos ventiladores não constituem elementos-padrões no mercado - Inibitória procedente - Apelação parcialmente provida. CONCORRÊNCIA DESLEAL - Lucros cessantes -Violação ao direito de exclusividade do trade dress de embalagem de ventilador - Início de prova do prejuízo material ausente - Indenizatória improcedente - Apelação improvida neste tocante.
Dispositivo: deram parcial provimento." (fl. 267 e-STJ).
Os embargos de declaração opostos pelas recorrentes foram parcialmente
acolhidos em aresto que recebeu a seguinte ementa:
" RECURSO - Embargos de declaração - Inexistência de qualquer vício -Pretensão de acréscimos de fundamentos e explicações não acolhida -Decisão mantida por seus próprios fundamentos - Embargos rejeitados nesta extensão.
RECURSO - Embargos de Declaração - Omissão - Caracterização - Decisão embargada que julgou parcialmente procedente o apelo, deixando de aplicar sanção para a hipótese de descumprimento da ordem de abstenção - Fixada multa diária em R$ 10.000,00, nos termos dos precedentes desta Corte em situações análogas - Nova redação dada ao parágrafo da decisão embargada que disciplinou a ordem - Embargos parcialmente acolhidos.
DISPOSITIVO: Embargos de declaração parcialmente acolhidos." (fl. 338 e-STJ)
Em suas razões (e-STJ fls. 276/292), as recorrentes alegam a violação dos
artigos 208, 209 e 210 da Lei nº 9.279/1996, sustentando, em síntese, que, dada a
natureza peculiar do direito de propriedade intelectual/ industrial, caracterizada a
conduta lesiva (concorrência desleal), presume-se a ocorrência do dano material.
Após a apresentação das contrarrazões (e-STJ fls. 358/373), o recurso foi
admitido na origem (STJ fls. 377/378).
A irresignação merece prosperar.
De fato, a jurisprudência desta Corte Superior converge quanto ao
entendimento de que, "na hipótese de concorrência desleal, os danos materiais se
presumem, tendo em vista o desvio de clientela e a confusão entre as marcas, podendo
ser apurados em liquidação de sentença " (AgInt no REsp nº 1.645.776/RJ, Relator
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Terceira Turma, DJe 4/10/2019 - grifouse).
No mesmo sentido:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO POR DECISÃO MONOCRÁTICA. SÚMULA N. 568/STJ. CONTRAFAÇÃO E CONCORRÊNCIA DESLEAL. DANO PRESUMIDO. DECISÃO MANTIDA.
1. "O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema" (Súmula n. 568 do STJ).
2. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, "na hipótese de concorrência desleal os danos materiais se presumem, tendo em vista o desvio de clientela e a confusão entre as marcas, podendo ser apurados em liquidação de sentença" (AgInt no REsp 1.645.776/RJ, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 30/9/2019, DJe 4/10/2019).
3. Agravo interno a que se nega provimento." (AgInt nos EDcl no AREsp 620.720/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 07/12/2020, DJe 14/12/2020)
"AGRAVO INTERNO. PROCESSUAL CIVIL E CONCORRÊNCIA DESLEAL. TESE DE QUE SERIA POSSÍVEL A INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL, ANTES MESMO DO EXAURIMENTO DA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. MANIFESTO DESCABIMENTO. TRADE DRESS. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL E INFRACONSTITUCIONAL. APURAÇÃO DA EXTENSÃO DOS DANOS, EM FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DAS TURMAS DE DIREITO PRIVADO.
1. O Tribunal local aponta "cópia servil do day trade dos produtos concorrentes, as rés apenas maquiaram algumas alterações de cores e composição gráfica das embalagens, sem, no entanto, deixar de remeter e de evocar a marca líder de mercado, tomando ilícita carona no prestígio alheio". E também afirma "risco de diluição [...] em decorrência da conduta das rés de fabricar e comercializar cosméticos com [...] conjunto de imagem similares".
2. Por um lado, o art. 5º, XXIX, da Lei Maior, estabelece que a lei assegurará proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas "e a outros signos distintivos". Por outro lado, a teor do art. 10 bis da Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial - Decreto n. 635/1992 -, os países da União obrigam-se a assegurar aos nacionais dos países da União proteção efetiva conta a concorrência desleal, devendo-se, particularmente, proibir-se todos os atos suscetíveis de, por qualquer meio, estabelecer confusão com o estabelecimento, os produtos ou a atividades industrial ou comercial de um concorrente.
3. O art. 209, caput, da LPI, dispõe que fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio. Com efeito, embora não se cuide de tutela específica da marca, mas de cessação de concorrência desleal, o trade dress, prestigiado pela constituição, pela legislação infraconstitucional interna e transnacional, tem função similar à da marca, denominada pela doutrina "para-marcárias".
