4 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
RELATOR | : | MINISTRO JORGE MUSSI |
IMPETRANTE | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
ADVOGADO | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
IMPETRADO | : | TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
PACIENTE | : | ROSÂNGELA PEREIRA DA SILVA |
IMPETRANTE | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
ADVOGADO | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
IMPETRADO | : | TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
PACIENTE | : | ROSÂNGELA PEREIRA DA SILVA |
O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em favor de ROSÂNGELA PEREIRA DA SILVA, apontando como autoridade coatora o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que denegou a ordem pleiteada no HC n. 1.0000.13.055025-4⁄000.
Noticiam os autos que foi lavrado Termo Circunstanciado de Ocorrência, noticiando a suposta prática da contravenção penal de vias de fato e do delito de ameaça pela paciente.
A vítima representou perante a autoridade policial, momento em que se comprometeu a comparecer em juízo em audiência preliminar designada para o dia 2.3.2012.
Na citada audiência, a despeito da ausência da vítima, foi oferecida transação penal à paciente, que aceitou a proposta do Ministério Público, que entendeu que sua conduta se amoldaria aos tipos previstos nos artigos 129 e 147 do Código Penal.
Contra a decisão que homologou a transação citada, a Defensoria Pública interpôs recurso de apelação, ao qual a Turma Recursal negou provimento.
Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus na origem, tendo a ordem sido denegada.
Sustenta a impetrante que a paciente seria alvo de constrangimento ilegal, pois a ausência da vítima na audiência, quando intimada ou não localizada, importaria renúncia tácita à representação, nos termos do enunciado n. 117 do FONAJE – Fórum Nacional de Juizados Especiais.
Salienta, ainda, o disposto no enunciado n. 99 do FONAJE, segundo o qual em caso de desinteresse da vítima ou de composição civil, deixa de existir justa causa para a ação penal.
Defende que não poderia ter sido proposta à paciente transação penal antes de ser tentada a composição civil entre as partes, o que não foi possível diante da ausência da vítima à audiência.
Alega violação ao disposto no artigo 71 da Lei 9.099⁄1995, na medida em que a vítima deveria ter sido intimada para nova audiência preliminar a ser designada.
Entende que nas ações públicas condicionadas à representação somente se não obtida a composição civil entre as partes e se a vítima exercer em juízo seu direito de representação é que seria possível ao Ministério Público propor ao acusado transação penal.
Requer a concessão da ordem para que seja declarada a nulidade da transação penal em razão da ausência de justa causa para a ação penal, declarando-se, em consequência, a extinção da punibilidade da paciente. Alternativamente, pleiteia a anulação da mencionada transação para que seja designada nova audiência preliminar, possibilitando às partes a composição civil.
A liminar foi deferida, nos termos da decisão de fls. 142⁄143.
Prestadas as informações (e-STJ fls. 157 e 226⁄227), o Ministério Público Federal, em parecer de fls. 262⁄265, manifestou-se pelo não conhecimento do writ.
É o relatório.
O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Por meio deste habeas corpus pretende-se, em síntese, a anulação da transação penal ofertada pelo Ministério Público e aceita pela paciente, extinguindo-se a sua punibilidade ou possibilitando às partes nova composição civil.
Cumpre analisar, preliminarmente, a adequação da via eleita para a manifestação da irresignação contra o acórdão proferido pelo Tribunal a quo.
Nos termos do artigo 105, inciso I, alínea c, da Constituição Federal, este Superior Tribunal de Justiça é competente para processar e julgar, de forma originária, os habeas corpus impetrados contra ato de tribunal sujeito à sua jurisdição e de Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica; ou quando for coator ou paciente as autoridades elencadas na alínea a do mesmo dispositivo constitucional, hipóteses não ocorrentes na espécie.
Por outro lado, prevê a alínea a do inciso II do artigo 105 que o Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar, mediante recurso ordinário, os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais o pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória.
De se destacar que a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC n. 109.956⁄PR, buscando dar efetividade às normas previstas no artigo 102, inciso II, alínea a, da Constituição Federal, e dos artigos 30 a 32 da Lei 8.038⁄1990, passou a não mais admitir o manejo do habeas corpus originário perante aquela Corte em substituição ao recurso ordinário cabível, entendimento que passou ser adotado por este Superior Tribunal de Justiça, a fim de que fosse restabelecida a organicidade da prestação jurisdicional que envolve a tutela do direito de locomoção.
