6 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Publicado por Superior Tribunal de Justiça
Detalhes da Jurisprudência
Processo
REsp 1139401 RS 2009/0088576-2
Órgão Julgador
T3 - TERCEIRA TURMA
Publicação
DJe 05/12/2012 RMDCPC vol. 51 p. 117
Julgamento
18 de Setembro de 2012
Relator
Ministra NANCY ANDRIGHI
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Inteiro Teor
Superior Tribunal de Justiça Revista Eletrônica de Jurisprudência |
RECURSO ESPECIAL Nº 1.139.401 - RS (2009⁄0088576-2)
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | V DA L R E OUTRO |
ADVOGADO | : | LEANDRA SOARES TEIXEIRA |
RECORRIDO | : | R P R |
ADVOGADO | : | RAUL ROTTA DE OLIVEIRA E OUTRO (S) |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. VERBAS PRETÉRITAS. NATUREZA ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES EXEQUENDAS QUE NÃO SE ALTERA COM O DECURSO DO TEMPO. PENHORABILIDADE DO SOLDO DO DEVEDOR.
1. O caráter absoluto da impenhorabilidade dos vencimentos, soldos e salários (dentre outras verbas destinadas à remuneração do trabalho) é excepcionado pelo § 2º do art. 649 do CPC - aplicável às execuções que tramitam sob o rito do art. 732 da lei processual civil - quando se tratar de penhora para pagamento de prestações alimentícias.
2. A natureza do crédito alimentar, que constitui verba destinada à satisfação das necessidades de quem não pode com elas arcar, não se transmuda com o mero decurso do tempo. Precedente.
3. Não admitir a constrição de verbas salariais, por efeito do lapso temporal já transcorrido desde o não pagamento da dívida de alimentos, resulta em inaceitável premiação à recalcitrância do devedor inadimplente.
4. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do (a) Sr (a). Ministro (a) Relator (a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 18 de setembro de 2012 (Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
RECURSO ESPECIAL Nº 1.139.401 - RS (2009⁄0088576-2)
RECORRENTE | : | V DA L R E OUTRO |
ADVOGADO | : | LEANDRA SOARES TEIXEIRA |
RECORRIDO | : | R P R |
ADVOGADO | : | RAUL ROTTA DE OLIVEIRA E OUTRO (S) |
Relatora: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso especial interposto por V. DA L. R. E OUTRO, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional.
Ação: embargos à execução de verbas alimentares (em trâmite pelo rito do art. 732 do CPC), opostos por R. P. R. em face dos recorrentes, devido à constrição de verba salarial.
Sentença: rejeitou os embargos.
Acórdão: deu provimento à apelação interposta pelo recorrido, para afastar a penhora incidente sobre parte de seu soldo.
Recurso especial: alega violação do art. 649, § 2º, do CPC. Sustenta, em síntese, que o salário é passível de penhora na hipótese de pagamento de prestação alimentícia. Afirma que a lei processual não faz "exceção quanto a alimentos atuais, futuros ou pretéritos. Apenas refere-se a alimentos"(e-STJ, fl. 75).
Decisão de admissibilidade: o TJ⁄RS admitiu o recurso especial e determinou a remessa dos autos a este Superior Tribunal.
Parecer do MPF: o i. Subprocurador-Geral da República, Washington Bolívar Júnior, opinou pelo provimento do recurso especial.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.139.401 - RS (2009⁄0088576-2)
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | V DA L R E OUTRO |
ADVOGADO | : | LEANDRA SOARES TEIXEIRA |
RECORRIDO | : | R P R |
ADVOGADO | : | RAUL ROTTA DE OLIVEIRA E OUTRO (S) |
Relatora: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
VOTO
Cinge-se a controvérsia a determinar se são penhoráveis, em execução de prestação alimentícia ajuizada pelo rito do art. 732 2 do CPC C, parte das verbas salariais percebidas pelo recorrido.
O art. 649 9 do CPC C, em seuparagrafo 2ºº, excepciona o caráter absoluto da impenhorabilidade dos vencimentos, soldos e salários (dentre outras verbas destinadas à remuneração do trabalho) quando se tratar de pagamento de prestações alimentícias.
Na hipótese, a despeito dessa disposição legal expressa, o TJ⁄RS afastou a constrição - determinada pelo Juiz de primeiro grau para garantia da execução de verba alimentar - de parte do soldo percebido pelo recorrido, sob o fundamento de que, "sendo caso de dívida alimentar não revestida de atualidade e executada sob o rito da quantia certa, resta afastado o caráter alimentar, não sendo aplicável a exceção prevista no § 2ºº do artigo 649 9, IV, do Código de Processo Civil l, que deve ser interpretado restritivamente"(e-STJ, fl. 63).
Em primeiro lugar, o argumento de que a exceção à impenhorabilidade das verbas salariais não se aplica à espécie em razão de o processo tramitar sob o rito da execução por quantia certa contra devedor solvente não reúne condições de subsistir.
Isso porque, ao se proceder à análise topológica do art. 649 9 do CPC C, verifica-se que o dispositivo legal está inserido justamente no capítulo que trata dessa modalidade de execução (capítulo IV do título II do livro II: da execução por quantia certa contra devedor solvente).
Desse modo, no ponto, não há como se admitir, porque manifestamente descabida, a interpretação conferida ao § 2º do art. 649 do CPC pelo acórdão recorrido.
Em segundo lugar, o fato de a dívida exequenda ter sido considerada pretérita pelo Tribunal de origem não tem o condão de abolir seu caráter alimentar.
No que se refere ao tema, o professor Sérgio Gilberto Porto esclarece que não é "o envelhecimento da dívida que muda a natureza do crédito, eis que este, longe de dúvida, tem origem, exatamente, na espécie da obrigação que lhe dá nascimento" (PORTO, Sérgio Gilberto. Doutrina e Prática dos Alimentos, 3ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 98-9).
Rememoro que a Quarta Turma desta Corte, por ocasião do julgamento do RHC 9.718⁄MG, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 18⁄09⁄2000, também manifestou entendimento nesse sentido.
Logo, impõe-se assentar a premissa de que a natureza do crédito alimentar, que constitui verba destinada à satisfação das necessidades de quem não pode com elas arcar, não se transmuda com o mero decurso do tempo.
Na realidade, ao contrário do que resulta das conclusões da decisão impugnada, em hipóteses como a presente - partindo-se da constatação de que quanto maior o período de inadimplemento da prestação alimentícia, maiores e mais graves as consequências suportadas por quem dela necessita -, entendo que mais incisivas e efetivas deveriam ser as medidas tendentes à concretização do direito do credor.
Ademais, não admitir a constrição de verbas salariais, por efeito do lapso temporal já transcorrido desde o não pagamento da dívida de alimentos, resulta em inaceitável premiação à recalcitrância do devedor inadimplente.
Conclui-se, diante desse contexto, que não se afigura razoável interpretar a norma do § 2º do art. 649 do CPC em detrimento da efetividade da execução, sobretudo em razão da relevância de seu objeto.
Assim, na hipótese, à vista do reconhecimento da natureza alimentar do crédito exequendo, bem como da preponderância dos interesses do credor na execução de prestações alimentícias, merece reforma o acórdão recorrido.
Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, para restabelecer a sentença que desacolheu os embargos opostos pelo recorrido.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.139.401 - RS (2009⁄0088576-2)
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | V DA L R E OUTRO |
ADVOGADO | : | LEANDRA SOARES TEIXEIRA |
RECORRIDO | : | R P R |
ADVOGADO | : | RAUL ROTTA DE OLIVEIRA E OUTRO (S) |
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO MASSAMI UYEDA (Relator):
Sr. Presidente, na verdade – não sei se os eminentes Ministros estão lembrados – chego a ir além, porque a impenhorabilidade de salários é uma restrição não absoluta. Já houve – em casos que decidi, em que uma dívida civil era uma dívida de cheque especial, a pessoa era correntista e recebia salários na conta corrente – por parte do credor, o Banco, um apossamento do dinheiro que estava depositado.
Eu acabei dizendo, em um voto até bem ousado, assim: "É certo que a dicção da Constituição é que os salários são impenhoráveis pela sua natureza alimentar, mas isso temos que olhar com certa reserva, porque, na verdade, salário também é a fonte primeira de extinção de obrigações".
Então, se a pessoa se escudar, sob a alegação de que seu salário não pode ser penhorado, não pagará dívida nenhuma. E a questão que decorre disso é quanto pode ser fixado, qual o limite de cada um.
Fiz uma analogia de um voto que tenho que, se o instituto dos alimentos, que é Direito de Família – não há uma regra fixa que determine ao Juiz que, ao fixar liminarmente os alimentos, o faça –, mas é comum os Magistrados de Família fixarem em um terço do rendimento. Mas, como também o Sr. Ministro Sidnei Beneti foi Juiz de Família, assim como eu, são certas situações que têm que ser vistas casuisticamente porque, normalmente, é uma pessoa de baixa renda, que ganha um salário mínimo, deixa o filho que teve com a esposa e, em razão disso, em uma nova união gera mais filhos. Se se fixar um terço do vencimento do salário em favor daquele primeiro filho, veste mal essa criança e desveste as demais. Então, como Juiz de Família, eu ficava olhando casuisticamente: às vezes um terço, às vezes menos, às vezes mais.
No tocante a isso, estabeleci a seguinte analogia: considerando que o salário, por sua natureza, é impenhorável, essa impenhorabilidade constitucional também não é absoluta, porque não há direitos absolutos. Ele é a fonte de extinção das obrigações. Sendo assim, como calibrar? Então, se não posso também calibrar em um terço porque a pessoa tem outros compromissos, é preciso que se dê, então, pela proporção entre o que ganha e o que está devendo: teria que ser feito um parcelamento de 5, 10%, mas de tal sorte que tenha que também contribuir para a extinção da obrigação porque, senão, seria muito fácil a qualquer um de nós, que somos assalariados, em última análise, contrairmos débitos, sermos executados e, não tendo outros bens, impenhorável seria o salário. Então, é mais ou menos essa conciliação.
Mas, aqui no caso, com esse precedente da Sra. Ministra Nancy Andrighi, já também calcado em juízo estrito de justiça e legalidade, já está se quebrando esse absolutismo da impenhorabilidade constitucional, em termos.
Estou de acordo com a Sra. Ministra Relatora no sentido de dar provimento ao recurso especial, apenas fazendo essa observação.
Ministro MASSAMI UYEDA
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2009⁄0088576-2 | PROCESSO ELETRÔNICO | REsp 1.139.401 ⁄ RS |
Números Origem: 10300053443 10700018769 28011 70025741323 70027800804
PAUTA: 18⁄09⁄2012 | JULGADO: 18⁄09⁄2012 |
SEGREDO DE JUSTIÇA |
Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO DE PAULA CARDOSO
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE | : | V DA L R E OUTRO |
ADVOGADO | : | LEANDRA SOARES TEIXEIRA |
RECORRIDO | : | R P R |
ADVOGADO | : | RAUL ROTTA DE OLIVEIRA E OUTRO (S) |
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Família - Alimentos
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do (a) Sr (a). Ministro (a) Relator (a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Documento: 1179314 | Inteiro Teor do Acórdão | - DJe: 05/12/2012 |