13 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça STJ - HABEAS CORPUS: HC XXXXX SP 2014/XXXXX-6 - Decisão Monocrática
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
Relator
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Decisão Monocrática
Superior Tribunal de Justiça
HABEAS CORPUS Nº 301.135 - SP (2014/XXXXX-6)
RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
ADVOGADO : GIANCARLO SILKUNAS VAY
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : J C P C (INTERNADO)
DECISÃO
J. C. P. C. , paciente neste habeas corpus, estaria sofrendo coação ilegal em seu direito de locomoção, em face de decisão proferida por Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, que indeferiu a liminar do Agravo de Instrumento n. XXXXX-78.2014.8.26.0000, por meio da qual se pretendia a concessão de efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto pela defesa.
Depreende-se dos autos que foi aplicada medida socioeducativa de internação ao paciente, pela prática de ato infracional equiparado ao crime previsto no artigo 157, § 2º, I e II, do Código Penal.
A impetrante, Defensoria Pública, sustenta a ocorrência de constrangimento ilegal, ao argumento de que "a decisão combatida, ao não conceder o efeito suspensivo ao recurso de apelação, mantém o paciente no cumprimento de medida socioeducativa, apesar de não ter transitado em julgado a decisão que lhe condenou" (fl. 3).
Sustenta que "não existe qualquer comando expresso que faça diferenciação entre uma sentença em processo socioeducativo e qualquer outra afeta à Justiça da infância e juventude. Assim sendo, em uma análise literal, não há qualquer razão para que o julgador confira tratamento diferenciado no momento de receber uma apelação de adolescente condenado em 1ª instância por ato infracional, ou referente à destituição do poder familiar. Cabe ao julgador observar o art. 198, caput, do ECA que remete ao art. 520 do CPC e, assim, receber a apelação nos efeitos devolutivo e suspensivo" (fl. 6).
Pontua que "a utilização do argumento de que '(ii) o princípio da intervenção precoce na vida do adolescente' (art. 100, p. ún., VI, ECA) justificaria o cumprimento imediato da medida, também não procede, uma vez que diz mais respeito à aplicação de medidas protetivas do que socioeducativas" (fls. 9/10).
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Aduz, outrossim, que o argumento de que "(iv) a aplicação de medida socioeducativa em adolescente que no curso do processo foi internado provisoriamente seria uma confirmação dos efeitos da antecipação de tutela, ao que se justificaria excepcionar a regra do art. 520, caput, do CPC em razão do seu inciso VII', também não se sustenta" (fl. 14).
Nesse contexto, argui ser "absolutamente descabida qualquer tentativa de associar o cumprimento da internação provisória com antecipação de pena" (fl. 17).
Requer, liminarmente, a concessão da ordem, "para que os pacientes não sejam compelidos a cumprir medida socioeducativa enquanto aguarda o julgamento final do presente Habeas Corpus, expedindo-se o competente alvará de soltura para que os adolescentes sejam imediatamente colocados em liberdade " (fl. 23, sic).
Decisão .
Da análise dos autos, ao menos em um juízo de cognição sumária, não vislumbro manifesto constrangimento ilegal a ensejar o deferimento da medida de urgência.
Dos documentos trazidos à colação, verifico que foi aplicada medida socioeducativa de internação ao paciente, pela prática de ato infracional equiparado ao crime previsto no artigo 157, § 2º, I e II, do Código Penal.
Contra essa sentença foi interposta apelação pela defesa, tendo a juíza singular recebido o recurso apenas no efeito devolutivo , "entendimento cabível, não obstante o advento da Lei nº 12.010/09, notadamente nas hipóteses relacionadas à prática de atos infracionais" (fl. 53).
Irresignada, a defesa interpôs agravo de instrumento, com pedido liminar, por meio do qual requereu que o recurso de apelação fosse recebido também em seu efeito suspensivo, assegurando ao paciente que pudesse aguardar em liberdade o trânsito em julgado, em observância ao princípio constitucional da presunção de não culpabilidade.
A liminar, no entanto, foi indeferida, em decisão assim fundamentada (fls. 79/80):
[...]
