18 de Abril de 2024
- 2º Grau
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Precedente Obrigatório • Tese Jurídica
Tema 4
Definir se é possível conferir proteção simultânea - pelos institutos da patente de invenção (Lei 9.279/96) e da proteção de cultivares (Lei 9.456/97) - a sementes de soja Roundup Ready, obtidas mediante a técnica da transgenia, e, como corolário, se é ou não facultado aos produtores rurais o direito de reservar o produto de seu cultivo para replantio e comercialização como alimento ou matéria prima, bem como o direito de pequenos agricultores de doar ou trocar sementes reservadas no contexto de programas oficiais específicos.
Tese
"As limitações ao direito de propriedade intelectual constantes do art. 10 da Lei 9.456/97 - aplicáveis tão somente aos titulares de Certificados de Proteção de Cultivares - não são oponíveis aos detentores de patentes de produto e/ou processo relacionados à transgenia cuja tecnologia esteja presente no material reprodutivo de variedades vegetais".
Detalhes
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Superior Tribunal de Justiça Revista Eletrônica de Jurisprudência |
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SERTÃO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SANTIAGO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO |
RECORRENTE | : | FEDERACAO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA NO RIO GRANDE DO SUL |
ADVOGADOS | : | DENIS BORGES BARBOSA E OUTRO (S) - RJ023865 |
NERI PERIN E OUTRO (S) - RS025883 | ||
JANE LÚCIA WILHELM BERWANGER - RS046917 | ||
RAUL MURAD RIBEIRO DE CASTRO - RJ162384 | ||
LIVIA BARBOZA MAIA E OUTRO (S) - RJ182505 | ||
FERNANDA FERNANDES DA SILVA - RJ195640 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO CO |
ADVOGADOS | : | GOMERCINDO LINS COITINHO E OUTRO (S) - RS002743 |
ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO DO BRASIL LTDA |
ADVOGADOS | : | ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 |
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
CARINE PIGATTO TERMIGNONI - RS048110 | ||
IVO GABRIEL CORRÊA DA CUNHA E OUTRO (S) - RS003999 | ||
RAMIRO CORRÊA DA CUNHA - RS062264 | ||
BIBIANA DA SILVA OLIVEIRA BOTTIN CAYE - RS078887 | ||
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE GIRUÁ |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE ARVOREZINHA |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE JATAÍ |
ADVOGADO | : | JOÃO RAFAEL DAL MOLIM E OUTRO (S) - RS050489 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO DOS AGRICULTORES DE DOM PEDRITO |
ADVOGADO | : | ANDERSON RICARDO LEVANDOWSKI BELLOLI - RS081110 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SEMENTES E MUDAS - ABRASEM |
ADVOGADOS | : | DANIEL USTÁRROZ E OUTRO (S) - RS051548 |
ANTONIO JANYR DALL AGNOL JUNIOR E OUTRO (S) - RS005693 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - DF022224 | ||
INTERES. | : | AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA |
ADVOGADOS | : | ADMA PEDRO DIAMENTI - SP329928 |
PATRICIA FUKUMA JANNINI E OUTRO (S) - SP107635 | ||
FLAVIA DANIELA TOLEDO ANTONANZAS - SP273821 | ||
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS E CONSUMIDORES - ABMC |
ADVOGADO | : | ROBERTO SOLIGO - MS002464 |
INTERES. | : | INSTITUTO BRASILEIRO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL |
ADVOGADOS | : | NEWTON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP015842 |
WILSON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP024798 | ||
INTERES. | : | ABPI ASSOCIACAO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE" |
ADVOGADOS | : | LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ046214 |
RODRIGO AFFONSO DE OURO PRETO SANTOS - RJ079659 | ||
INTERES. | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL |
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SERTÃO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SANTIAGO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO |
RECORRENTE | : | FEDERACAO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA NO RIO GRANDE DO SUL |
ADVOGADOS | : | DENIS BORGES BARBOSA E OUTRO (S) - RJ023865 |
NERI PERIN E OUTRO (S) - RS025883 | ||
JANE LÚCIA WILHELM BERWANGER - RS046917 | ||
RAUL MURAD RIBEIRO DE CASTRO - RJ162384 | ||
LIVIA BARBOZA MAIA E OUTRO (S) - RJ182505 | ||
FERNANDA FERNANDES DA SILVA - RJ195640 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO CO |
ADVOGADOS | : | GOMERCINDO LINS COITINHO E OUTRO (S) - RS002743 |
ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO DO BRASIL LTDA |
ADVOGADOS | : | ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 |
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
CARINE PIGATTO TERMIGNONI - RS048110 | ||
IVO GABRIEL CORRÊA DA CUNHA E OUTRO (S) - RS003999 | ||
RAMIRO CORRÊA DA CUNHA - RS062264 | ||
BIBIANA DA SILVA OLIVEIRA BOTTIN CAYE - RS078887 | ||
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE GIRUÁ |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE ARVOREZINHA |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE JATAÍ |
ADVOGADO | : | JOÃO RAFAEL DAL MOLIM E OUTRO (S) - RS050489 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO DOS AGRICULTORES DE DOM PEDRITO |
ADVOGADO | : | ANDERSON RICARDO LEVANDOWSKI BELLOLI - RS081110 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SEMENTES E MUDAS - ABRASEM |
ADVOGADOS | : | DANIEL USTÁRROZ E OUTRO (S) - RS051548 |
ANTONIO JANYR DALL AGNOL JUNIOR E OUTRO (S) - RS005693 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - DF022224 | ||
INTERES. | : | AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA |
ADVOGADOS | : | ADMA PEDRO DIAMENTI - SP329928 |
PATRICIA FUKUMA JANNINI E OUTRO (S) - SP107635 | ||
FLAVIA DANIELA TOLEDO ANTONANZAS - SP273821 | ||
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS E CONSUMIDORES - ABMC |
ADVOGADO | : | ROBERTO SOLIGO - MS002464 |
INTERES. | : | INSTITUTO BRASILEIRO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL |
ADVOGADOS | : | NEWTON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP015842 |
WILSON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP024798 | ||
INTERES. | : | ABPI ASSOCIACAO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE" |
ADVOGADOS | : | LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ046214 |
RODRIGO AFFONSO DE OURO PRETO SANTOS - RJ079659 | ||
INTERES. | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL |
Cuida-se de recurso especial interposto por SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO e OUTROS, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional.
Ação: coletiva, ajuizada pelos sindicatos recorrentes em face de MONSANTO DO BRASIL LTDA e MONSANTO TECHNOLOGY LLC, com o objetivo de ver reconhecidos os direitos dos sojicultores brasileiros, sem pagamento de royalties, taxa tecnológica ou indenização, de reservar sementes transgênicas da soja Roundup Ready (soja RR) para replantio, de vender a produção como alimento ou como matéria-prima e, quanto aos pequenos produtores rurais, de doar ou trocar as sementes reservadas.
