7 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1987043 MG 2022/0047754-0
Publicado por Superior Tribunal de Justiça
Detalhes da Jurisprudência
Processo
REsp 1987043 MG 2022/0047754-0
Publicação
DJ 17/05/2022
Relator
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE
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Decisão
RECURSO ESPECIAL Nº 1987043 - MG (2022/0047754-0) EMENTA RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. DUPLICATA COM ACEITE. ABSTRAÇÃO. PRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO SUBJACENTE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. DECISÃO Trata-se de recurso especial interposto por ARIZONA INDÚSTRIA TÊXTIL LTDA., com base nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão proferido Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado (e-STJ, fl. 182): APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE EXECUÇÃO - DUPLICATA COM ACEITE - IRREGULARIDADES FORMAIS - INEXISTÊNCIA - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - REJEIÇÃO. - A exceção de pré-executividade é cabível quando, simultaneamente, a matéria puder ser conhecida de ofício pelo juiz e não houver a necessidade de dilação probatória (STJ, Resp 1.110.925/SP). - Para a execução judicial da duplicata aceita, basta o próprio título (Lei nº 5.474/68, art. 15, 1). - A duplicata mercantil, apesar de causal no momento da emissão, com o aceite e a circulação adquire abstração e autonomia, desvinculando-se do negócio jurídico a ela subjacente (STJ, EREsp 1439749/RS). Opostos embargos de declaração, o acórdão recorrido foi integralizado pela seguinte ementa (e-STJ, fl. 220): EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - OMISSÃO CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE INEXISTÊNCIA - EMBARGOS REJEITADOS. - Os embargos de declaração não servem para rediscussão do mérito da causa, pois restritos às hipóteses do art. 1.022, do CPC. Nas razões do recurso, a recorrente alega divergência jurisprudencial e violação aos arts. 1º, 2º, 20 e 25 da Lei 5.474/1968; e 8º do Decreto 2.044/1908. Sustenta a nulidade da execução fundada em duplicata emitida para a cobrança de encargos oriundos de operação financeira (ICMS). Defende que apenas o endosso acarreta a abstração do título. Assim sendo, requer o provimento do presente recurso especial. Contrarrazões às fls. 397-408 (e-STJ). Decisão de admissibilidade às fls. 411-414 (e-STJ). Brevemente relatado, decido. De início, é importante ressaltar que o recurso foi interposto contra decisão publicada já na vigência do Novo Código de Processo Civil, sendo, desse modo, aplicável ao caso o Enunciado Administrativo n. 3 do Plenário do STJ, segundo o qual: "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos às decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC". A respeito da tese debatida no apelo excepcional, o Tribunal de origem assim se manifestou (e-STJ, fls. 183-185): O magistrado a quo acolheu a exceção de pré-executividade apresentada pela executada/apelada e extinguiu a execução, sob o fundamento de que a duplicata em que se embasa a execução seria nula, porquanto desacompanhado de comprovantes de entregas de mercadoria ou, mesmo de efetiva prestação de serviços. Essa sentença deve ser reformada, pois o caso era de rejeição da exceção de pré-executividade apresentada pela executada/apelada, uma vez que se está diante de execução de duplicata aceita experssamente pelo sacado, algo que torna desnecessária a juntada aos autos pelo exequente de comprovantes de entregas de mercadoria ou, mesmo de efetiva prestação de serviços. Ora, está no art. 15, I, da Lei nº 5.474/1968, que a cobrança judicial de duplicatas aceitas, como no caso, deve ser efetuada por meio do processo de execuçã sem maiores fomalidades: [...] No caso, a duplicata exequenda foi expressamente aceita pelo sacado, porquanto o ele opôs a sua assinatura no título (fl. 68). Assim, a duplicata adquiriu abstração e autonomia, razão pela qual é titulo hábil a instruir a ação de execução, por expressa disposição legal (Lei nº 5.474/1968, art. 