Assim, insurgindo-se a impetração contra acórdão do Tribunal de origem que denegou a ordem pleiteada no prévio writ, mostra-se incabível o manejo do habeas corpus originário, já que não configurada nenhuma das hipóteses elencadas no artigo 105, inciso I, alínea c, da Constituição Federal, razão pela qual não merece conhecimento.
Entretanto, o constrangimento apontado na inicial será analisado, a fim de que se verifique a existência de flagrante ilegalidade que justifique a atuação de ofício por este Superior Tribunal de Justiça.
De acordo com o artigo 70 da Lei 9.099⁄1995, após a lavratura do termo circunstanciado, e não comparecendo imediatamente o autor do fato e a vítima, será designada audiência preliminar, na qual se tentará a composição civil dos danos, bem como a transação penal.
Por sua vez, o artigo 71 do mencionado diploma legal prevê que, não estando presentes o acusado e o ofendido para a realização de audiência, estes serão devidamente intimados para a referido ato.
Já o artigo 72 estabelece que na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, devidamente acompanhados de defensor, o magistrado esclarecerá sobre a possibilidade de composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena privativa de liberdade.
Da leitura dos referidos dispositivos da Lei dos Juizados Especiais, depreende-se que se está diante de fase pré-processual, na qual se busca a conciliação entre o autor do fato e a vítima, ou a aplicação imediata de sanção não privativa de liberdade ao acusado, tudo de modo a evitar a deflagração de ação penal.
Assim, ao contrário do que sustentado na impetração, a ausência de quaisquer das partes à audiência preliminar não acarreta maiores consequências processuais, a não ser a dispensa da obtenção do benefício da transação penal por parte do autor do fato, e a desistência de eventual reparação civil pelo ofendido.
Com efeito, não se pode interpretar o não comparecimento da vítima ao mencionado ato processual com a extensão pretendida na inicial do mandamus, pois, como visto, nesta fase da persecução penal objetiva-se apenas evitar o início do processo criminal, seja por meio da conciliação civil ou da transação penal, não se podendo afirmar que a ausência do ofendido importaria renúncia ao direito de representação já manifestado oportunamente, tampouco a inexistência de justa causa para a persecução penal.
Com efeito, já tendo a vítima representando a tempo e modo contra a acusada em sede policial (e-STJ fl. 52), não se pode afirmar que a sua ausência em audiência designada apenas para a composição civil dos danos significaria o seu desinteresse na persecução penal.
Por outro lado, a vítima não é obrigada a aceitar a composição civil dos danos, motivo pelo qual o seu não comparecimento ao ato no qual se tentaria alcançar a conciliação entre as partes não enseja a carência de justa causa para a ação penal.
Ademais, não há que se falar em nova intimação do ofendido para comparecer à audiência preliminar, uma vez que o artigo 71 da Lei 9.099⁄1995 prevê a notificação dos envolvidos apenas quando não comparecem de imediato ao Juizado Especial, após a lavratura do termo circunstanciado.
Assim, como bem destacado no aresto objurgado, a "ausência de uma das partes à audiência preliminar prevista na Lei dos Juizados Especiais somente permite concluir pela impossibilidade de conciliação ou de composição civil entre os envolvidos na prática delitiva" (e-STJ fl. 127).
Na mesma esteira é a lição de Guilherme de Souza Nucci:
Desse modo, não tendo a vítima, devidamente intimada, comparecido à audiência em que se tentaria a composição civil dos danos, e não sendo possível a sua condução coercitiva, tampouco obrigatória a conciliação entre as partes, inexiste ilegalidade na proposta de transação penal à acusada que, devidamente assistida pela Defensoria Pública, aceitou o benefício.
Não se deparando, portanto, com flagrante ilegalidade no ato apontado como coator, não se conhece do habeas corpus substitutivo, cassando-se a liminar anteriormente concedida.
É o voto.
Número Registro: 2013⁄0401393-3 | PROCESSO ELETRÔNICO | HC 284.107 ⁄ MG |
MATÉRIA CRIMINAL |
EM MESA | JULGADO: 12⁄08⁄2014 |
IMPETRANTE | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
ADVOGADO | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
IMPETRADO | : | TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
PACIENTE | : | ROSÂNGELA PEREIRA DA SILVA |
Documento: 1338000 | Inteiro Teor do Acórdão | - DJe: 21/08/2014 |