Sentença: julgou parcialmente procedentes os pedidos, para declarar o direito dos sojicultores brasileiros de: (i) reservar o produto cultivares de soja transgênica, para replantio em seus campos de cultivo e o direito de vender essa produção como alimento ou matéria-prima, sem nada mais pagar a título de royalties, taxa tecnológica ou indenização, nos termos do art.1000, incisos I e II, da Lei nº9.45666⁄97, a contar do dia 01.09.2010; (ii) doar ou trocar sementes reservadas a outros pequenos produtores rurais, nos termos do art.100, inciso IV,§ 3ºº e incisos, da Lei nº 9.456 6⁄97, a contar do dia 01.09.2010. Condenou as recorridas a: (i) se absterem de cobrar royalties, taxa tecnológica ou indenização, sobre a comercialização da produção da soja transgênica produzida no Brasil, a contar da safra 2003⁄2004; (ii) devolverem os valores cobrados sobre a produção da soja transgênica a partir da safra 2003⁄2004, corrigida pelo IGPM e acrescida de juros de 1% ao mês, a contar da safra 2033⁄2004, tudo a ser apurado em liquidação de sentença. Concedeu, ainda, medida liminar de ofício para determinar a imediata suspensão na cobrança de royalties, taxa tecnológica ou indenização, sobre a comercialização da produção da soja transgênica produzida no Brasil, sob pena de multa diára no valor de 1.000.000,00 (um milhão de reais). (e-STJ 3.367⁄3.416).
Embargos de declaração: opostos pelos recorrentes, foram acolhidos apenas para corrigir erro material relativo à safra mencionada no dispositivo (safra 2003⁄2004 e não safra 2033⁄2004) e para alterar o valor devido a título de honorários advocatícios.
Acórdão: desacolheu os agravos retidos, afastou as preliminares e, por maioria, deu provimento à apelação interposta pelas recorridas, para julgar improcedentes os pedidos deduzidos na inicial.
Embargos de declaração: opostos pelos recorrentes, foram rejeitados.
Embargos infringentes: opostos pelos recorrentes, foram rejeitados, nos termos da seguinte ementa:
Embargos de declaração: opostos pelos recorrentes, foram acolhidos em parte, apenas para afastar a condenação em honorários, ante a ausência de má-fé dos autores no ajuizamento da ação coletiva.
Recurso especial: aponta, além de divergência jurisprudencial, violação dos arts. 2º, 7º e 10 da Lei 9.456⁄97 (Lei de Proteção de Cultivares); do art. 2.1 da UPOV⁄78 (União para a Proteção das Obtenções Vegetais), promulgado pelo Decreto 3.109⁄99; e dos arts. 18, III, parágrafo único, e 42 da Lei 9.279⁄96 (Lei de Propriedade Industrial). Entende que as recorridas não podem cobrar royalties por condutas que são explicitamente qualificadas pelo ordenamento jurídico como de uso livre, ressaltando que a única forma de obstar tal liberdade de utilização seria mediante eventual autorização contida na Lei de Proteção de Cultivares, uma vez que há vedação legal à dupla proteção. Defende que a existência de patentes produziria efeitos apenas num primeiro momento, para impedir que terceiros reproduzam o processo de transgenia e para fundamentar a cobrança de royalties para a venda da primeira semente. Posteriormente, seria aplicado o regime da LPC. Argumenta que a Lei de Propriedade Industrial, sendo lei anterior e geral, não pode suplantar a Lei de Proteção de Cultivares, lei posterior e especial. Aponta que há barreiras que impedem a aplicação do artigo 42, II, da LPI, como a vedação para o patenteamento de produtos vivos, estabelecida no art. 18, III, da mesma lei. Ressalta que, de acordo com as Diretrizes de Exame de Patente do INPI, nem a semente transgênica e nem o gene se qualificam juridicamente como microrganismo. Alega que as recorridas buscam a reiteração da cobrança de royalties para produtos em relação aos quais já ocorreu a exaustão dos direitos de propriedade industrial. Cita julgado de Corte argentina que também reconhece a impossibilidade de cumulação das tutelas de patente com cultivar, enfatizando o caráter internacionalizado do direito da propriedade intelectual, que tem por resultado uma aproximação das legislações nacionais quanto ao tema.
Juízo de admissibilidade: O Tribunal de origem admitiu o recurso especial.
Redistribuição: os autos foram inicialmente distribuídos ao eminente Min. Marco Buzzi, que declinou da competência, determinando a redistribuição a um dos Ministros integrantes da Terceira Turma.
Os recorrentes interpuseram agravo regimental quanto à determinação de livre distribuição na Terceira Turma, o qual não foi conhecido.
Incidente de assunção de competência: a Segunda Seção admitiu o incidente de assunção de competência, destacando o seguinte tema:" definir se é possível conferir proteção simultânea - pelos institutos da patente de invenção (Lei 9.279⁄96) e da proteção de cultivares (Lei 9.456⁄97)- a sementes de soja Roundup Ready, obtidas mediante a técnica da transgenia, e, como corolário, se é ou não facultado aos produtores rurais o direito de reservar o produto de seu cultivo para replantio e comercialização como alimento ou matéria prima, bem como o direito de pequenos agricultores de doar ou trocar sementes reservadas no contexto de programas oficiais específicos (e-STJ 5.900⁄5.918).
Parecer do Ministério Público Federal: pelo provimento do recurso especial (e-STJ fls. 6005⁄6016).
É o relatório.
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SERTÃO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SANTIAGO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO |
RECORRENTE | : | FEDERACAO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA NO RIO GRANDE DO SUL |
ADVOGADOS | : | DENIS BORGES BARBOSA E OUTRO (S) - RJ023865 |
NERI PERIN E OUTRO (S) - RS025883 | ||
JANE LÚCIA WILHELM BERWANGER - RS046917 | ||
RAUL MURAD RIBEIRO DE CASTRO - RJ162384 | ||
LIVIA BARBOZA MAIA E OUTRO (S) - RJ182505 | ||
FERNANDA FERNANDES DA SILVA - RJ195640 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO CO |
ADVOGADOS | : | GOMERCINDO LINS COITINHO E OUTRO (S) - RS002743 |
ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO DO BRASIL LTDA |
ADVOGADOS | : | ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 |
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
CARINE PIGATTO TERMIGNONI - RS048110 | ||
IVO GABRIEL CORRÊA DA CUNHA E OUTRO (S) - RS003999 | ||
RAMIRO CORRÊA DA CUNHA - RS062264 | ||
BIBIANA DA SILVA OLIVEIRA BOTTIN CAYE - RS078887 | ||
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE GIRUÁ |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE ARVOREZINHA |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE JATAÍ |
ADVOGADO | : | JOÃO RAFAEL DAL MOLIM E OUTRO (S) - RS050489 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO DOS AGRICULTORES DE DOM PEDRITO |
ADVOGADO | : | ANDERSON RICARDO LEVANDOWSKI BELLOLI - RS081110 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SEMENTES E MUDAS - ABRASEM |
ADVOGADOS | : | DANIEL USTÁRROZ E OUTRO (S) - RS051548 |
ANTONIO JANYR DALL AGNOL JUNIOR E OUTRO (S) - RS005693 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - DF022224 | ||
INTERES. | : | AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA |
ADVOGADOS | : | ADMA PEDRO DIAMENTI - SP329928 |
PATRICIA FUKUMA JANNINI E OUTRO (S) - SP107635 | ||
FLAVIA DANIELA TOLEDO ANTONANZAS - SP273821 | ||
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS E CONSUMIDORES - ABMC |
ADVOGADO | : | ROBERTO SOLIGO - MS002464 |
INTERES. | : | INSTITUTO BRASILEIRO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL |
ADVOGADOS | : | NEWTON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP015842 |
WILSON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP024798 | ||
INTERES. | : | ABPI ASSOCIACAO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE" |
ADVOGADOS | : | LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ046214 |
RODRIGO AFFONSO DE OURO PRETO SANTOS - RJ079659 | ||
INTERES. | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL |
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SERTÃO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SANTIAGO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO |
