27 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - PETICAO DE RECURSO ESPECIAL: REsp 1243434 - Decisão Monocrática
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.243.434 - RS (2011/0053514-1)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE : FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE
ADVOGADO : LUIZ FELIPE OTHARAN E OUTRO(S)
RECORRIDO : WASHINGTON PERES NUNEZ
ADVOGADO : MAURO BORGES LOCH E OUTRO(S)
INTERES. : FAZENDA NACIONAL
ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
DECISÃO
Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição da República, contra acórdão assim ementado:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. MAGISTÉRIO SUPERIOR. AFASTAMENTO PARA APERFEIÇOAMENTO PESSOAL. COMPROMISSO DE PERMANÊNCIA NO ÓRGÃO DE ORIGEM. DESCUMPRIMENTO. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. INEXIGIBILIDADE EM FACE DAS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. INSCRIÇÃO EM CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. ABALO MORAL. INDENIZAÇÃO. CABIMENTO.
1. O artigo 95 da Lei nº 8.112, de 1990, prescreve que, ao servidor beneficiado com licença para ausentar-se do país para estudo ou missão oficial, não será concedida exoneração ou licença para tratar de interesse particular antes de decorrido período igual ao do afastamento, ressalvada a hipótese de ressarcimento da despesa havida com seu afastamento. Norma específica dispondo sobre afastamento no próprio país veio a ser introduzida na Lei nº 8.112, de 1990, somente em 2000, pela Medida Provisória nº 441, com redação posteriormente substituída pela Lei nº 11.907, de 2009. Não obstante, já ao tempo da licença concedida ao autor, vigorava o Decreto nº 94.664, de 1987 - que inclusive respaldou o compromisso por ele assumido formalmente perante a FURG -, cujo Anexo, artigo 47, §§ 3º e 4º, estabelecia regra similar.
2. As peculiaridades do caso concreto, contudo, afastam a obrigação do servidor de indenizar o órgão de origem. O autor exonerou-se do cargo docente que ocupava junto à FURG para assumir outro, de idêntica natureza e atribuições, na UFRGS, após aprovação em concurso público de provas e títulos, sendo ambas as instituições públicas e não havendo solução de continuidade no desempenho da função. Essas circunstâncias são relevantes, porque, a considerar-se o propósito do legislador de assegurar que o investimento público no profissional reverta em favor do ensino público federal, não houve violação a dever legal passível de indenização.
3. O instituto da responsabilidade civil fundamenta-se na manutenção do equilíbrio social, tendo por finalidade o restabelecimento do status quo anterior ao dano. Com efeito, indenizar significa repor o patrimônio
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no estado em que se encontrava antes do evento lesivo; compensar ou ressarcir alguém da perda de algo que, voluntariamente, não teria perdido. Tal reposição ou compensação deve observar o princípio da restitutio in integrum , ou seja, deve ser proporcional ao dano. Especificamente em relação ao dano moral, o dever de reparação funda-se na norma prevista no art. 5°, incisos V e X, da Constituição Federal, que declara invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano decorrente de sua violação. A despeito de a dor, o sofrimento, a imagem, a honra e os demais direitos integrantes da personalidade do indivíduo serem inestimáveis do ponto de vista econômico, o dano moral pode sim ser indenizado, na medida em que o ordenamento jurídico não se conforma com sua ocorrência, surgindo daí o fundamento da sua reparabilidade.
4. Considerando que a negativação do nome do autor era ilegítima, porque inexigível o débito que a motivou, é devida indenização pelos agravos extrapatrimoniais por ele sofridos. Conquanto o dano moral não decorra do mero fato de alguém sentir-se incomodado com o procedimento de outrem, houve, no caso concreto, um comportamento reprovável imputável à ré, com repercussões, inclusive, materiais. Como já salientado na sentença, a inscrição do seu nome no Cadin causou-lhe abalo de crédito, projetos de pesquisa rejeitados e empréstimos bancários negados.
Os Embargos de Declaração foram parcialmente acolhidos para fins de prequestionamento.
A recorrente alega dissídio jurisprudencial e violação do art. 535 do CPC; do art. 95 da Lei 8.112/1990; do art. 47, § 3º, do Decreto 94.664/1987 e do art. 1º de seu respectivo anexo. Argumenta que o recorrido deve lhe ressarcir economicamente, de forma proporcional, o período de afastamento remunerado para fins de capacitação profissional, e que o fato de continuar prestando o mesmo serviço em outro estabelecimento de ensino público de nível superior é irrelevante, dada a autonomia patrimonial (art. 207 da CF/1988). Em outras palavras, não haveria ilicitude na dívida que dele está sendo cobrada.
