12 de Agosto de 2022
- 2º Grau
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Relatório e Voto
RECORRENTE | : | B D |
ADVOGADOS | : | EDERSON DE MELLO SERRA E OUTRO (S) |
LUIZ HENRIQUE CASTRO DA FONSECA ZAIDAN E OUTRO (S) | ||
JULIANA PADRAO DE FIGUEIREDO E OUTRO (S) | ||
RECORRIDO | : | H S |
ADVOGADO | : | PAULO ZIDE E OUTRO (S) |
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMAO (Relator):
1. Cuida-se, na origem, de agravo de instrumento interposto contra decisão do juízo de primeiro grau que, nos autos de execução de alimentos, determinou expedição de ofício ao empregador do alimentante, com o propósito de que a pensão fixada em 10 (dez) salários mínimos fosse descontada diretamente na folha de pagamento e incidisse sobre 13º salário, PIS/PASEP, FGTS, férias e demais verbas rescisórias. A tese do agravante fundou-se, essencialmente, em ofensa à coisa julgada, porquanto a sentença anterior determinou os alimentos em valor fixo (dez salários mínimos) - a ser depositado todo dia 10 de cada mês -, em conta bancária indicada pela alimentanda.
A Décima Câmara Cível do TJRJ negou provimento ao agravo nos termos da seguinte ementa:
Opostos embargos de declaração (fls. 104-107), foram rejeitados (fls. 110-111).
Sobreveio recurso especial apoiado apoiado na alínea a do permissivo constitucional, no qual se alega ofensa aos arts. 467 e 535 do Código de Processo Civil, art. 15 da Lei n. 5.478/68, art. 6º, 3º, da LINDB, e art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.
Sustenta o recorrente ofensa à coisa julgada, uma vez que o valor dos alimentos não foi arbitrado em percentual sobre o salário, mas em quantum fixo, não podendo haver desconto direto na folha de salário do alimentante, tampouco incidir sobre outras verbas que não as estritamente salariais.
Contra-arrazoado (fls. 139-147), o especial foi admitido (fls.181-182).
O Ministério Público Federal, mediante parecer oferecido pelo Subprocurador-Geral da República Maurício de Paula Cardoso, opina pelo não provimento do recurso (fls. 208-218).
É o relatório.
RELATOR | : | MINISTRO LUIS FELIPE SALOMAO |
RECORRENTE | : | B D |
ADVOGADOS | : | EDERSON DE MELLO SERRA E OUTRO (S) |
LUIZ HENRIQUE CASTRO DA FONSECA ZAIDAN E OUTRO (S) | ||
JULIANA PADRAO DE FIGUEIREDO E OUTRO (S) | ||
RECORRIDO | : | H S |
ADVOGADO | : | PAULO ZIDE E OUTRO (S) |
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. ALIMENTOS ARBITRADOS EM VALOR FIXO (DEZ SALÁRIOS MÍNIMOS) COM PAGAMENTO EM PERIODICIDADE MENSAL. COISA JULGADA. EXECUÇAO. INCIDÊNCIA EM OUTRAS VERBAS TRABALHISTAS (13º, FGTS, FÉRIAS, PIS/PASEP). IMPOSSIBILIDADE.
1. Os alimentos arbitrados em valor fixo devem ser analisados de forma diversa daqueles arbitrados em percentuais sobre "vencimento", "salário", "rendimento", "provento", dentre outros ad valorem . No primeiro caso, a dívida se consolida com a fixação do valor e periodicidade em que deve ser paga, não se levando em consideração nenhuma outra base de cálculo.
2. O débito alimentar arbitrado em valor fixo - por sentença transitada em julgado - deve ser pago pelo montante e na exata periodicidade constante no título judicial, revelando-se ofensa à coisa julgada a determinação para que o valor arbitrado seja pago a propósito do recebimento de outras verbas pelo devedor.
3. No caso concreto, as circunstâncias fáticas incontroversas nas quais a sentença foi proferida dão guarida ao pleito recursal, pois não há nenhum vestígio no título de que a verba deveria incidir na forma como entendeu o Tribunal a quo . De fato, mostrou-se relevante ao arbitramento em valor fixo o fato de o réu auferir rendimentos por fontes que não empregatícias, fato que reforça a conclusão de que a pensão, na hipótese, não deve incidir sobre verbas outras, como aquelas indicadas pelo acórdão recorrido.
4. Recurso especial provido.
VOTO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMAO (Relator):
2. Não houve ofensa ao artigo 535, do Código de Processo Civil.
Isso porque, embora rejeitados os embargos de declaração, os pontos essenciais ao deslinde da controvérsia foram efetivamente analisados pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da recorrente.
3. No mérito, a controvérsia é limitada em saber o alcance de sentença que fixou alimentos, nos seguintes termos:
Em sede de execução, o juízo singular determinou, em ofício dirigido ao empregador, fosse a pensão alimentícia descontada diretamente da folha de pagamento do alimentante, incidindo também sobre 13º salário, PIS/PASEP, FGTS e demais verbas rescisórias.
O acórdão do TJRJ manteve a determinação, entendendo o voto condutor que:
4. Em verdade, duas observações iniciais devem ser feitas.
De fato, não é demais relembrar que não se está, agora, a arbitrar alimentos, mas apenas aferindo se o título judicial que embasou a execução contempla o pensionamento conforme o entendimento do recorrente, ou, ao contrário, conforme o do Tribunal a quo.
A segunda - e esse parece ser o ponto essencial ao desate da controvérsia -, os alimentos foram arbitrados, no processo de conhecimento, em valor fixo de 10 (dez) salários mínimos, a serem pagos todo dia dez, particularidade que difere o caso concreto de outros em que os alimentos foram fixados em percentual sobre uma base de cálculo, hipótese na qual se mostraria essencial saber se determinada rubrica compõe ou não a base de incidência do percentual fixado.
A Terceira Turma, apreciando questão assemelhada em que se discutiu a incidência da verba alimentar sobre o 13º salário quando os alimentos foram arbitrados em valor fixo, obteve a seguinte conclusão:
No voto condutor, Sua Excelência a relatora Ministra Nancy Andrighi, afirma que:
4.1. Não obstante as judiciosas ponderações da eminente Relatora, julgadora de escol, alinho-me a entendimento diverso, na medida em que, em matéria de alimentos, a igualdade buscada pelo magistrado na fixação da pensão deve estar ancorada no princípio norteador do tema, segundo o qual o valor pago ajustar-se-á às necessidades do alimentado e as possibilidades do alimentando, circunstância que conduzirá a soluções diversas se o mencionado parâmetro de arbitramento também for diverso.
Com efeito, observada sempre a devida venia, não há mesmo se falar em isonomia entre alimentados que ostentam condições pessoais distintas, salvo se considerada tal isonomia em sua vertente substantiva, segundo a qual não há de se dispensar tratamento formalmente igualitário a todos - como se todos se equivalessem -, mas diferenciado aos desiguais, na medida de suas desigualdades.
Entendo, por isso, que os alimentos arbitrados em valor fixo devem ser analisados de forma diversa daqueles estabelecidos em percentuais sobre "vencimento", "salário", "rendimento", "provento", dentre outros ad valorem , mostrando-se essencial, no último caso, o conhecimento sobre a exata extensão de sua base de cálculo.
No primeiro caso, contudo, a dívida se consolida com a fixação do valor e periodicidade em que deve ser paga, não se levando em consideração nenhuma outra base de cálculo.
Em verdade, na hipótese de alimentos arbitrados em valor fixo, salvo disposição em contrário na decisão que os fixa, os rendimentos do devedor são levados em consideração para aferir suas possibilidades ou, quando muito, é mero veículo de desconto do valor devido.
Assim, eventuais flutuações dos rendimentos do alimentante, para cima ou para baixo, ou mesmo sua supressão - ao menos até que os valores sejam revistos em ação própria -, não são aptas a alterar o quantum devido, razão pela qual o recebimento de parcelas trabalhistas a título de 13º, férias, e outras verbas da mesma natureza, não tem o condão de influenciar na dívida consolidada, sob pena de se alterar o binômio inicial considerado para a fixação do montante fixo.
De fato, basta mencionar por exemplo que, em situações nas quais a remuneração do alimentante é eventual, ou em periodiciadade diversa da mensal, os alimentos fixados em valor determinado - que devem ser pagos mensalmente - não acompanham os recebimentos do devedor. A dívida existe, é certa e deve ser paga na data fixada independentemente dessa circunstância.
Nesse caso, fazer com que o devedor pague o valor arbitrado sempre que receber alguma remuneração - como pagaria até mesmo se não o recebesse -, consubstancia, a meu juízo, evidente vulneração do título judicial.
4.2. A Segunda Seção, muito embora não tenha conhecido do recurso de embargos, abraçou a tese de que são situações distintas aquela do arbitramento de alimentos ad valorem (em percentual sobre uma base de cálculo), daqueloutra em que a verba é estabelecida em valor fixo.