RECORRENTE | : | FEDERACAO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA NO RIO GRANDE DO SUL |
ADVOGADOS | : | DENIS BORGES BARBOSA E OUTRO (S) - RJ023865 |
NERI PERIN E OUTRO (S) - RS025883 | ||
JANE LÚCIA WILHELM BERWANGER - RS046917 | ||
RAUL MURAD RIBEIRO DE CASTRO - RJ162384 | ||
LIVIA BARBOZA MAIA E OUTRO (S) - RJ182505 | ||
FERNANDA FERNANDES DA SILVA - RJ195640 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO CO |
ADVOGADOS | : | GOMERCINDO LINS COITINHO E OUTRO (S) - RS002743 |
ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO DO BRASIL LTDA |
ADVOGADOS | : | ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 |
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
CARINE PIGATTO TERMIGNONI - RS048110 | ||
IVO GABRIEL CORRÊA DA CUNHA E OUTRO (S) - RS003999 | ||
RAMIRO CORRÊA DA CUNHA - RS062264 | ||
BIBIANA DA SILVA OLIVEIRA BOTTIN CAYE - RS078887 | ||
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE GIRUÁ |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE ARVOREZINHA |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE JATAÍ |
ADVOGADO | : | JOÃO RAFAEL DAL MOLIM E OUTRO (S) - RS050489 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO DOS AGRICULTORES DE DOM PEDRITO |
ADVOGADO | : | ANDERSON RICARDO LEVANDOWSKI BELLOLI - RS081110 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SEMENTES E MUDAS - ABRASEM |
ADVOGADOS | : | DANIEL USTÁRROZ E OUTRO (S) - RS051548 |
ANTONIO JANYR DALL AGNOL JUNIOR E OUTRO (S) - RS005693 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - DF022224 | ||
INTERES. | : | AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA |
ADVOGADOS | : | ADMA PEDRO DIAMENTI - SP329928 |
PATRICIA FUKUMA JANNINI E OUTRO (S) - SP107635 | ||
FLAVIA DANIELA TOLEDO ANTONANZAS - SP273821 | ||
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS E CONSUMIDORES - ABMC |
ADVOGADO | : | ROBERTO SOLIGO - MS002464 |
INTERES. | : | INSTITUTO BRASILEIRO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL |
ADVOGADOS | : | NEWTON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP015842 |
WILSON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP024798 | ||
INTERES. | : | ABPI ASSOCIACAO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE" |
ADVOGADOS | : | LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ046214 |
RODRIGO AFFONSO DE OURO PRETO SANTOS - RJ079659 | ||
INTERES. | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL |
O propósito recursal é definir se produtores de soja podem, sem que haja violação dos direitos de propriedade intelectual das recorridas, reservar livremente o produto da soja transgênica Roundup Ready (soja RR) para replantio em seus campos de cultivo, vender a produção desse cultivo como alimento ou matéria-prima e, com relação apenas a pequenos produtores, doar a outros pequenos produtores rurais ou com eles trocar as sementes reservadas.
1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA.
Os recorrentes alegam que a Lei de Proteção de Cultivares autoriza os agricultores por eles representados a reservar o produto da soja transgênica Roundup Ready para replantio em seus campos de cultivo, a vender a produção desse cultivo como alimento ou matéria-prima e, com relação a pequenos produtores, a doar a outros pequenos produtores rurais, ou com eles trocar, sementes reservadas para tal finalidade.
Entendem que a prática dessas condutas independe do pagamento de qualquer valor a título de royalties, taxas tecnológicas ou indenização, à vista da incidência do chamado privilégio do agricultor.
Assim, os direitos de propriedade intelectual das recorridas, segundo argumentam, não teriam o alcance pretendido, pois o ordenamento jurídico confere liberdade à prática das atividades retro mencionadas.
As recorridas, por sua vez, alegam que a cobrança desses valores não se fundamenta no direito de proteção de cultivares, mas, sim, no sistema de patentes, uma vez que são titulares, devidamente reconhecidas pelo Estado, dos direitos sobre as invenções inseridas na soja Roundup Ready.
As patentes concedidas lhes garantiriam o direito exclusivo de exploração dessas tecnologias, não havendo que se cogitar da aplicação do privilégio do agricultor, porquanto as limitações aos direitos de patente, exclusivamente previstas na Lei de Propriedade Industrial, não abrangeriam as atividades cuja prática é reivindicada pelos recorrentes.
Para o Tribunal de origem, todavia, não há como se pretender a aplicação de disposições normativas contidas na Lei de Proteção de Cultivares (Lei 9.456⁄97) à hipótese concreta, pois o produto da soja RR está protegido, específica e comprovadamente, por meio de patentes devidamente expedidas pelo INPI, devendo, assim, ser respeitados os direitos de seus titulares previstos na lei de regência.
Neste momento, é oportuno consignar que o prazo de vigência da proteção legal das recorridas (especificamente da patente n. PI1100008-2) constitui objeto do Recurso Extraordinário 797.449⁄RJ, cuja tramitação foi sobrestada pelo e. Relator em razão da controvérsia instaurada por ocasião do ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.234⁄DF.
Não se pode, portanto, sustentar a ocorrência de eventual perda do objeto deste recurso.
A corroborar tal conclusão, constata-se que os recorrentes deduziram, na inicial, pedidos de declaração de nulidade de valores cobrados a título de royalties e de repetição de indébito de montante já pago, a revelar que o julgamento da presente irresignação não está prejudicado.
Todavia, ainda que assim não fosse, os relevantes efeitos nas esferas jurídica e econômica decorrentes do resultado do presente julgamento, a revelar o interesse público subjacente, justificam o enfrentamento das questões de direito que ora se examina.
2. TUTELA JURÍDICA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL. PATENTES E CULTIVARES: LINHAS GERAIS.
O atual sistema brasileiro de proteção à propriedade intelectual deriva, em grande parte, de compromissos assumidos pelo país no plano internacional, sobretudo junto à Organização Mundial do Comércio (OMC) – mediante a assinatura do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio (Acordo TRIPs)–, à União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial (CUP, revisão de 1967) e à União Internacional para Proteção das Obtenções Vegetais (Convenção UPOV, revisão de 1978).
De se destacar que, tratando especificamente de patentes, o Brasil se obrigou a proteger os respectivos titulares conferindo-lhes os seguintes direitos exclusivos (Acordo TRIPs, art. 28, 1):
No plano interno, a Constituição de 1988 estabelece, no título destinado à proteção dos direitos e garantias fundamentais, que a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país (art. 5º, XXIX).
O estímulo à formação e ao fortalecimento da inovação e de ambientes que a promovam, bem como à criação, à absorção, à difusão e à transferência de tecnologia também constitui dever imposto ao Estado pela Carta Constitucional (arts. 218 a 219-B).
No que concerne a patentes relacionadas com matéria viva e à proteção de cultivares, a tutela jurídica conferida pelo ordenamento pátrio está esquematizada, respectivamente, nas Leis 9.279⁄96 (Lei da Propriedade Industrial – LPI) e 9.456⁄97 (Lei de Proteção aos Cultivares – LPC), editadas com base nas premissas delineadas a partir das diretrizes internacionais contidas nos diplomas antes referidos.
Quanto ao ponto, o art. 27, 1, do Acordo TRIPs dispõe que qualquer invenção, de produto ou de processo, em todos os setores tecnológicos, será patenteável, desde que seja nova, envolva um passo inventivo e seja passível de aplicação industrial, não sendo admitida, quanto à disponibilidade e à fruição dos direitos patentários, discriminação quanto ao local de invenção, quanto a seu setor tecnológico e quanto ao fato de os bens serem importados ou produzidos localmente.
Mais adiante, no item 3, 'b', do mesmo artigo, o Acordo impõe aos membros da OMC que concedam proteção a variedades vegetais, seja por meio de patentes, seja por meio de um sistema sui generis eficaz, seja por uma combinação de ambos.