4. " O prejuízo causado prescinde de comprovação, pois se consubstancia na própria violação do direito, derivando da natureza da conduta perpetrada. A demonstração do dano se confunde com a demonstração da existência do fato, cuja ocorrência é premissa assentada, devendo o montante ser apurado em liquidação de sentença" (REsp 1.677.787/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 02/10/2017).
5. Com efeito, a tese recursal acerca de necessidade de apuração, na fase de conhecimento, da extensão dos danos (quantum indenizatório) não contempla a celeridade, a economia, a efetividade processual, e a melhor tutela da propriedade intelectual e dos direitos do consumidor. Isso porque, nesse tipo de ação, por um lado, a final, a violação pode nem mesmo ser constatada e, por outro lado, se constatada, a apuração da extensão dos danos, nessa fase processual, só retardará desnecessariamente a cessação do dano, mantendo-se o efeito danoso de diluição do conjunto-imagem e de confusão aos consumidores.
6. Agravo interno não provido." (AgInt no REsp nº 1.527.232/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 08/10/2019, DJe 15/10/2019 - grifou-se)
"RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. USO INDEVIDO DE MARCA DE EMPRESA. SEMELHANÇA DE FORMA. DANO MATERIAL. OCORRÊNCIA. PRESUNÇÃO. DANO MORAL. AFERIÇÃO. IN RE IPSA. DECORRENTE DO PRÓPRIO ATO ILÍCITO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. RECURSO PROVIDO.
1. A marca é qualquer sinal distintivo (tais como palavra, letra, numeral, figura), ou combinação de sinais, capaz de identificar bens ou serviços de um fornecedor, distinguindo-os de outros idênticos, semelhantes ou afins de origem diversa. Trata-se de bem imaterial, muitas vezes o ativo mais valioso da empresa, cuja proteção consiste em garantir a seu titular o privilégio de uso ou exploração, sendo regido, entre outros, pelos princípios constitucionais de defesa do consumidor e de repressão à concorrência desleal.
2. Nos dias atuais, a marca não tem apenas a finalidade de assegurar direitos ou interesses meramente individuais do seu titular, mas objetiva, acima de tudo, proteger os adquirentes de produtos ou serviços, conferindolhes subsídios para aferir a origem e a qualidade do produto ou serviço, tendo por escopo, ainda, evitar o desvio ilegal de clientela e a prática do proveito econômico parasitário.
3. A lei e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhecem a existência de dano material no caso de uso indevido da marca, uma vez que a própria violação do direito revela-se capaz de gerar lesão à atividade empresarial do titular, como, por exemplo, no desvio de clientela e na confusão entre as empresas, acarretando inexorável prejuízo que deverá ter o seu quantum debeatur, no presente caso, apurado em liquidação por artigos.
4. Por sua natureza de bem imaterial, é ínsito que haja prejuízo moral à pessoa jurídica quando se constata o uso indevido da marca.
A reputação, a credibilidade e a imagem da empresa acabam atingidas perante todo o mercado (clientes, fornecedores, sócios, acionistas e comunidade em geral), além de haver o comprometimento do prestígio e da qualidade dos produtos ou serviços ofertados, caracterizando evidente menoscabo de seus direitos, bens e interesses extrapatrimoniais. 5. O dano moral por uso indevido da marca é aferível in re ipsa, ou seja, sua configuração decorre da mera comprovação da prática de conduta ilícita, revelando-se despicienda a demonstração de prejuízos concretos ou a comprovação probatória do efetivo abalo moral.
6. Utilizando-se do critério bifásico adotado pelas Turmas integrantes da Segunda Seção do STJ, considerado o interesse jurídico lesado e a gravidade do fato em si, o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a título de indenização por danos morais, mostra-se razoável no presente caso.
7. Recurso especial provido." (REsp XXXXX/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28/11/2017, DJe 15/02/2018 - grifou-se)
Assim, de acordo com orientação sedimentada no STJ, uma vez
demonstrada a violação do direito, assentada concretamente a conduta lesiva (trade
dress), o montante da indenização deve ser apurado em liquidação de sentença, não se
justificando, pois, o fundamento utilizado pelo acórdão recorrido - que antecipa
discussão própria da fase posterior - para afastar o direito à indenização na hipótese
concreta.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo interno para, reconsiderando a
decisão agravada (fls. 385/3871 e-STJ), dar provimento ao recurso especial interposto
pela agravante, a fim de reconhecer o direito à indenização pelos danos materiais decorrentes da conduta ilícita perpetrada pela parte agravada, que deverá ser apurado em liquidação.
Em consequência, condeno à parte recorrida, ora agravada, ao pagamento integral das custas e honorários advocatícios, estes fixados nos termos do §2º do art. 85 do CPC/2015, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Publique-se.
Intimem-se.
Brasília, 15 de dezembro de 2021.
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator