25 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
Superior Tribunal de Justiça
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2.036.489 - ES (2021/0402599-3)
RELATOR : MINISTRO PRESIDENTE DO STJ
AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
AGRAVADO : THEODORICO DE ASSIS FERRAÇO
ADVOGADOS : WILSON MÁRCIO DEPES - ES001838 WILLY POTRICH DA SILVA DEZAN - ES020416
DECISÃO
Cuida-se de agravo apresentado por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO contra a decisão que não admitiu seu recurso especial.
O apelo nobre, fundamentado no artigo 105, inciso III, alínea "a", da CF/88, visa reformar acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, assim resumido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO AO ERÁRIO. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO. ÔNUS PROBATÓRIO DO AUTOR DA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO PROVIDO.
Quanto à controvérsia recursal, alega violação dos arts. 89 da Lei n. 8.666/93 e 11, caput e inciso I da Lei n. 8.429/92, no que concerne ao reconhecimento de que está configurado o ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública, ante a presença de dolo eventual/genérico na conduta do requerido, trazendo os seguintes argumentos:
Sustenta o Tribunal que, por ausência de dolo, não poder-se-ia enquadrar a violação ao artigo 89 da Lei n° 8.666/93 como ato de improbidade administrativa, sobretudo porque o dolo é elemento imprescindível para a configuração do art. 11 da LIA.
Pois bem, o recorrido possui longo histórico na política e na administração pública, sendo que no exercício de 2003, o então prefeito municipal estava no penúltimo ano do segundo mandato consecutivo, sem considerar outros mandatos de anos anteriores.
Assim, o recorrido possui conhecimento das regras constantes na Lei n° 8666/93, depois de anos atuando na liderança da administração pública. Ainda, todos os expedientes de importância elevada de âmbito municipal, como é o caso de processos e contratos administrativos relativos à licitação, são levados ao conhecimento do Chefe do Poder Executivo.
Assim, o Prefeito teve acesso a todos os processos licitatórios, quando
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não desde o início ao menos no momento da adjudicação.
Contudo, o recorrido se manteve inerte, mesmo quando os procedimentos de licitação daquele ano lhe eram apresentados para assinatura, o que demonstra que tudo era feito de forma proposital e planejada.
Ademais, o Superior Tribunal de Justiça adota orientação no sentido de que o dolo necessário para a configuração de ato de improbidade com base no art. 11 da LIA é o dolo genérico, consubstanciado na vontade consciente e livre de praticar a conduta descrita no tipo. Senão, vejamos:
[...]
Como se vê, para a incidência do artigo 11 da Lei n° 8.429/92 — cujo foco reside na preservação dos valores abstratos e intangíveis da administração proba, lastreada em princípios informadores do dever de boa gestão e honestidade no trato da coisa pública — basta a presença do dolo eventual, quando o agente tolera o resultado, consiste em sua provocação ou se conforma com o risco da realização do tipo.
É desnecessário perquirir acerca de eventual promoção pessoal do agente público local, pois o elemento subjetivo restou configurado pela manifesta vontade de realizar conduta contrária aos princípios da Administração Pública.
Na hipótese vertente, pode-se concluir de forma diferente do Tribunal de origem quanto à presença do dolo genérico, a partir da análise das circunstâncias objetivas do caso concreto, incontroversas na instância ordinária c da própria leitura do acórdão, mormente diante da existência de votos no sentido da manutenção do édito condenatório. Não se trata, aqui, de reapreciação do conjunto probatório e muito menos incursão na seara fâtica, mas de mera qualificação jurídica (fls. 550-553).
É, no essencial, o relatório. Decido.
Na espécie, o Tribunal de origem se manifestou nos seguintes termos:
A jurisprudência também é tranquila nesse ponto, assentando que a consciência (conhecimento) e a vontade (intenção) são elementos basilares do dolo genérico. A ilegalidade, destarte, só adquire o status de improbidade quando evidenciada atuação deliberada de praticar ato contrário aos princípios da Administração Pública, conforme se extrai dos seguintes precedentes do STJ e desta Corte:
[...]
É, pois, nesse cenário que a ação de improbidade deve ser julgada improcedente, sob pena de a condenação se apoiar na famigerada responsabilidade objetiva, tendo em vista que, muito embora as normas da Lei n° 8666/93 tenham, de fato, sido descumpridas pela Administração cachoeirense no ano de 2003, não há provas da existência de desígnio criminoso ou ímprobo por parte do apelante, ou seja, de que tenha colimado fim ilícito, beneficiar terceiros e/ou se
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enriquecer às custas do erário (fls. 525-527).
Assim, incide o óbice da Súmula n. 7 do STJ (“A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”), uma vez que o reexame da premissa fixada pela Corte de origem quanto à existência ou não do elemento subjetivo (dolo ou culpa) apto a caracterizar a existência de ato de improbidade administrativa exigiria a incursão no acervo fático-probatório dos autos, o que não é possível em sede de recurso especial.
Confiram-se os seguintes julgados: EREsp 1.344.725/RJ, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe de 1º/4/2019; AgInt no REsp 1.856.755/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 26/6/2020; AgInt no REsp 1.457.296/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator p/ Acórdão Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 6/8/2020; AgInt no AREsp 1.588.859/SP, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de de 8/6/2020; e REsp 1.755.958/MG, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 6/9/2019.
Ante o exposto, com base no art. 21-E, V, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, conheço do agravo para não conhecer do recurso especial.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 17 de fevereiro de 2022.
MINISTRO HUMBERTO MARTINS
Presidente
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