A forma escolhida pelo Brasil para proteção de novas variedades vegetais resultou de intenso debate travado nas casas legislativas, envolvendo os mais diversos atores sociais.
Como corolário desse debate, ficou positivada na LPI (art. 18, III) a patenteabilidade de microrganismos transgênicos, o que permitiu que processos e produtos alimentícios, farmacêuticos e químicos passassem a ser tutelados por esse diploma legal. Frise-se que o patenteamento de microrganismos encontrados na natureza e de outros seres vivos (plantas e animais, no todo ou em parte) é expressamente vedado pelo próprio dispositivo em questão.
Por outro lado, a proteção da propriedade intelectual sobre variedades vegetais (cultivares) passou a ser regulada por lei específica (Lei 9.456⁄97), que veio a complementar, nesse aspecto, a LPI, como forma de atender ao compromisso firmado pelo país quando da assinatura do Acordo TRIPs (art. 27, 3, 'b').
A LPC, vale ressaltar, estabeleceu o que o Acordo retro citado denominou de sistema protetivo sui generis, mediante o qual a tutela do obtentor de novas variedades vegetais é levada a efeito de forma distinta daquela prevista no sistema de patentes.
3. DO SISTEMA JURÍDICO DE PROTEÇÃO DE VARIEDADES VEGETAIS E DO PRIVILÉGIO DO AGRICULTOR.
A questão central a ser examinada neste julgamento consiste em definir se aos recorrentes deve ser assegurado o que usualmente se denomina de privilégio do agricultor.
Trata-se de verdadeira limitação aos direitos de propriedade intelectual relacionados a variedades vegetais, estes definidos, como já visto, na Lei de Proteção de Cultivares.
De se gizar que o estabelecimento de um sistema de proteção aos direitos daqueles que contribuem para a obtenção e o melhoramento de plantas (obtentor⁄melhorista) constituiu condição a ser obedecida para adesão do Brasil à UPOV (União para a Proteção das Obtenções Vegetais), organização internacional da qual o país se tornou membro em 1999, tendo se comprometido com a internalização das diretrizes estabelecidas na Ata da respectiva convenção revisada em 1978 (promulgada pelo Decreto 3.109⁄99).
Em linhas gerais, segundo a LPC, cumpridos determinados pressupostos relativos sobretudo à distinguibilidade, à homogeneidade e à estabilidade da variedade vegetal, o órgão competente está autorizado a outorgar ao requerente Certificado de Proteção de Cultivar, que garante ao titular os direitos sobre o material de reprodução ou multiplicação vegetativa da planta, em prazo que pode se estender por até 18 anos.
Durante esse prazo, a produção com finalidade comercial, o oferecimento à venda ou a comercialização do material de propagação da cultivar (tais como sementes, mudas, tubérculos, estacas, brotos) dependem de autorização prévia do titular do certificado.
Além dos requisitos retro mencionados, necessários para concessão da proteção a novas variedades vegetais, a Lei em questão estabelece todo um procedimento especial a ser seguido para obtenção da tutela legal junto ao Serviço Nacional de Proteção de Cultivares – SNPC, órgão integrante do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, criado pela Lei 9.456⁄97 com a incumbência de ser o responsável pela análise dos requerimentos formulados pelo respectivo obtentor ou cessionário do direito sobre a cultivar.
Após o cumprimento de todas as etapas do procedimento administrativo, o SNPC emite, finalmente, o Certificado de Proteção de Cultivar, que confere a seu titular o direito à exclusividade de reprodução comercial da variedade vegetal protegida.
Por outro lado, a Lei em questão também prevê situações em que, como forma de conferir equilíbrio à exclusividade outorgada pelo Certificado de Proteção de Cultivar, são impostas certas limitações à proteção dos direitos do melhorista. É o caso do chamado privilégio do agricultor.
Trata-se de exceção que confere aos agricultores o direito de livre acesso, em determinadas circunstâncias que não configurem exploração comercial, à variedade vegetal protegida.
Isso decorre do fato de que, no que concerne ao privilégio do agricultor, as disposições da Ata UPOV de 1978 – à qual o Brasil aderiu – conferem proteção apenas quanto ao aspecto comercial da variedade vegetal, autorizando, assim, a conclusão de que usos de natureza diversa, tais como a troca ou o uso de sementes para replantio, não exigem autorização do titular do direito tutelado.
Quanto ao ponto, esclarece a doutrina especializada:
Vale ressaltar que o aprimoramento das discussões travadas no âmbito da UPOV, como se observa das mudanças havidas a partir da assinatura da Ata de 1991, denotam que o sistema protetivo internacional de variedades vegetais vem limitando as hipóteses de exceção aos direitos do melhorista, sinalizando, cada vez mais, sua aproximação ao sistema de patentes.
Todavia, o compromisso firmado pelo Brasil, como já visto, cingiu-se a respeitar os termos específicos da Ata UPOV de 1978, de modo que a opção legislativa positivada foi a de garantir aos agricultores os privilégios listados no art. 10 da Lei 9.456⁄97. Assim, não fere o direito de propriedade sobre a nova variedade vegetal aquele que:
É, pois, com base nessa limitação aos direitos do titular de Certificado de Proteção de Cultivar que os recorrentes postulam, nas situações listadas na inicial, o não pagamento de royalties, taxa tecnológica ou indenização às empresas recorridas.
4. DO SISTEMA JURÍDICO DE PATENTES: PROTEÇÃO À ATIVIDADE INVENTIVA.
No particular, todavia, verifica-se que, para além de se discutir o âmbito de proteção – e suas respectivas exceções – conferido pelo ordenamento às variedades vegetais, é necessário não perder de vista que as recorridas ostentam a condição de titulares dos direitos decorrentes do patenteamento de um processo específico de transgenia e do produto respectivo (relativo ao gene CP4 EPSPS), o qual, inserido em certas espécies vegetais, lhes confere resistência ao herbicida glifosato.
De se destacar que os royalties cujo pagamento os recorrentes pretendem ver afastados com o ajuizamento da presente ação referem-se ao uso reprodutivo de sementes que contém a tecnologia patenteada, de modo que, para solução da controvérsia, afigura-se imprescindível analisar não somente os ditames da Lei de Proteção de Cultivares, mas também as disposições da Lei de Propriedade Industrial, bem como eventuais interconexões entre elas.
É importante lembrar que a higidez dos atos administrativos que concederam as patentes às recorridas não constitui objeto deste recurso, de modo que não se pode desviar da premissa de que os registros patentários por elas titulados são válidos, circunstância que exige a observância dos efeitos que deles decorrem.
O art. 8º da LPI veicula regra geral do sistema de patentes, que considera patenteável toda invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.
Já o art. 10 desse mesmo diploma legal estabelece o que, para seus fins, não é considerado invenção. Dentre seus incisos, merece destaque, por pertinente à espécie, o seguinte:
O art. 18 da LPI, por sua vez, elenca as situações que, ainda que se trate de inventos, não poderão ser objeto de patente. No que importa à hipótese, dispõe seu inciso III:
Os direitos titulados pelas recorridas, portanto, decorrem desse permissivo legal.
Os pedidos de patente, é cediço, seguem um procedimento específico junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, autarquia federal vinculada ao Ministério da Economia responsável pela análise e concessão dos requerimentos a ela dirigidos.
Como é sabido, as patentes conferem aos seus titulares o direito de impedir que terceiros produzam, usem, coloquem à venda, vendam ou importem os produtos objeto de patente, bem como o processo ou produtos obtidos diretamente por processo patenteado (art. 42, I e II, da LPI). É também assegurado ao proprietário o direito de obstar que terceiros contribuam para que outros pratiquem tais atos (§ 1º do artigo precitado).
Assim é que, sob a perspectiva das recorridas, a utilização de sementes de soja contendo a tecnologia protegida pelas patentes, sem sua autorização, configura infração a seus direitos de propriedade intelectual.
5. DA DUPLA PROTEÇÃO. REGIMES JURÍDICOS DISTINTOS.
Um dos argumentos defendidos pelos recorrentes é o de que a Lei 9.456⁄97 veda, em seu art. 2º, a dupla proteção. As variedades vegetais, segundo argumentam, apenas podem ser protegidas pelas diretrizes nela contidas, excluída a incidência de qualquer outro instrumento legal.
Asseveram, nesse passo, que a aplicação desse diploma deve prevalecer sobre os ditames da Lei de Propriedade Industrial, o que garantiria aos sojicultores brasileiros, segundo o art. 10 da LPC, o direito de reservar sementes para replantio e comercialização como alimentos ou matéria-prima, ao mesmo tempo em que aos pequenos produtores rurais também seria permitido doar e trocar sementes dentro de programas oficiais específicos.
Importante consignar que as situações previstas no precitado artigo não têm correspondência no atual regime de proteção patentária instituído pela Lei 9.279⁄96.
É dizer, tais limitações, impostas ao direito do titular do Certificado de Proteção de Cultivar, por não estarem elencadas na LPI, não podem, automaticamente, ser aplicadas ao detentor de patentes, sob pena de restringir indevidamente os direitos que a lei lhe confere.
Deve-se notar que, tratando-se de controvérsia acerca do alcance de direitos de propriedade intelectual, é essencial haver, de fato, um direito devidamente reconhecido como tal pela autoridade competente, a fim de que se possa determinar o alcance de sua proteção.
No que concerne a variedades vegetais, conforme assentado linhas atrás, os direitos de proteção se efetivam mediante a concessão de Certificado de Proteção de Cultivar, expedido pelo Serviço Nacional de Proteção de Cultivares.
Assim, a primeira conclusão a que se poderia chegar é que, ausente notícia acerca da existência de tal certificado em favor das recorridas, não haveria sequer viabilidade jurídica de se analisar a questão sob a ótica da tutela de cultivares, uma vez que não cabe ao Poder Judiciário decidir, em abstrato, pela aplicação de um ou de outro diploma legal.
Consequentemente, as exceções previstas na lei específica, incluindo aquelas alegadas pelos recorrentes e conhecidas como privilégio do agricultor, não haveriam de irradiar seus efeitos na hipótese.
De todo modo, ainda que se reconhecesse a existência de direitos de propriedade intelectual sobre a soja Roundup Ready derivados também da Lei 9.456⁄97 (LPC), os argumentos dos recorrentes acerca da incidência exclusiva desse diploma legal à espécie não devem prosperar.
Patentes e proteção de cultivares, como visto, são diferentes espécies de direitos de propriedade intelectual, que objetivam proteger bens intangíveis distintos. Não há, por isso, incompatibilidade entre os estatutos legais que os disciplinam, tampouco prevalência de um sobre o outro, pois se trata de regimes jurídicos diversos e complementares, em cujos sistemas normativos inexistem proposições contraditórias a qualificar uma mesma conduta.
A marcante distinção existente entre um regime e outro compreende desde o objeto protegido – novas cultivares, pela LPC; processos e produtos biotecnológicos (microrganismos transgênicos), pela LPI – passando pelo alcance da proteção, pelas exceções oponíveis aos titulares dos direitos, pelos requisitos necessários à outorga da tutela jurídica, pelo órgão responsável pela análise e emissão do título protetivo, pelo prazo de duração do privilégio, dentre outros.
Não se pode negar, entretanto, que o art. 2º da LPC impede o que se convencionou chamar de dupla proteção. Segundo esse dispositivo, a proteção dos direitos relativos à propriedade intelectual referente a cultivar se efetua mediante a concessão de Certificado de Proteção de Cultivar, considerado bem móvel para todos os efeitos legais e única forma de proteção de cultivares e de direito que poderá obstar a livre utilização de plantas ou de suas partes de reprodução ou de multiplicação vegetativa, no País.
A existência dessa norma, como já delineado anteriormente, decorre diretamente da obrigação internacional assumida pelo Brasil ao ratificar a Ata de 1978 da União para a Proteção das Obtenções Vegetais, que proíbe os países membros de lhes conferir dupla proteção.
Isso quer dizer que uma mesma variedade vegetal não pode ser protegida simultaneamente por uma patente e por um direito sui generis, tal qual o direito de proteção de cultivares. De acordo com o art. 2, 1, da Convenção UPOV 1978, cada Estado da União pode reconhecer o direito do obtentor mediante a outorga de um título especial de proteção ou de uma patente. Porém, caso a legislação nacional admita a proteção em ambas as formas, deverá aplicar apenas uma delas a um mesmo gênero ou a uma mesma espécie botânica.
É exatamente esse o escopo da norma do art. 2º da LPC. Conforme explica DENIS BORGES BARBOSA, a proteção de uma variedade de planta por cultivar exclui a proteção do mesmo objeto por patente (Tratado de Propriedade Industrial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018, vol. IV, p. 234, sem destaque no original).
A lei proíbe, portanto, que a variedade vegetal – ou seja, o mesmo objeto – seja protegido também pela concessão de carta-patente.
Ocorre que, ao contrário do que defendem os recorrentes, o âmbito de proteção a que está submetida a tecnologia desenvolvida pelas recorridas não se confunde com o objeto da proteção prevista na Lei de Cultivares: as patentes não protegem a variedade vegetal, mas o processo de inserção e o próprio gene por elas inoculado na semente de soja.
DENIS BARBOSA elucida o ponto:
Ou, em outros termos, a proteção da propriedade intelectual na forma de cultivares (LPC) abrange o material de reprodução ou multiplicação vegetativa da planta inteira, enquanto o sistema da LPI protege, especificamente, o processo inventivo ou o material geneticamente modificado, sendo certo que processos de produção de plantas geneticamente modificadas são considerados patenteáveis, uma vez que não há restrição na LPI (PLAZA, Charlene Maria C. De Ávila. Exclusões de patentes do material genético – análises entre as Leis Nacional⁄Regional de Propriedade Intelectual. Revista Internacional de Direito Ambiental, Caxias do Sul (RS), v. 1, n. 2, p. 35-62, maio⁄ago. 2012).
Quanto ao ponto, parece oportuno esclarecer os conceitos de cultivar e de microrganismo transgênico, cada qual protegido por um estatuto jurídico distinto:
Cultivares
O Glossário de biotecnologia vegetal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento define cultivar como uma variedade cultivada de planta, a qual se distingue por características fenotípica e que, quando multiplicada por via sexual ou assexual, mantém suas características distintivas (Torres, Antonio Carlos et al. Brasília: Embrapa Hortaliças, 2000).
De acordo com o conceito trazido pela Lei 9.456⁄97, cultivares podem ser consideradas espécies de plantas sobre as quais foi realizada alguma melhoria, por meio da ação humana, que tenha resultado da alteração de alguma de suas características ou da introdução de características novas capazes de torná-las distintas de outras variedades da mesma espécie. Além de distintividade, devem apresentar homogeneidade e estabilidade.
O conceito técnico está previsto no art. 3º, IV, da LPC:
Microrganismos transgênicos
A LPI os conceitua como organismos (à exceção do todo ou parte de plantas e animais) que, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, expressem características normalmente não alcançáveis pela espécie em condições naturais. Eis a definição legal:
Na medida em que a lei veda o patenteamento do todo ou parte de seres vivos (art. 18, III, parte inicial, da LPI), tem-se que microrganismos transgênicos constituem os únicos elementos constitutivos de seres vivos que, pela lei brasileira, serão objeto de patente contendo reivindicação de produto (BARBOSA, Pedro M. N. e BARBOSA, Denis Borges. O Código da Propriedade Industrial conforme os Tribunais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017, vol. I, p. 259).
Ou, nos termos informados em material publicado pelo próprio INPI, a Lei 9.279, pelos comandos citados, estabelece um marco divisório nítido: nem plantas nem animais superiores são patenteáveis no Brasil; as tecnologias, porém, relacionadas à manipulação genética envolvendo microorganismos tornaram-se inequivocamente passíveis de patenteamento (e-STJ fl. 2699).
Definido, portanto, o objeto da proteção contida em cada diploma normativo, passa-se ao exame da pretensão dos recorrentes – não pagamento de royalties às recorridas nas hipóteses de reserva de sementes para replantio e comercialização como alimento ou matéria-prima e possibilidade de, tratando-se de pequenos agricultores, doar ou trocar sementes entre si – a partir das limitações legais previstas no art. 18, III, 42, II, e 43, VI, da LPI.
6. PRINCÍPIO DA EXAUSTÃO. REPRODUÇÃO DE SEMENTES QUE CONTÊM GENE E⁄OU PROCESSO PATENTEADO.
Uma vez concedida a patente, a LPI, em seu art. 42, garante ao titular o direito de impedir que terceiros façam uso do produto (inc. I) ou do processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado (inc. II).
Quanto à proteção conferida ao processo patenteado, DENIS BORGES BARBOSA enfatiza que, como em todos demais sistemas nacionais sob a regra de TRIPs, a patente de processo protege o produto resultante do processo; e não há qualquer vedação de patentes de processo de plantas ou animais (in Proposta para regular a intercessão patente⁄cultivar. Sem destaque no original. Disponível em www.denisbarbosa.addr.com⁄arquivos⁄200⁄economia⁄patente_cultivar.pdf).
A lição de CHARLENE PLAZA merece destaque:
Por outro lado, o art. 43 do mesmo diploma normativo estabelece diversos limites ao exercício dos direitos do titular. As limitações listadas em seus incisos consistem em verdadeira autorização para que terceiros utilizem o objeto da patente, independentemente de autorização, sem que se possa impedi-lo ou dele exigir qualquer contraprestação pecuniária.
No que interessa à hipótese, verifica-se que o inciso VI desse dispositivo afasta do espectro protetivo da lei, quando se tratar de patentes relacionadas com matéria viva – hipótese dos autos –, o uso de produto patenteado que haja sido introduzido licitamente no comércio por seu próprio detentor ou por seu licenciado.
É a positivação do que se convencionou chamar de princípio da exaustão:
Assim, em regra, uma vez que o adquirente tenha obtido o produto colocado licitamente no mercado, com o consentimento do titular, esgota-se o direito de patente sobre aquele produto específico e, via de consequência, não mais poderão ser opostas, dali em diante, a quem quer que seja, as vedações do art. 42 da LPI na futura exploração comercial do bem.
Todavia, e aqui reside ponto fundamental da presente controvérsia, a parte final do inc. VI do art. 43 da LPI expressamente prevê que não haverá exaustão na hipótese de o produto patenteado ser utilizado para multiplicação ou propagação comercial da matéria viva em causa.
A toda evidência, a opção legislativa foi a de deixar claro que a exaustão, quando se cuida de patentes relacionadas à matéria viva, atinge apenas a circulação daqueles produtos que possam ser enquadrados na categoria de matéria viva não reprodutível, circunstância que não coincide com o objeto da pretensão dos recorrentes.
O exemplo utilizado por BARBOSA e BARBOSA é esclarecedor:
NUNO PIRES DE CARVALHO ilustra a situação comentando julgado da Suprema Corte dos Estados Unidos:
Acerca do tema, vale também a leitura da exposição detalhada por CHARLENE PLAZA:
DENIS BARBOSA é categórico ao afirmar que a exaustão não se aplica, no Brasil, quando o produto patenteado seja utilizado para multiplicação ou propagação comercial da matéria viva em causa (Dois estudos sobre os aspectos jurídicos do patenteamento da tecnologia Roundup Ready no Brasil. PIDCC, Aracaju, Ano III, Edição 7⁄2014, Out⁄2014, p. 425).
Nessa linha intelectiva, entender que os agricultores representados pelos recorrentes possuem o direito de reservar o produto da soja RR (que contém tecnologia patenteada pelas recorridas) para replantio e posterior comercialização, bem como o de doar ou trocar essas sementes, equivale a esvaziar o conteúdo normativo do dispositivo em questão, tornando-o letra morta, o que se revela inadmissível do ponto de vista técnico-jurídico.
7. CONCLUSÕES: PROTEÇÃO DOS DIREITOS DO INVENTOR EM FUNÇÃO DO DESENVOLVIMENTO DE PROCESSO OU PRODUTO RELACIONADO À TRANSGENIA.
De tudo o que foi até aqui exposto, é possível extrair-se algumas conclusões.
Como as patentes em questão foram concedidas em razão da inserção de um gene que conferiu à planta uma função distinta da que naturalmente possuía, os direitos do titular do privilégio vão incidir sobre o atributo inoculado (que confere resistência ao glifosato) e, via de consequência, tendo a planta sido reproduzida e a nova geração conservado tal atributo, sobre ele também devem se projetar os direitos de exclusiva.
Os possíveis desdobramentos do alcance da proteção são esmiuçados por BRUCH, VIEIRA E DEWES:
Ou, na lição de PLAZA e CARRARO, pela regra do art. 42, inciso II, da Lei nº 9.279⁄96, tem-se que um titular de patente de invenção, cuja proteção abarca novo atributo de uma planta, tal como um gene com nova função, tem o direito de explorar com exclusividade essa planta no Brasil ou vedar que terceiros a utilizem comercialmente, sem sua autorização (PLAZA, Charlene Maria C. de Ávila e CARRARO, Fábio. Propriedade Intelectual – patentes e cultivares. In Propriedade intelectual na agricultura. Coord.: PLAZA, DEL NERO, TARREGA e SANTOS. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 131).
Sobreleva consignar que o afastamento dos direitos conferidos aos titulares de patentes devidamente concedidas – como objetivam os recorrentes – teria aptidão para, além de malferir as disposições de direito interno consubstanciadas na LPI, frustrar compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito da Organização Mundial do Comércio, pois resultaria em descumprimento do quanto estabelecido no art. 28, 1, do Acordo TRIPs, que estipula as garantias asseguradas ao inventor.
O privilégio do agricultor previsto na LPC, portanto, não é oponível ao titular de patentes de produto e⁄ou processo na hipótese de ser utilizada a matéria viva a elas relacionada para fins de multiplicação ou propagação comercial, pois não se trata de limitação estabelecida aos direitos tutelados pelo regime jurídico sobre o qual está assentado o sistema de patentes adotado pelo Brasil.
A tese defendida pelos recorrentes parte de um pressuposto manifestamente equivocado: o de querer fazer incidir às recorridas, titulares de direitos garantidos por cartas-patentes, as limitações previstas, exclusivamente, a detentores de certificados de proteção de cultivares.