Foram apresentadas as contra-razões.
O Recurso Especial foi ratificado (fl. 354, e-STJ).
É o relatório .
Decido .
Os autos foram recebidos neste Gabinete em 24.3.2011.
Objeto do litígio é a cobrança, pela recorrente, da indenização prevista no art. 47, § 3º, do Decreto 94.664/1987, assim redigido:
Art. 47. Além dos casos previstos na legislação vigente, o ocupante de cargo ou emprego das carreiras de Magistério e Técnico-administrativo poderá afastar-se de suas funções, assegurados todos os direitos e vantagens a que fizer jus em razão da atividade docente:
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(...)
3º A concessão do afastamento a que se refere o item I importará no compromisso de, ao seu retorno, o servidor permanecer, obrigatoriamente, na IFE, por tempo igual ao do afastamento, incluídas as prorrogações, sob pena de indenização de todas as despesas.
A Fundação Universidade Federal do Rio Grande alega que o fato de o recorrido continuar prestando serviço público em outra Universidade Federal, mediante ingresso por concurso, não afasta o dever legalmente previsto, dada a autonomia patrimonial entre as universidades (art. 207 da CF/1988).
Em outras palavras, a prestação de serviço em outro estabelecimento de ensino acarretaria, sem a devida reparação, prejuízo patrimonial injustificado.
Sucede que o Tribunal de origem se valeu de Parecer da Advocacia-Geral da União (Parecer GQ - 142, fl. 114, e-STJ), aprovado pela Presidência da República, para rejeitar a argumentação da ora recorrente (fl. 285, e-STJ):
(...) não se afigura razoável adotar, no âmbito da mesma Administração Pública, uma orientação acerca da matéria à generalidade dos servidores públicos (Parecer nº GQ-142 da AGU - que os dispensa do ressarcimento das despesas com a realização de curso de pós-graduação quando, após exoneração do órgão público, ingressam imediatamente em outro órgão público federal) e outra diametralmente oposta somente aos professores universitários , pois o argumento de que, à época, não havia na Lei nº 8.112 norma que regulasse a hipótese de afastamento no país, era igualmente aplicável aos docentes, desde que a única previsão normativa então existente e apenas a eles aplicável encontrava-se em ato infralegal, que, na concepção no Parecer defendida ("na falta de lei que o autorize, um órgão ou entidade pública não poderá celebrar compromisso de responsabilidade intuitu personae com seus servidores", atrelada que está ao princípio da legalidade (cf. art. 37 da CF) - fl. 33), não poderia lhes impor restrição a direito, s obretudo se violadora da isonomia . (grifei)
Em síntese, conforme defendido pelo recorrido, e encampado pelo órgão julgador das instâncias de origem, o Parecer da AGU representa norma que vincula toda a Administração Pública Federal (art. 40 da Lei Complementar 70/1993), e proíbe a cobrança da indenização prevista na legislação federal.
A ausência de ataque ao referido fundamento atrai a incidência da Súmula 283/STF.
Em relação ao dissídio jurisprudencial, destaco que a divergência deve ser comprovada, cabendo a quem recorre demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, com indicação da similitude fática e jurídica entre eles. É indispensável a transcrição de trechos do relatório e do voto dos acórdãos
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recorrido e paradigma, realizando-se o cotejo analítico entre ambos, com o intuito de caracterizar a interpretação legal divergente.
O desrespeito a esses requisitos legais e regimentais (art. 541, parágrafo único, do CPC e art. 255 do RI/STJ) impede o conhecimento do Recurso Especial com base na alínea "c" do inciso III do art. 105 da Constituição Federal. Confira-se o precedente:
(...)
3. Não se conhece do dissídio jurisprudencial quando não atendidos os requisitos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ.
(...)
(REsp 649084/RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 19.05.2005, DJ 15.08.2005 p. 260)
Diante do exposto, nos termos do art. 557, caput, do CPC, nego seguimento ao Recurso Especial.
Publique-se.
Intimem-se.
Brasília (DF), 28 de março de 2011.
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator