3 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Relatório e Voto
RECORRENTE | : | SUELY PINHEIRO DA SILVA |
ADVOGADO | : ANA PAULA NASCIMENTO DE OLIVEIRA | |
RECORRIDO | : | BANCO CITICARD S/A |
ADVOGADO | : | ISABELLA PICANÇO MACHADO MATEUS VIEIRA E OUTRO (S) |
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMAO (Relator):
1. Suely Pinheiro da Silva ajuizou em face de Banco Citicard S/A ação declaratória de inexistência de débito, cumulada com indenização por danos morais, alegando que seu cartão de crédito foi furtado em 20.06.2003 e comunicou o fato à ré, administradora do cartão, por telefone, no mesmo dia. No entanto, as compras realizadas em estabelecimentos comerciais, mediante falsificação de sua assinatura, entre o momento do furto e a comunicação realizada pela autora, não foram assumidas pela instituição financeira. Por essa razão, a autora teve seu nome inscrito no cadastro de proteção ao crédito.
O Juízo de Direito da 18ª Vara Cível da Comarca da Capital/RJ julgou parcialmente procedente o pedido e declarou a inexistência da dívida em relação às compras impugnadas, condenando a ré ao pagamento de indenização a título de danos morais no valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais). (fls. 138/142)
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro reformou parcialmente a sentença, declarando a responsabilidade do consumidor pelas compras realizadas no mesmo dia da comunicação do furto, assim também para reduzir o valor da indenização a R$ 6.000,00 (seis mil reais),
O acórdão está assim ementado:
Sobreveio recurso especial da autora, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, no qual se alega, além de dissídio jurisprudencial, ofensa aos arts. 6º, III, IV, V e VIII, 39, IV, V, 43, 2º, e 51, inciso IV, X, XI, XV, 1º e 2º, todos do CDC.
Pugna a recorrente, em síntese, pela responsabilização da recorrida no que concerne às compras realizadas no mesmo dia da comunicação do furto, pois nulas as cláusulas do contrato que isentam a ré desse encargo, assim também postula o restabelecimento da indenização por danos morais no patamar de R$ 12.000,00.
Contra-arrazoado (fls. 197/203), o especial foi admitido (fls. 206/208).
É o relatório.
RELATOR | : | MINISTRO LUIS FELIPE SALOMAO |
RECORRENTE | : | SUELY PINHEIRO DA SILVA |
ADVOGADO | : ANA PAULA NASCIMENTO DE OLIVEIRA | |
RECORRIDO | : | BANCO CITICARD S/A |
ADVOGADO | : | ISABELLA PICANÇO MACHADO MATEUS VIEIRA E OUTRO (S) |
EMENTA
DIREITO DO CONSUMIDOR. FURTO DE CATAO DE CRÉDITO. COMPRAS REALIZADAS POR TERCEIROS NO MESMO DIA DA COMUNICAÇAO. RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRADORA DE CARTÕES. DEMORA DE MENOS DE DOIS ANOS PARA O AJUIZAMENTO DA AÇAO. IRRELEVÂNCIA NA FIXAÇAO DO QUANTUM . RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
1. O consumidor que, no mesmo dia do furto de seu cartão de crédito, procede à comunicação à administradora acerca do fato, não pode ser responsabilizado por despesas realizadas mediante falsificação de sua assinatura. Deveras, cabe à administradora de cartões, em parceria com a rede credenciada, a verificação da idoneidade das compras realizadas, utilizando-se de meios que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, e isso independentemente de qualquer ato do consumidor, tenha ou não ocorrido furto.
2. A demora de menos de dois anos para o ajuizamento da ação não possui qualquer relevância para fixação da indenização por dano moral. Em realidade, é de todo recomendável que a ação não seja ajuizada tão-logo o cidadão se sinta lesado, buscando primeiro as vias extrajudiciais de solução e prevenção de conflitos, como ocorreu no caso, em que a autora pretendeu, sem sucesso, a composição amigável junto à administração da empresa ré.
3. Recurso especial conhecido e provido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMAO (Relator):
2. A questão principal debatida nos autos é saber se, em caso de furto de cartão de crédito, as compras realizadas por terceiros, mediante falsificação da assinatura do titular, no mesmo dia em que a comunicação do furto foi efetuada à administradora, é de responsabilidade desta ou do consumidor.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro entendeu que não houve tempo hábil para a instituição financeira impedir que fossem realizadas compras com o cartão de crédito da autora, nos termos dos seguintes fundamentos:
3. Tenho que merece reforma a decisão, no particular.
Isso porque o acórdão ora recorrido, ao afastar a responsabilidade da administradora pela falta de tempo hábil para providenciar o cancelamento dos cartões, em realidade, acabou por imputar ao consumidor a culpa pela agilidade dos falsificadores, transformando-o de vítima em responsável, olvidando-se por completo do risco da atividade exercida pela ré.
O consumidor que, no mesmo dia do furto de seu cartão de crédito, procede á comunicação à administradora acerca do fato, não pode ser responsabilizado por despesas realizadas mediante falsificação de sua assinatura.
Deveras, cabe à administradora de cartões, em parceria com a rede credenciada, a verificação da idoneidade das compras realizadas, utilizando-se de meios que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, e isso independentemente de qualquer ato do consumidor, tenha ou não ocorrido furto.
Nesse sentido, confiram-se os precedentes:
3. Por outro lado, para reduzir o montante da indenização, o Tribunal a quo usou como fundamento o lapso temporal escoado entre os eventos descritos pela autora e o ajuizamento da ação, nos seguintes termos:
Penso, todavia, que o recurso também merece prosperar quanto ao ponto.
É que, muito embora existam precedentes que entendam que a demora para o ajuizamento da ação possua o condão de amenizar o dano moral (REsp 399.028/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26/02/2002), no caso concreto, tenho que o lapso temporal transcorrido não tem essa virtualidade.
Os fatos narrados ocorreram em junho de 2003 e a ação foi ajuizada em maio de 2005.
Com efeito, a demora de menos de dois anos para o ajuizamento da ação não possui qualquer relevância na fixação da indenização por dano moral. Em realidade, é de todo recomendável que a ação não seja ajuizada tão-logo o cidadão se sinta lesado, buscando primeiro as vias extrajudiciais de solução e prevenção de conflitos, como ocorreu no caso, em que a autora pretendeu, sem sucesso, a composição amigável junto à administração da empresa ré.
Por óbvio, o tempo opera efeitos deletérios no sofrimento experimentado, com ou sem o ajuizamento da ação. Porém, a tese, no extremo, conduz a absurdos, como por exemplo, paga uma indenização em tempo curto, teria o devedor direito à repetição do indébito quando esvaída a dor da vítima.
De fato, o que se indeniza é o dano experimentado pela vítima, e não o seu sofrimento contemporâneo ao ajuizamento da ação, mesmo porque a indenização por dano moral foi alçada pela CF/88 ao status de direito fundamental (art. 5º, inciso X), devendo a reparação do dano ser ampla e irrestrita, tendo em vista que não é lícito ao hermeneuta do direito criar limitação, em matéria de direito fundamental, aonde a Constituição assim não o procedeu.
Em sentido análogo, confiram-se os precedentes:
Com efeito, inexistindo o limitador a que fez alusão o acórdão recorrido, a condenação por danos morais deve ser restabelecida no patamar de R$ 12.000,00 (doze mil reais), conforme a sentença de fls. 138/142.
4. Diante do exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para restabelecer a sentença de primeiro grau, integralmente, inclusive em relação aos ônus sucumbenciais.
É como voto.
Documento: 8638037 | RELATÓRIO, EMENTA E VOTO |