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- 2º Grau
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Relatório e Voto
IMPETRANTE | : | MARCELO COSME POTYGUAÇU VIANA |
ADVOGADO | : | MARCELO COSME POTYGUACU VIANA |
IMPETRADO | : | TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE |
PACIENTE | : | ENILDETE PEREIRA DA SILVA |
O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em favor de ENILDETE PEREIRA DA SILVA, apontando como autoridade coatora a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, que denegou a ordem pleiteada no HC n. 0824⁄2012.
Noticiam os autos que a paciente foi acusada de praticar o delito previsto no artigo 155, § 3º, do Código Penal.
Sustenta o impetrante a ocorrência de constrangimento ilegal sob o argumento de que não haveria justa causa para a persecução penal, uma vez que a paciente teria efetuado o pagamento do débito relativo à energia elétrica desviada antes da instauração da ação penal.
Requer a concessão da ordem para que seja trancada a ação penal em tela.
A liminar foi indeferida (e-STJ fl. 76), decisão que foi mantida ao se apreciar pedido de reconsideração formulado pela defesa (e-STJ fl. 91).
Prestadas as informações (e-STJ fls. 107⁄110 e 123), o Ministério Público Federal, em parecer de fls. 185⁄199, manifestou-se pelo não conhecimento do habeas corpus.
É o relatório.
O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Conforme relatado, com este habeas corpus pretende-se, em síntese, o trancamento da ação penal instaurada contra a paciente.
Cumpre analisar, preliminarmente, a adequação da via eleita para a manifestação da irresignação contra o acórdão proferido pelo Tribunal a quo.
Nos termos do artigo 105, inciso I, alínea "c", da Constituição Federal, este Superior Tribunal de Justiça é competente para processar e julgar, de forma originária, os habeas corpus impetrados contra ato de tribunal sujeito à sua jurisdição e de Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica; ou quando for coator ou paciente as autoridades elencadas na alínea "a" do mesmo dispositivo constitucional, hipóteses não ocorrentes na espécie.
Por outro lado, prevê a alínea "a" do inciso II do artigo 105 que o Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar, mediante recurso ordinário, os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais o pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória.
De se destacar que a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC n. 109.956⁄PR, buscando dar efetividade às normas previstas no artigo 102, inciso II, alínea "a", da Constituição Federal, e dos artigos 30 a 32 da Lei 8.038⁄1990, passou a não mais admitir o manejo do habeas corpus originário perante aquela Corte em substituição ao recurso ordinário cabível, entendimento que passou ser adotado por este Superior Tribunal de Justiça, a fim de que fosse restabelecida a organicidade da prestação jurisdicional que envolve a tutela do direito de locomoção.
Assim, insurgindo-se a impetração contra acórdão do Tribunal de origem que denegou a ordem pleiteada no prévio writ, mostra-se incabível o manejo do habeas corpus originário, já que não configurada nenhuma das hipóteses elencadas no artigo 105, inciso I, alínea "c", da Constituição Federal, razão pela qual não merece conhecimento.
Todavia, tratando-se de remédio constitucional impetrado antes da alteração do entendimento jurisprudencial, o alegado constrangimento ilegal será enfrentado para que se analise a possibilidade de eventual concessão de habeas corpus de ofício.
Segundo consta dos autos, a paciente foi acusada de praticar o delito previsto no artigo 155, § 3º, do Código Penal, extraindo-se da denúncia as seguintes passagens:
A inicial foi recebida (e-STJ fls. 55⁄56), tendo-se afastado a possibilidade de absolvição sumária da ré (e-STJ fl. 57).
Foi proposta à acusada a suspensão condicional do processo, o que foi aceito (e-STJ fls. 179⁄181).
Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus na origem, tendo a ordem sido denegada em aresto que restou assim ementado:
DECISÃO UNÂNIME." (e-STJ fl. 66).
Inicialmente, é imperioso consignar que não se desconhece que, de acordo com o ordenamento jurídico vigente, a devolução ou a restituição do bem furtado antes do recebimento da denúncia não é causa extintiva da punibilidade, podendo ensejar apenas a redução da reprimenda a ser imposta ao acusado, nos termos do artigo 16 do Código Penal, verbis:
Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente desta Corte Superior de Justiça:
Entretanto, uma detida análise sobre o tema, que versa sobre delito patrimonial praticado em detrimento de concessionária de serviço público, exige que a prestação jurisdicional seja assemelhada àquela conferida aos delitos praticados contra a ordem tributária.
Com efeito, embora o valor estipulado como contraprestação de serviços públicos essenciais - como a energia elétrica e a água, por exemplo - não seja tributo, possui ele a natureza jurídica de preço público, já que cobrado por concessionárias de serviços públicos, as quais se assemelham aos próprios entes públicos concedentes.
Ora, se o pagamento do tributo antes do oferecimento da denúncia enseja a extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributária, o mesmo entendimento deve ser adotado quando há o pagamento do preço público referente à energia elétrica subtraída, sob pena de violação ao princípio da isonomia.
Assim, plenamente possível a aplicação, ao crime de furto de energia elétrica, das disposições contidas na Lei 9.249⁄1995 e na Lei 10.684⁄2003, que prevêem a extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributária quando há o pagamento do débito fiscal.
No caso dos autos, antes do oferecimento da denúncia a paciente celebrou acordo com a concessionária de energia elétrica do Estado, parcelando o débito decorrente do furto de energia elétrica que lhe foi imputado (e-STJ fl. 180), com o seu posterior adimplemento, circunstância que, como visto, enseja a extinção de sua punibilidade, a exemplo do que ocorre nos crimes contra a ordem tributária.
Nesse sentido, aliás, merecem prestígio algumas decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:
Assim, imperioso o trancamento do processo criminal em apreço, ante a manifesta falta de justa causa para a persecução penal.
Ante o exposto, por se afigurar manifestamente incabível, não se conhece do writ, concedendo-se, contudo, habeas corpus de ofício, para determinar o trancamento da Ação Penal n. 201221290048.
É o voto.
Documento: 30814708 | RELATÓRIO E VOTO |