No âmbito da principiologia da legislação estatutária, as medidas socioeducativas têm natureza eminentemente
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protetiva, objetivando a ressocialização do adolescente em risco, conferindo-lhe a oportunidade do acompanhamento psicológico, social e pedagógico necessários à sua adequada recuperação e desenvolvimento.
A paralisação do cumprimento da medida de internação pela concessão do efeito suspensivo almejado pela Defesa implicaria despojar o agravante do azo socioeducativo, mantendo-se inalterada a situação que o levou à prática da infração; o que contraria o princípio da proteção integral, que reclama ação imediata e célere, na medida em que a intervenção estatal necessária, nesse caso, se daria tardiamente; ineficaz, portanto, na reeducação do adolescente. Por tais razões, INDEFIRO o pedido de antecipação da tutela recursal.
Cuida-se de discussão acerca da possibilidade de ser a apelação recebida também no efeito suspensivo, nos processos relativos à execução de medida socioeducativa , previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990).
Primeiramente, em que pese haver a Lei 12.010/2009 revogado o inciso VI do artigo 198 do referido Estatuto, que conferia apenas o efeito devolutivo ao recebimento dos recursos, continua a viger o disposto no artigo 215 do ECA , o qual dispõe que “ o juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irreparável à parte ”. Lógico inferir, portanto, que os recursos serão, em regra, recebidos apenas no efeito devolutivo, inclusive e principalmente os recursos contra sentença que acolheu a representação do Ministério Público e impôs medida socioeducativa ao adolescente infrator.
Releva enfatizar que, cuidando-se de medida socioeducativa, a intervenção do Poder Judiciário tem como missão precípua não a punição pura e simples do adolescente em conflito com a lei, mas sim a recuperação e a proteção do jovem infrator .
Sob essa perspectiva, há de ser, portanto, analisada a situação processual do paciente, não servindo à fattispecie o raciocínio empreendido, posto que de modo proficiente, pelo impetrante, ao defender, para o paciente, a incidência da mesma lógica que permeia a persecução penal comum, desconsiderando, todavia, que, diferentemente do que se dá em relação à justiça menorista, apoiada em bases peculiares, a justiça criminal se alicerça sobre regras que visam, fundamentalmente, a proteger o acusado contra ingerências abusivas do Estado em sua liberdade .
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Não se mostra, destarte, acertado o raciocínio que postula modificação no entendimento já consagrado na doutrina e na jurisprudência, segundo o qual o recurso contra a sentença que impõe medida socioeducativa ao adolescente possui efeito meramente devolutivo, apenas porque houve modificação legislativa indireta, a saber, a revogação, pela Lei n. 12.010/2009, do inciso que fazia alusão aos efeitos dos recursos de sentenças proferidas em sede de juizados da infância e juventude.
Ademais, pela simples leitura dos dispositivos da Lei n. 12.010/2009, se percebe que todos os seus dispositivos dizem respeito ao processo de adoção, o que permite inferir, induvidosamente, que, ao revogar o inciso VI do artigo 198 do ECA – que também tratava de recursos contra sentenças cíveis – não foi, sequer em hipótese, imaginado pelo legislador que tal modificação se aplicaria a processos por ato infracional , que nada têm a ver com processos de adoção de crianças e adolescentes.
Se é verdade que o artigo 198, inciso VI, do ECA não mais existe no mundo jurídico, a repercussão jurisprudencial dessa mutatio legis parece ser inexistente, tamanha a evidência de que a nova lei não veio para interferir em processos por ato infracional, mas apenas em processos cíveis, sobretudo nos de adoção .
É certo que, quando da imposição da medida socioeducativa, o magistrado não restringe sua análise apenas ao ato infracional praticado isoladamente, mas, principalmente, leva em consideração as demais circunstâncias que permearam a conduta infracional, bem como a proteção integral ao adolescente em conflito com a lei.
Diante de todas essas circunstâncias, não me afigura ser o caso de concessão de efeito suspensivo à apelação interposta perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
À vista do exposto, indefiro a liminar.
Solicitem-se informações ao Juízo da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Santo André/SP, encarecendo o envio dos elementos indispensáveis à análise do alegado na impetração.
Após, encaminhem-se os autos ao Ministério Público Federal para manifestação.
Publique-se. Intimem-se.
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Brasília (DF), 13 de agosto de 2014.
MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ
Relator
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