29 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1888286 MG 2020/0198080-6 - Decisão Monocrática
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
RECURSO ESPECIAL Nº 1888286 - MG (2020/0198080-6)
RELATOR : MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
RECORRENTE : ESTADO DE MINAS GERAIS
ADVOGADO : FABRICIA LAGE FAZITO ANTUNES - MG097927
RECORRIDO : POSTO CAXUXA NATAL LTDA
ADVOGADOS : ADÍLIO SILVA - MG037636 RAFAEL PIRES SILVA - MG090570 ADILIO SILVA JUNIOR - MG103763
DECISÃO
Trata-se de recurso especial interposto pelo ESTADO DE MINAS GERAIS, com fundamento no art. 105, III, alínea a, da Constituição Federal, contra o acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS.
A parte ora recorrida ajuizou ação declaratória, pretendendo também a restituição do ICMS, recolhido no regime da substituição tributária para frente, pago a maior nos casos em que o valor da base de cálculo real tenha valor inferior ao da operação presumida.
O valor atribuído à causa (fl. 14): R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), em fevereiro de 2017.
A sentença de fls. 249-269 julgou parcialmente procedentes os pedidos para condenar o Estado de Minas Gerais a restituir à parte autora a diferença do ICMS-ST pago a mais no regime de substituição tributária para frente, quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida, limitando-se aos fatos geradores ocorridos a partir de 19/10/2016.
O Tribunal a quo deu parcial provimento à apelação do contribuinte e negou provimento do recurso do Estado e à remessa necessária, em acórdão assim ementado (fl. 392):
APELAÇÕES. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE “SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PARA FRENTE”. BASE DE CÁLCULO REAL INFERIOR À PRESUMIDA. FATO
GERADOR REALIZADO A MENOR. RESTITUIÇÃO. POSSIBILIDADE. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. PROVA DE AUSÊNCIA DE REPASSE. PRESCINDIBILIDADE. DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE N. 593.849. REPERCUSSÃO GERAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. INAPLICABILIDADE DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/1997 (LEI 11.960/2009).
Em virtude do princípio constitucional do livre acesso à Jurisdição, destacado pelo art. 5º, inciso XXV, da Constituição da República, não há que se obrigar o esgotamento da via administrativa para que se possa recorrer ao Judiciário.
Em se tratando de pagamento de tributo em regime de substituição tributária para frente, impõe-se reconhecer legítima a repetição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida como restou decidido, em 05/04/2017, pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal no recurso extraordinário nº 593.849/MG (Tema 201), relatado pelo Ministro Edson Fachin.
O Supremo Tribunal Federal, com intuito de minimizar o impacto do mencionado julgamento, modulou seus efeitos, restringindo-os às ações judiciais pendentes e aos casos futuros, assim considerados os fatos geradores do ICMS que ocorreram após19.10.2016.
TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ESTADO DE MINAS GERAIS. ENCARGOS MORATÓRIOS. TAXA SELIC. INCIDÊNCIA DESDE O PAGAMENTO INDEVIDO. SÚMULA N. 523, DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
-Nos termos da Súmula n. 534, do Superior Tribunal de Justiça, “a taxa de juros de mora incidente na repetição de indébito de tributos estaduais deve corresponder à utilizada para cobrança do tributo pago em atraso, sendo legítima a incidência da taxa Selic, em ambas as hipóteses, quando prevista na legislação local, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices”.
-Assim, como a taxa Selic engloba correção monetária e juros de mora, e o art. 226, da Lei Estadual nº 6.763/75, a estipula como parâmetro de atualização da dívida tributária em atraso, o mesmo critério será aplicado na repetição do indébito tributário aforada em desfavor do Estado de Minas Gerais.
v. v Para fins de atualização monetária do indébito tributário a ser restituído, deverá incidir correção monetária pelos índices da CGJ/MG desde o recolhimento indevido até o trânsito em julgado (Súmula 188 do STJ), a partir de quando deverá incidir, exclusivamente, a Taxa SELIC, que não pode acumular com a correção monetária.
O Estado opôs os embargos de declaração de fls. 421-435, foram rejeitados
pelo acórdão de fls. 448-454.
Nas razões do recurso especial, o ente público alega, inicialmente, a violação
do art. 1.022, inciso II e parágrafo único, do CPC/2015. Sustenta que, embora tenha sido
provocada por embargos de declaração, a Corte de origem deixou de se manifestar sobre
questões relevantes ao deslinde da controvérsia.
Prosseguindo, alega ofensa aos art. 166 e 170 do Código Tributário Nacional.
No ponto, argumenta que
[...] certamente que esse encargo tributário foi repassado ao consumidor das mercadorias da recorrida. Destarte, deveria ter sido comprovado, na fase instrutória do processo, que foi a autora/recorrida, e não o adquirente de seus produtos, quem suportou -em termos concretos e em quais condições - o custo do ICMS decorrente daquelas operações.
[...]