De se referir, outrossim – o que corrobora a ausência de previsão no ordenamento jurídico vigente acerca das limitações postuladas pelas recorrentes sobre os direitos de propriedade intelectual das recorridas –, a existência de estudos, elaborados por doutrinadores especialistas na área, por meio dos quais se propõe, justamente, que a LPI seja modificada para que se faça nela constar normas restritivas que deem suporte a reivindicações como as aqui deduzidas.
É o caso dos seguintes artigos, de lavra, respectivamente, do Professor DENIS BORGES BARBOSA e da Professora CARLA EUGENIA CALDA BARROS: Proposta para regular a intercessão patente⁄cultivar (disponível em www.denisbarbosa.addr.com⁄arquivos⁄200⁄economia⁄patente_cultivar.pdf) e A sobreposição dos direitos de propriedade intelectual em biotecnologia: patentes e cultivares. Modificações dos artigos 43 e 70 da Lei 9.279, de 14 de maio de 1996 (In Proteção Jurídica para as Ciências da Vida: Propriedade Intelectual e Biotecnologia. IBPI, 2012, pp. 81⁄172).
A pretensão dos recorrentes, portanto, exigiria inovações normativas de lege ferenda.
A título de consideração final, impõe-se assentar que, muito embora a adoção em larga escala do cultivo de plantas modificadas por meio de transgenia venha acompanhada de uma série de questionamentos de natureza econômica, social, ambiental, alimentar e político-ideológica, o Poder Judiciário – sobretudo em sede de recurso de fundamentação vinculada, versando sobre questões restritas ao âmbito de sistemas protetivos de direitos de propriedade intelectual – não constitui a arena adequada para o enfrentamento dessas questões, não podendo elas servirem como condicionantes das razões de decidir do julgador.
No que concerne à alegação usualmente feita de que os direitos de propriedade intelectual criam monopólios, ainda que temporários, é importante lembrar que existem sensíveis diferenças entre seus efeitos e o funcionamento da proteção à propriedade intelectual (quanto à matéria, confira-se o estudo conduzido por ROBERT M. SHERWOOD, in Propriedade intelectual e desenvolvimento econômico. São Paulo: EDUSP, 1992).
Segundo SHERWOOD (op. cit., pp. 60⁄62), a propriedade intelectual, como explanado no decorrer deste voto em relação às patentes, cria, tão somente, o direito de impedir⁄excluir terceiros do uso de um produto ou processo específico. O monopólio, por outro lado, se relaciona à capacidade de excluir qualquer produto ou processo de um determinado mercado, sendo notório que, no caso dos autos, a soja com a tecnologia patenteada pelas recorridas não se trata de produto que equivalha à totalidade do mercado brasileiro desse grão. De um lado, o Registro Nacional de Cultivares do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (RNC) aponta, em 11⁄4⁄2019, mais de duas mil ocorrências para cultivares de soja; de outro, DENIS BARBOSA informa que haveria pelo menos 75 cultivares com características de serem resistentes ao glifosato, mas este número compreende variedades que não são da Monsanto (Dois estudos sobre os aspectos jurídicos do patenteamento da tecnologia Roundup Ready no Brasil. PIDCC, Aracaju, Ano III, Edição 7⁄2014, Out⁄2014, p. 431).
Ainda que se assuma como premissa que um novo mercado possa surgir como mera consequência de um único invento protegido, o que sucede é que o acesso a ele não estaria vedado senão em razão de deficiências técnicas, atribuíveis aos próprios potenciais competidores, em desenvolver produtos dotados de capacidade concorrencial. As barreiras à entrada nesse mercado não decorreriam, substancialmente, da proteção à propriedade intelectual.
Caso se tratasse, ao contrário, de um verdadeiro monopólio, mesmo que fossem envidados esforços de pesquisa e desenvolvimento que resultassem na criação de um produto ou processo competitivo, seria, por definição, impossível inseri-los no mercado, independentemente da proteção a direitos de propriedade intelectual.
Novamente, a doutrina de SHERWOOD é esclarecedora:
Não se pode, outrossim, cogitar da utilização, pelo Judiciário, do regime legal de proteção à propriedade intelectual para, por via indireta, corrigir eventuais imperfeições concernentes ao funcionamento do mercado. Resultados nesse sentido devem ser buscados na esfera própria destinada à defesa da concorrência e da ordem econômica, sob pena de se impor ao sistema de patentes uma função que não lhe cabe.
De se consignar, pode derradeiro, que, conforme destacado no acórdão recorrido, nada impedia que os agricultores representados pelos recorrentes empregassem a soja convencional em seus plantios, sem o custo relacionado a royalties ou taxa tecnológica; mas, a partir do momento em que optaram pelo cultivo de sementes modificadas por meio de invenção patenteada, inafastável o dever de contraprestação pela tecnologia utilizada. Se escolheram fazer uso desta variedade específica, é porque lhes pareceu economicamente vantajoso, devendo arcar com as consequências dessa opção.
8. TESE FIRMADA PARA EFEITO DO ART. 947 DO CPC⁄15
A tese a ser firmada, portanto, para efeito do art. 947 do CPC⁄15, é a seguinte: as limitações ao direito de propriedade intelectual constantes do art. 10 da Lei 9.456⁄97 – aplicáveis tão somente aos titulares de Certificados de Proteção de Cultivares – não são oponíveis aos detentores de patentes de produto e⁄ou processo relacionados à transgenia cuja tecnologia esteja presente no material reprodutivo de variedades vegetais.
9. CONCLUSÃO DA HIPÓTESE CONCRETA
Forte nessas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.
Número Registro: 2016⁄0171099-9 | PROCESSO ELETRÔNICO |
REsp 1.610.728 ⁄ RS |
PAUTA: 12⁄06⁄2019 | JULGADO: 12⁄06⁄2019 |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SERTÃO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SANTIAGO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO |
RECORRENTE | : | FEDERACAO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA NO RIO GRANDE DO SUL |
ADVOGADOS | : | DENIS BORGES BARBOSA E OUTRO (S) - RJ023865 |
NERI PERIN E OUTRO (S) - RS025883 | ||
JANE LÚCIA WILHELM BERWANGER - RS046917 | ||
RAUL MURAD RIBEIRO DE CASTRO - RJ162384 | ||
LIVIA BARBOZA MAIA E OUTRO (S) - RJ182505 | ||
FERNANDA FERNANDES DA SILVA - RJ195640 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO CO |
ADVOGADOS | : | GOMERCINDO LINS COITINHO E OUTRO (S) - RS002743 |
ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO DO BRASIL LTDA |
ADVOGADOS | : | ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 |
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
CARINE PIGATTO TERMIGNONI - RS048110 | ||
IVO GABRIEL CORRÊA DA CUNHA E OUTRO (S) - RS003999 | ||
RAMIRO CORRÊA DA CUNHA - RS062264 | ||
BIBIANA DA SILVA OLIVEIRA BOTTIN CAYE - RS078887 | ||
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE GIRUÁ |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE ARVOREZINHA |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE JATAÍ |
ADVOGADO | : | JOÃO RAFAEL DAL MOLIM E OUTRO (S) - RS050489 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO DOS AGRICULTORES DE DOM PEDRITO |
ADVOGADO | : | ANDERSON RICARDO LEVANDOWSKI BELLOLI - RS081110 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SEMENTES E MUDAS - ABRASEM |
ADVOGADOS | : | DANIEL USTÁRROZ E OUTRO (S) - RS051548 |
ANTONIO JANYR DALL AGNOL JUNIOR E OUTRO (S) - RS005693 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - DF022224 | ||
INTERES. | : | AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA |
ADVOGADOS | : | ADMA PEDRO DIAMENTI - SP329928 |
PATRICIA FUKUMA JANNINI E OUTRO (S) - SP107635 | ||
FLAVIA DANIELA TOLEDO ANTONANZAS - SP273821 | ||
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS E CONSUMIDORES - ABMC |
ADVOGADO | : | ROBERTO SOLIGO - MS002464 |
INTERES. | : | INSTITUTO BRASILEIRO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL |
ADVOGADOS | : | NEWTON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP015842 |
WILSON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP024798 | ||
INTERES. | : | ABPI ASSOCIACAO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE" |
ADVOGADOS | : | LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ046214 |
RODRIGO AFFONSO DE OURO PRETO SANTOS - RJ079659 | ||
INTERES. | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL |
1 - Dr. NERI PERIN, pelo RECORRENTE SINDICATO RURAL DE SERTÃO e Outros;
2 - Dr. PEDRO MARCOS NUNES BARBOSA, pelo RECORRENTE SINDICATO RURAL DE SERTÃO e Outros;
3 - Dra. ANNA CHRISTINA SILVEIRA BERNARDI, pelo AMICUS CURIAE IBPI - Instituto Brasileiro de Propriedade Intelectual;
4 - Dr. LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL, pela RECORRIDA MONSANTO DO BRASIL LTDA; e
5 - Dra. PATRICIA FUKUMA JANNINI, pelo AMICUS CURIAE AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA.