C onfira-se o precedente:
5. Há de se presumir, enfim, que o magistrado sentenciante arbitrou os alimentos em valor fixo à luz das circunstâncias do caso concreto, da situação provada no processo de conhecimento, afigurando-se-lhe que esse método melhor satisfaria o binômio necessidade-possibilidade.
Conforme assentado no REsp 1.267.621/DF, minha relatoria, QUARTA TURMA, julgado em 11/12/2012,"em liquidações de sentença cujo comando não se revela infenso a duplo sentido ou ambiguidade, deve o magistrado adotar como interpretação, entre as possíveis, a que melhor se harmoniza com o ordenamento jurídico, seja no aspecto processual, seja no substancial [...]. Com efeito, havendo mais de uma interpretação a ser extraída do título executivo, a única que deve ser aceita é aquela que parte da premissa de que a sentença não quis promover a iniquidade".
Assim, o débito alimentar arbitrado em valor fixo - por sentença transitada em julgado - deve ser pago pelo montante e na exata periodicidade constante no título judicial, revelando-se ofensa à coisa julgada a determinação para que o valor arbitrado seja pago a propósito do recebimento de outras verbas pelo devedor, tais como sobre 13º salário, férias, FGTS, PIS/PASEP, ou outras rubricas trabalhistas.
No caso concreto, a sentença julgou procedente o pedido e condenou o ora recorrente a" dez (10) salários-mínimos nacionais, ficando este desobrigado de qualquer outra despesa, devendo o pagamento da obrigação ora fixada realizar-se todo dia dez de cada mês ".
Embora a expressão" desobrigado de qualquer outra despesa "não tenha o alcance pretendido pelo recorrente - porquanto diz respeito a outras despesas da alimentada, e não outros recebimentos do alimentante -, a verdade é que as circunstâncias fáticas incontroversas nas quais a sentença foi proferida dão guarida ao pleito recursal, pois não há nenhum vestígio no título de que a verba deveria incidir na forma como entendeu o Tribunal a quo .
Ficou reconhecido na sentença do processo de conhecimento que o casal ostentava elevado padrão de vida em razão dos rendimentos alferidos pelo réu quando era funcionário de empresa que atuava no plano internacional junto à PETROBRAS. Após a saída da aludida empresa, os rendimentos do recorrente passaram a não ser resultantes exclusivamente de salários pagos por empregador. A própria autora aduziu que o réu" explora o ramo de pedras preciosas, atuando na exportação para os Estados Unidos da América ", tendo a sentença reconhecido que a mencionada atividade cessara em 1997, tendo o recorrente passado a se dedicar a atividades de menor porte.
Em 2002, quando a sentença foi proferida, reconheceu-se que o alimentante trabalhava em loja pertencente à irmã e sua remuneração era composta de um valor fixo e outro variável, decorrente de comissões, somando-se a isso a aposentadoria paga pelo INSS no montante de R$ 1.051,99.
Porém, tomando por base o salário mínimo nacional vigente à época (R$ 200,00), o montante devido a título de alimentos, mensalmente, chegou a R$ 2.000,00 (dois mil reais).
Com efeito, mostrou-se relevante ao arbitramento em valor fixo o fato de o réu auferir rendimentos por fontes que não empregatícias, circunstância que reforça a conclusão de que os alimentos não devem incidir sobre verbas outras, como aquelas indicadas pelo acórdão recorrido.
Como bem expõe Arnaldo Rizzardo, os alimentos não devem ser indexados sempre e sempre a ganhos do alimentante, como se consubstanciassem um dever de repartição de riquezas.
Nesse sentido, se manifestou o mencionado civilista:
6. Apenas a título de reforço de argumentação, algumas rubricas indicadas pelo acórdão recorrido não seriam passíveis de compor a base de cálculo dos alimentos - nem mesmo na hipótese de fixação em percentual sobre os rendimentos -, por serem consideradas, segundo a jurisprudência da Casa, verbas indenizatórias.
Quanto ao FGTS, os precedentes são unânimes:
Da mesma forma em relação às verbas rescisórias:
7. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para que a pensão alimentícia seja paga no valor (dez salários mínimos) e periodicidade (mensal) fixados na sentença transitada em julgado, não devendo incidir sobre outras verbas trabalhistas percebidas pelo alimentante (como FGTS, 13º salário, férias, PIS/PASEP), observando-se, contudo, a irrepetibilidade do que já foi pago.
É como voto.
Documento: XXXXX | RELATÓRIO, EMENTA E VOTO |