3 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Publicado por Superior Tribunal de Justiça
Detalhes da Jurisprudência
Processo
AgRg no AREsp 30160 RS 2011/0172896-8
Órgão Julgador
T2 - SEGUNDA TURMA
Publicação
DJe 20/11/2013
Julgamento
12 de Novembro de 2013
Relator
Ministra ELIANA CALMON
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Relatório e Voto
AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 30.160 - RS (2011⁄0172896-8)
RELATORA | : | MINISTRA ELIANA CALMON |
AGRAVANTE | : | SP ALIMENTAÇÃO E SERVIÇOS LTDA |
ADVOGADOS | : | FÁBIO LUIS VALDEZ POLETTO E OUTRO(S) |
GIUSEPPE FARIAS MARTINI E OUTRO(S) | ||
AGRAVADO | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão assim ementada (fl. 1505):
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR – PNAE. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ARGUMENTAÇÃO GENÉRICA E DEFICIENTE. SÚMULA 284⁄STF. SÚMULA 83⁄STJ.
A agravante insiste na competência da Justiça Estadual para apreciação da matéria, sob o argumento de que as verbas repassadas pelo Ente Federal se incorporaram ao patrimônio municipal, hipótese de incidência da Súmula 209⁄STJ.
Repisa os argumentos de ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal, rechaçando a necessidade de revolvimento das provas carreadas aos autos.
Pleiteia a reconsideração do decisum, ou a submissão do feito ao órgão colegiado.
É o relatório.
AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 30.160 - RS (2011⁄0172896-8)
RELATORA | : | MINISTRA ELIANA CALMON |
AGRAVANTE | : | SP ALIMENTAÇÃO E SERVIÇOS LTDA |
ADVOGADOS | : | FÁBIO LUIS VALDEZ POLETTO E OUTRO(S) |
GIUSEPPE FARIAS MARTINI E OUTRO(S) | ||
AGRAVADO | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (Relatora): Não merece acolhida a pretensão da agravante, razão pela qual mantenho na íntegra a decisão agravada, que ora reafirmo.
A agravante apenas sustenta a ilegitimidade ativa do MPF e a incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a demanda que versa sobre verba do PNAE, porque a verba se incorpora ao patrimônio municipal, mas das razões recursais não decorrem substratos suficientes a demonstrar qual dispositivo legal restou violado, apenas expõe argumentos gerais sobre a legislação, o que atrai a incidência, por analogia, a Súmula 284⁄STF.
O TRF da 4ª Região consignou ser legítima a participação da União e do Ministério Público no polo ativo da relação processual, bem como reconheceu a competência da Justiça Federal, verbis (fls. 776-778):
O Programa Nacional de Alimentação Escolar é uma política pública concebida e titularizada pela União, que compromete recursos federais objeto de repasse aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (adt. 10). Ele tem execução descentralizada, mediante o depósito em conta-corrente de recursos federais, montante a ser incluido nos orçamentos dos beneficiados (no caso, ente municipal) (art. 29). O beneficiado deve prestar contas do total dos recursos recebidos (art. 40), inclusive perante o Tribunal de Contas da União, o FNDE e o Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Federal (art. 40, § 50).
A vinculação e os deveres do ente beneficiado perante a União, portanto, não se resumem à habilitação para o recebimento de verbas federais, que reforçarão o orçamento municipal. Este liame permanece, inclusive após o depósito em conta-corrente, O PNAE, aliás, é expressamente caracterizado como política pública da União com execução descentralizada (artigo 20), o que afasta a subsunção deste caso à hipótese da Súmula 209 do STJ. Com efeito, se tratando de execução descentralizada de política nacional, não se verifica a premissa de que os recursos se desvinculariam da esfera jurídica da União e passariam a ser exclusivamente patrimônio municipal.
Deste modo, apresenta-se causa que envolve interesse federal em razão da natureza dos bens e dos valores jurídicos tutelados, vale dizer, a regularidade do Programa Nacional de Alimentação Escolar, para o qual são destinadas verbas federais. Tanto que o artigo 50, § 20, da MP 2.178-36⁄2001, que dispõe sobre o repasse de recursos do PNAE, aponta o FNDE, o controle interno da União e o Ministério Público Federal como órgãos destinatários de denúncia de irregularidades identificadas na aplicação dos recursos destinados à execução do PNAE.