Por conseguinte, como a recorrida não cuidou de demonstrar que, efetivamente, teria suportado referido encargo, sua pretensão, nos termos do art. 166 do CTN, não tem como ser acolhida já por esse motivo. A não observância de tal norma importa em negar sua vigência (fl. 471).
Aduz ainda o recorrente que [o Estado de Minas]
[...] em sua esfera de competência, legislou acerca do pagamento, compensação e cessão de créditos, através da Lei Estadual nº 14.699/2003, cujos dispositivos necessariamente devem ser observados.
Dessa forma, a referida lei prevê apenas a compensação de créditos de precatórios com débitos tributários nas condições nela elencadas, que não contemplam a situação dos presentes autos (fl. 475).
Alega ainda que o art. 10 da Lei Complementar nº 87/1996 exige que a restituição se dê mediante crédito escritural, mas o acórdão recorrido não determina que se observe a citada norma tributária.
Contrarrazões às fls. 483-495, pelo não conhecimento ou desprovimento do recurso especial.
É o relatório. Decido.
Afasto a alegação de ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015, porque não demonstrada omissão capaz de comprometer a fundamentação do acórdão recorrido ou de constituir-se em empecilho ao conhecimento do recurso especial. Citem-se, a propósito, os seguintes precedentes: EDcl nos EDcl nos EDcl na Pet n. 9.942/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 8/2/2017, DJe de 14/2/2017; EDcl no AgInt no REsp n. 1.611.355/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 14/2/2017, DJe de 24/2/2017; AgInt no AgInt no AREsp n. 955.180/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 14/2/2017, DJe de 20/2/2017; AgRg no REsp n. 1.374.797/MG, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 10/9/2014.
A alegação do recorrente de que o autor não comprovou ter de fato absorvido o encargo tributário, sem repassá-los ao consumidor final, constitui argumento que não pode ser conhecido nesta sede recursal, porque demandaria reexame de matéria probatória (Súmula 7/STJ).
O acórdão recorrido, no tocante ao ponto central da irresignação, tem este fundamento (fls. 402-404):
Ultrapassadas estas questões, saliento que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 593.849/MG, de relatoria do Ministro Edson Fachin, com tema de Repercussão Geral nº 201, fixou a seguinte tese:
"É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços -ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida."
[...]
Descabem maiores delongas acerca do direito em debate cumprindo aderir aos fundamentos jurídicos e à conclusão contidos no referido acórdão do Supremo Tribunal Federal, para confirmar o reconhecimento do cabimento da restituição da diferença do ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente nas hipóteses em que a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida.
Afinal, a Suprema Corte, alterando o seu posicionamento sobre a matéria, fixou a tese segundo a qual é devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em casos como o apreciado nos autos, colocando fim a eventuais controvérsias.
[...]
Especificamente acerca da procedência parcial do pedido, em razão da modulação dos efeitos do julgamento acima transcrito, sem reparos a r. sentença. Modulando os efeitos da decisão, no intuito de minimizar o impacto do seu entendimento, o STF restringiu-o às ações judiciais pendentes e aos casos futuros, ou seja, limitados aos fatos geradores do ICMS que ocorreram após 19.10.2016.
Trata-se de matéria que não pode ser conhecida em recurso especial por ser
da competência do STF.
Quanto à alegação de ofensa aos art. 166 e 170 do CTN,
porquanto faltaria à parte autora legitimidade para pleitear a restituição do
ICMS-ST pago a maior, há que se ter presente o regime tributário em questão.
O tributo ao final suportado pelo consumidor incidira sobre uma base de
cálculo estimada, e fora assim recolhido pelo revendedor. Se essa base de cálculo real, ou
seja, aquela realizada na operação final, for menor que a presumida, parece lógico que
essa sistemática impõe ao revendedor o ônus correspondente à diferença entre o valor que
foi efetivamente pago e aquele que seria se a base de cálculo foi a real.
Dessa perspectiva, não se sustenta a alegação do recorrente, por faltar-lhe
argumentos razoáveis que se sobreponham à logica que emerge do regime de substituição
tributária para a frente. O conhecimento do recurso especial pressupõe a apresentação de
uma tese jurídica plausível, o que não ocorreu no presente caso. Por isso, tem aplicação o
entendimento há muito sedimentado nas Súmulas 283 e 284 do STF, segundo os quais,
respectivamente:
É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.
É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia.
Com relação à alegação de que a restituição deve ser dar por meio de crédito escritural ou que seria necessário prévio requerimento administrativo, vinculadas à tese de ofensa ao art. 10, caput e § 1º da LC 87/96, são questões que ou não foram tratadas pelo acórdão (a primeira) ou o foram sob a ótica constitucional (a segunda), que é da competência do STF.
Ante o exposto, com esteio no art. 255, § 4º, I e II, do RISTJ, conheço parcialmente do recurso especial para, nessa parte, negar-lhe provimento.
Majoro em 1 (um) ponto percentual os honorários advocatícios que couberem ao recorrente pagar, conforme fixados no acórdão recorrido (CPC/2015, art. 85, § 11).
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 11 de fevereiro de 2022.
MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
Relator