15, I). Do excerto acima transcrito, depreende-se que a Corte local entendeu que o aceite inserido na duplicata atribui abstração e autonomia ao título, tornando desnecessária a apresentação dos comprovantes de entrega de mercadorias ou da efetiva prestação de serviços. De fato, o posicionamento adotado pelo Tribunal estadual está em harmonia com a jurisprudência do STJ, conforme se verifica dos seguintes precedentes: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DUPLICATAS. REQUISITOS. ART. 2º, § 1º, DA LEI 5.474/68. ASSINATURA DO EMITENTE. AUSÊNCIA. IRREGULARIDADE SANÁVEL. LITERALIDADE INDIRETA. TÍTULO CAUSAL. NEGÓCIO JURÍDICO SUBJACENTE. VINCULAÇÃO. CIRCULAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DADOS CONSTANTES NO PRÓPRIO TÍTULO. ACEITE COM FIRMA RECONHECIDA. 1- Recurso especial interposto em 7/10/2020 e concluso ao gabinete em 9/7/2021. 2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a duplicata aceita constitui título executivo extrajudicial, mesmo sem a assinatura do respectivo emitente; e b) a juntada oportuna das notas fiscais e dos cheques emitidos posteriormente para o pagamento da dívida, que não foram descontados por insuficiência de fundos, servem para comprovar a existência do negócio jurídico subjacente, sendo, portanto, desnecessária a assinatura, até mesmo porque os títulos não circularam. 3- Em regra, o rigor formal garante a segurança dos envolvidos na circulação de crédito, razão pela qual, se ausente um dos requisitos considerados essenciais, um determinado documento não terá valor de título de crédito. 4- A Lei Uniforme de Genébra, aplicável subsidiariamente às duplicatas, prevê, no entanto, que nem todos os requisitos legais são essenciais, pois, nos termos de seu art. 2º, existem aqueles cujos defeitos podem ser supridos, desde que exista uma solução objetiva e segura para a correção da irregularidade. 5- A duplicata é título de crédito causal no momento da emissão e adquire abstração e autonomia, desvinculando-se do negócio jurídico subjacente, com o aceite e a circulação. 6- A assinatura do emitente na cártula cumpre as funções de representar a declaração de vontade unilateral que dá origem ao título de crédito e a de vincular o sacador, na hipótese de circulação do documento, como um dos devedores do direito nele inscrito. 7- A duplicata, por ser um título causal, permite a incidência da literalidade indireta, que autoriza a identificação de seus elementos no documento da compra e venda mercantil ou da prestação de serviços que lhe serve de ensejo, pois o devedor tem a ciência de que aquela obrigação também tem seus limites definidos em outro documento. 8- Na hipótese específica dos autos, não há dúvidas de que houve vontade expressa do recorrido em sacar as duplicatas, tendo em vista a comprovação da realização dos negócios jurídicos causais que autorizam a criação desse título de crédito. Ademais, como as duplicatas não circularam, existe apenas um devedor principal da ordem de pagamento nelas inscrita, qual seja o próprio recorrido, adquirente das mercadorias vendidas pelo emitente sacador. 9- Diante desses fatores, a irregularidade relacionada à ausência de assinatura das cártulas pelo emitente deve ser considerada perfeitamente sanável, haja vista a possibilidade fixada pela moldura fática delimitada no acórdão recorrido, no sentido de que a informação relativa ao sacador pode ser inferida dos sinais contidos nas duplicatas, somado ao próprio aceite do devedor, com firma reconhecida. 10- Nessas circunstâncias, as duplicatas devem ser consideradas perfeitas e, assim, aptas ao ajuizamento da ação de execução, pois a irregularidade relacionada à ausência de assinatura das cártulas pelo emitente deve ser considerada perfeitamente sanável e sanada. 