A desnecessidade de convênio, ajuste, acordo ou contrato, sendo os recursos depositados diretamente em conta-corrente específica (art. 20), não desnatura o caráter descentralizado da política, nem significa incorporação automática ao erário municipal sem qualquer vinculação com o ente federal. Ademais, também não afasta o dever de prestação de contas, explicitamente estampado na legislação, como referi no parágrafo anterior. Esta diretriz – poder fiscalizatório e conseqüente dever de prestação de contas (atribuição a ser exercida pelo FNDE, expressamente prevista no § 40 do artigo 40) -, inclusive, animou a edição da Súmula 208 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual "Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal."
Outro dado que reforça a conclusão pela competência federal para julgar esta causa é a diretriz que informou este Tribunal Regional Federal no julgamento da AÇÃO PENAL Nº 2001.04.0l.057893-0⁄PR. Naquela oportunidade, foi afirmada a competência federal para julgar denúncia contra mandatário municipal de emprego irregular de verba do PNAE, em desacordo com a destinação da política pública.
Neste sentido, inclusive, a manifestação da própria União nestes litígios, segundo a qual "a verba orçamentária federal não é dada a findo perdido, mas sim repassada para aplicação específica como execução descentralizada do programa (PNAE), devendo, em caso de não utilização, ser devolvida à origem, com juros e correção monetária (inciso XXI do art. 13 da Resolução 32⁄06). Na condição de verba federal, as transferências do PNAE estão sujeitas a prestação de contas e fiscalização pelos órgãos federais, como, por exemplo, Controladoria-Geral da União - COU e Tribunal de Contas da União - TCU (ad. 40 da MP 2.178). O Programa Nacional de Alimentação Escolar, além de ter verba federal, é normatizado, coordenado e fiscalizado por órgão público federal, no caso o FNDE (art. 60, 1, da Resolução 3 2⁄06), o que torna legítimo o interesse da União em intervir no feito na condição de litisconsorte processual da parte autora, no sentido de coadjuvar o autor na causa."
Presente, portanto, hipótese de competência da Justiça Federal, bem como legitima a participação da União e do Ministério Público Federal no pólo ativo da relação processual (grifei).
O acórdão recorrido encontra-se no mesmo sentido da jurisprudência desse STJ, no sentido de que é competente a justiça federal para apreciar ação civil pública por ato de improbidade administrativa, que envolva a apuração de lesão a recursos públicos federais sujeitos a prestação de contas perante órgãos federais. Nesse sentido é a disposição da Súmula 208 do STJ: "Compete à justiça federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal".
Assim, resta outro óbice ao conhecimento do recurso especial (Súmula 83⁄STJ), pois, tratando-se de malversação de verbas federais, repassadas pela União ao Município de Canoas⁄RS, para aporte financeiro ao Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE⁄FNDE, cujo objetivo é atender as necessidades nutricionais de alunos matriculados em escolas públicas, razão pela qual é inquestionável a competência da Justiça Federal e a legitimidade ativa do MPF. No mesmo sentido:
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DESVIO DE VERBAS DO PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR INTEGRADO AO FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – FNDE. PREFEITO MUNICIPAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS A ÓRGÃO FEDERAL. INTERESSE DA UNIÃO. SÚMULA 208⁄STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ORDEM CONCEDIDA.
1. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE é uma autarquia federal que atende a uma política nacional de educação, provendo recursos e executando ações.
2. O FNDE provê e fiscaliza os recursos remetidos com o finalidade de estimular o desenvolvimento da educação nos Estados, Distrito Federal e Municípios.
3. A malversação de verbas oriundas do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE, integrante do Fundo Nacional de Desenvolvimento Escolar – FNDE, enseja o interesse da União, visto que é necessária a prestação de contas a órgão federal, aplicando-se à espécie a Súmula 208⁄STJ.
4. Ordem concedida para definir a competência da Justiça Federal para o processamento e o julgamento do feito.
(HC 163023⁄PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 27⁄05⁄2010, DJe 21⁄06⁄2010, grifei).
Com essas considerações, nego provimento ao agravo regimental.
É o voto.
Documento: 32177458 | RELATÓRIO E VOTO |