Número Registro: 2016⁄0171099-9 | PROCESSO ELETRÔNICO |
REsp 1.610.728 ⁄ RS |
PAUTA: 09⁄10⁄2019 | JULGADO: 09⁄10⁄2019 |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SERTÃO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SANTIAGO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO |
RECORRENTE | : | FEDERACAO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA NO RIO GRANDE DO SUL |
ADVOGADOS | : | DENIS BORGES BARBOSA E OUTRO (S) - RJ023865 |
NERI PERIN E OUTRO (S) - RS025883 | ||
JANE LÚCIA WILHELM BERWANGER - RS046917 | ||
RAUL MURAD RIBEIRO DE CASTRO - RJ162384 | ||
LIVIA BARBOZA MAIA E OUTRO (S) - RJ182505 | ||
FERNANDA FERNANDES DA SILVA - RJ195640 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO CO |
ADVOGADOS | : | GOMERCINDO LINS COITINHO E OUTRO (S) - RS002743 |
ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO DO BRASIL LTDA |
ADVOGADOS | : | ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 |
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
CARINE PIGATTO TERMIGNONI - RS048110 | ||
IVO GABRIEL CORRÊA DA CUNHA E OUTRO (S) - RS003999 | ||
RAMIRO CORRÊA DA CUNHA - RS062264 | ||
BIBIANA DA SILVA OLIVEIRA BOTTIN CAYE - RS078887 | ||
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE GIRUÁ |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE ARVOREZINHA |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE JATAÍ |
ADVOGADO | : | JOÃO RAFAEL DAL MOLIM E OUTRO (S) - RS050489 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO DOS AGRICULTORES DE DOM PEDRITO |
ADVOGADO | : | ANDERSON RICARDO LEVANDOWSKI BELLOLI - RS081110 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SEMENTES E MUDAS - ABRASEM |
ADVOGADOS | : | DANIEL USTÁRROZ E OUTRO (S) - RS051548 |
ANTONIO JANYR DALL AGNOL JUNIOR E OUTRO (S) - RS005693 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - DF022224 | ||
INTERES. | : | AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA |
ADVOGADOS | : | ADMA PEDRO DIAMENTI - SP329928 |
PATRICIA FUKUMA JANNINI E OUTRO (S) - SP107635 | ||
FLAVIA DANIELA TOLEDO ANTONANZAS - SP273821 | ||
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS E CONSUMIDORES - ABMC |
ADVOGADO | : | ROBERTO SOLIGO - MS002464 |
INTERES. | : | INSTITUTO BRASILEIRO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL |
ADVOGADOS | : | NEWTON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP015842 |
WILSON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP024798 | ||
INTERES. | : | ABPI ASSOCIACAO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE" |
ADVOGADOS | : | LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ046214 |
RODRIGO AFFONSO DE OURO PRETO SANTOS - RJ079659 | ||
INTERES. | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL |
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SERTÃO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE SANTIAGO |
RECORRENTE | : | SINDICATO RURAL DE PASSO FUNDO |
RECORRENTE | : | FEDERACAO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA NO RIO GRANDE DO SUL |
ADVOGADOS | : | DENIS BORGES BARBOSA E OUTRO (S) - RJ023865 |
NERI PERIN E OUTRO (S) - RS025883 | ||
JANE LÚCIA WILHELM BERWANGER - RS046917 | ||
RAUL MURAD RIBEIRO DE CASTRO - RJ162384 | ||
LIVIA BARBOZA MAIA E OUTRO (S) - RJ182505 | ||
FERNANDA FERNANDES DA SILVA - RJ195640 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO CO |
ADVOGADOS | : | GOMERCINDO LINS COITINHO E OUTRO (S) - RS002743 |
ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
RECORRIDO | : | MONSANTO DO BRASIL LTDA |
ADVOGADOS | : | ROBERTO FERREIRA ROSAS E OUTRO (S) - DF000848 |
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - RJ061424 | ||
LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA DO AMARAL - RJ052759 | ||
CARINE PIGATTO TERMIGNONI - RS048110 | ||
IVO GABRIEL CORRÊA DA CUNHA E OUTRO (S) - RS003999 | ||
RAMIRO CORRÊA DA CUNHA - RS062264 | ||
BIBIANA DA SILVA OLIVEIRA BOTTIN CAYE - RS078887 | ||
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE GIRUÁ |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE ARVOREZINHA |
ADVOGADO | : | NERI PERIN - RS025883 |
INTERES. | : | SINDICATO RURAL DE JATAÍ |
ADVOGADO | : | JOÃO RAFAEL DAL MOLIM E OUTRO (S) - RS050489 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO DOS AGRICULTORES DE DOM PEDRITO |
ADVOGADO | : | ANDERSON RICARDO LEVANDOWSKI BELLOLI - RS081110 |
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SEMENTES E MUDAS - ABRASEM |
ADVOGADOS | : | DANIEL USTÁRROZ E OUTRO (S) - RS051548 |
ANTONIO JANYR DALL AGNOL JUNIOR E OUTRO (S) - RS005693 | ||
MARCOS VELASCO FIGUEIREDO E OUTRO (S) - DF022224 | ||
INTERES. | : | AGROBIO - ASSOCIAÇÃO DE EMP BIOTECNOLOGIA AGRICULTURA AGROINDÚSTRIA |
ADVOGADOS | : | ADMA PEDRO DIAMENTI - SP329928 |
PATRICIA FUKUMA JANNINI E OUTRO (S) - SP107635 | ||
FLAVIA DANIELA TOLEDO ANTONANZAS - SP273821 | ||
INTERES. | : | ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS E CONSUMIDORES - ABMC |
ADVOGADO | : | ROBERTO SOLIGO - MS002464 |
INTERES. | : | INSTITUTO BRASILEIRO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL |
ADVOGADOS | : | NEWTON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP015842 |
WILSON SILVEIRA E OUTRO (S) - SP024798 | ||
INTERES. | : | ABPI ASSOCIACAO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE" |
ADVOGADOS | : | LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ046214 |
RODRIGO AFFONSO DE OURO PRETO SANTOS - RJ079659 | ||
INTERES. | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL |
Documento: XXXXX | Inteiro Teor do Acórdão | - DJe: 14/10/2019 |