11. Recurso especial provido. ( REsp 1948200/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/10/2021, DJe 22/10/2021) RECURSO ESPECIAL. DUPLICATA. DIREITO EMPRESARIAL. DESTACA-SE PELA SIMPLICIDADE DE FÓRMULAS E INTERNACIONALIDADE DE SUAS REGRAS E INSTITUTOS. REQUISITOS ESSENCIAIS DA DUPLICATA. ART. 2º, § 1º, DA LEI N. 5.747/1968. DIMENSÕES DA CÁRTULA QUE NÃO CUMPREM PRECISAMENTE AQUELAS ESTABELECIDAS PELO MODELO DA RESOLUÇÃO CMN N. 102/1968. IRREGULARIDADE IRRELEVANTE. DESCRIÇÃO DA MERCADORIA. INEXISTÊNCIA DE ALTERAÇÃO DA FEIÇÃO CARACTERÍSTICA DO TÍTULO DE CRÉDITO. DUPLICATA COM ACEITE. OPOSIÇÃO DE EXCEÇÕES PESSOAIS EM FACE DO ENDOSSATÁRIO. INVIABILIDADE. 1. O direito comercial caracteriza-se pela simplicidade de suas fórmulas, pela internacionalidade de suas regras e institutos, pela rapidez de sua aplicação, pela elasticidade dos seus princípios e também pela onerosidade de suas operações. As obrigações resultantes dos atos de natureza cambiária não podem, em geral, acomodar-se às formas hieráticas e solenes dos contratos civis, e os usos e costumes comerciais influenciam a obrigação que resulta do ato mercantil. 2. Os requisitos essenciais da duplicata - reconhecidos pela Corte local como devidamente supridos - estão claramente previstos no art. 2º, § 1º, da Lei das Duplicatas, que estabelece que a cártula conterá: I - a denominação "duplicata", a data de sua emissão e o número de ordem; II - o número da fatura; III - a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista; IV - o nome e domicílio do vendedor e do comprador; V - a importância a pagar, em algarismos e por extenso; VI - a praça de pagamento; VII - a cláusula à ordem; VIII - a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada pelo comprador, como aceite, cambial; IX - a assinatura do emitente. Com efeito, o entendimento sufragado pelo acórdão recorrido, assentando não ter validade e eficácia de duplicata, por não observar, com precisão, "os limites do documento, com altura mínima de 148 mm e máxima de 152 mm e largura mínima de 203 mm e máxima de 210 mm", conforme modelo estabelecido na Resolução CMN n. 102/1968, testilha com o mencionado dispositivo legal e com os usos e costumes comerciais, sendo incomum que o sacado e os endossatários se valham de régua, por ocasião, respectivamente, do aceite e da operação de endosso, para aferição do preenchimento preciso das dimensões de largura e altura da cártula. 3. É inviável o entendimento de que, como a cártula apresenta também a descrição da mercadoria objeto da compra e venda, uma fatura da mercadoria objeto da negociação, isso desnatura e descaracteriza por completo o título como duplicata. A descrição da mercadoria, a par de caracterizar uma duplicata da fatura na própria acepção do termo, embora represente redobrada cautela, não pode inviabilizar a cártula, pois o art. 2º, § 2º, da Lei n. 5.474./1968 dispõe que uma duplicata tem de corresponder a uma única fatura, e o art. 24 expressamente faculta que conste na cártula outras indicações, contanto que não alterem sua feição característica. 4. Havendo aceite, este se vincula à duplicata, afastada a possibilidade de investigação do negócio causal. Conquanto o título seja causal apenas na sua origem/emissão, sua circulação - após o aceite do sacado ou, na sua falta, pela comprovação do negócio mercantil subjacente e do protesto - rege-se pelo princípio da abstração, desprendendo-se de sua causa original, sendo por isso inoponíveis exceções pessoais a terceiros de boa-fé, como ausência de entrega da mercadoria ou de prestação de serviços, ou mesmo quitação ao credor originário. Precedentes. 5. Recurso especial provido. ( REsp 1518203/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 27/04/2021, DJe 02/08/2021) Desse modo, tendo o Tribunal a quo reconhecido a assinatura da recorrente na duplicata, aplica-se o entendimento inserido nos julgados supramencionados. Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial. Fiquem as partes cientificadas de que a insistência injustificada no prosseguimento do feito, caracterizada pela apresentação de recursos manifestamente inadmissíveis ou protelatórios contra esta decisão, ensejará a imposição, conforme o caso, das multas previstas nos arts. 1.021, § 4º, e 1.026, § 2º, do CPC/2015. Publique-se. Brasília, 07 de maio de 2022. MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator