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- 2º Grau
Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1840571 SP 2019/0290958-9 - Decisão Monocrática
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Decisão Monocrática
RECURSO ESPECIAL Nº 1840571 - SP (2019/0290958-9)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
RECORRENTE : CARLOS EDUARDO PAVAO DE SOUSA
ADVOGADOS : FERNANDA COSTA HUESO - DEFENSORA PÚBLICA - SP238066 DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
DECISÃO
Trata-se de recurso especial interposto por CARLOS EDUARDO PAVAO DE SOUSA , com apoio no art. 105, III, "a", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado:
"TRÁFICO DE DROGAS - Materialidade e autoria comprovadas - Absolvição por falta de provas - Impossibilidade - Conjunto probatório consistente - Réu reincidente - Necessidade de readequação das penas, ante o afastamento do privilégio, tal como pleiteado pelo MP - Manutenção do regime aberto, por não haver se insurgido o órgão ministerial nesse particular.
Desprovimento do apelo defensivo e acolhimento do recurso ministerial."
(e-STJ, fl. 227).
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (e-STJ, fl. 265).
O recorrente aponta violação ao art. 33, § 4°, da Lei 11.343/06 e 64, I, do Código Penal.
Alega, em suma, que o acórdão recorrido, "ao deixar de reduzir o quantum da pena e reconhecer a reincidência contrariou o disposto no artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 e nos artigos 64 do Código Penal" (e-STJ, fl. 279).
Sustenta que a ação anterior transitou em julgado no dia 12/04/2016 e o crime apurado no presente feito ocorreu em 22/03/2016, não havendo falar, portanto, em reincidência.
Afirma que o trânsito em julgado para a defesa não pode ser utilizado como termo inicial, uma vez que "pendente recurso da acusação, a possibilidade de prescrição da pretensão punitiva ainda subsiste, logo, sem o trânsito em julgado para ambas as partes, não se pode falar em reincidência" (e-STJ, fl. 283).
Requer, ao final, o provimento do recurso, para que seja reformado o acórdão, "com o fim de afastar a agravante da reincidência e retornar a aplicação do redutor do tráfico privilegiado pela lei de drogas" (e-STJ, fl. 285).
Foram apresentadas as contrarrazões (e-STJ, fls. 289-295).
Admitido o recurso (e-STJ, fl. 298), os autos ascenderam ao STJ.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento do recurso especial (e-STJ, fls. 308-312).
É o relatório.
Decido.
A pretensão recursal merece acolhimento.
Inicialmente, cumpre ressaltar que a individualização da pena é uma atividade em que o julgador está vinculado a parâmetros abstratamente cominados pelo legislador, sendo-lhe permitido, entretanto, atuar discricionariamente na escolha da sanção penal aplicável ao caso concreto, após o exame percuciente dos elementos do delito, e em decisão motivada. Dessarte, cabe às Cortes Superiores, apenas, o controle de legalidade e da constitucionalidade dos critérios utilizados no cálculo da pena.
Consoante se verifica dos autos, o réu foi condenado em primeira instância à pena definitiva em um ano e oito meses de reclusão, tendo a pena-base sido fixada no mínimo legal e
reduzida em 2/3, em razão da aplicação do redutor do artigo 33, § 4°, da Lei de Drogas.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por sua vez, apreciando a apelação interposta pelo Parquet, afastou a referida minorante, com base nos seguintes fundamentos:
"Cumpre consignar, nesse ponto, que a mencionada certidão se refere a condenação por roubo qualificado, cujo trânsito em julgado para o réu se deu 7 dias antes do delito em questão, vale dizer, em 15 de março de 2016, ficando devidamente configurada a reincidência. Frise-se, por oportuno, que pouco importa que o trânsito em julgado para a acusação tenha ocorrido em data posterior aos fatos ora tratados.
Nesse passo, incabível a aplicação do redutor previsto no artigo 33, § 42, da referida lei"
Nos termos do art. 63 do Código Penal, somente se verifica a reincidência quando o agente comete novo crime depois de transitar em julgado a sentença que o tenha condenado por crime anterior.
No caso, consoante se extrai dos autos, a condenação por roubo qualificado, transitou em julgado para ambas as partes em 12/04/2016 (e-STJ, fl. 133) e o crime apurado no presente foi praticado em 22/03/2016.
Sendo assim, não há falar em reincidência.
Nesse sentido:
"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESCABIMENTO. ROUBO. DOSIMETRIA. REINCIDÊNCIA. CONDENAÇÃO SEM TRÂNSITO EM JULGADO PARA A DEFESA. IMPOSSIBILIDADE. REGIME PRISIONAL FECHADO. PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. REGIME ABERTO CONCEDIDO. SÚMULA N. 440/STJ. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
- Este Superior Tribunal de Justiça, na esteira do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, tem amoldado o cabimento do remédio heróico, adotando orientação no sentido de não mais admitir habeas corpus substitutivo de recurso ordinário/especial. Contudo, a luz dos princípios constitucionais, sobretudo o do devido processo legal e da ampla defesa, tem-se analisado as questões suscitadas na exordial a fim de se verificar a existência de constrangimento ilegal para, se for o caso, deferir-se a ordem de ofício.
- Na segunda etapa de aplicação da pena, a existência de condenação anterior em processo criminal transitado em julgado apenas para a acusação não configura a reincidência, não se podendo falar, portanto, em aumento nesta fase. - O regime inicial fixado para o cumprimento da pena privativa de liberdade do paciente deve ser o aberto, visto que a pena-base fixada no seu mínimo legal, bem como ausentes outros elementos concretos aptos a ensejar a fixação de regime mais gravoso ou intermediário, notadamente se a pena final do paciente foi estabelecida em 4 (quatro) anos. Dessa maneira, em atenção aos ditames previstos no art. 33, § 2º, c, e § 3º, do Código Penal e ao disposto no enunciado n. 440 da Súmula desta Corte, faz-se necessário a concessão de ordem também nesse ponto. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para decotar o aumento referente a reincidência, redimensionando a pena do paciente para 4 (quatro) anos de reclusão, bem como estabelecer o regime aberto para o início do cumprimento da pena, mantidos os demais termos da condenação." (HC 231.235/MG, Rel. Min. MARILZA MAYNARD, Quinta Turma, DJe 07/06/2013).
"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. FURTO QUALIFICADO. VALORAÇÃO DE AÇÃO PENAL EM CURSO PARA RECONHECIMENTO DOS MAUS ANTECEDENTES E DA REINCIDÊNCIA. ILEGALIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. READEQUAÇÃO DO REGIME PRISIONAL INICIAL. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO.
1. É pacífico nesta Corte o entendimento de que inquéritos e ações penais em curso não podem ensejar o aumento da pena, na primeira ou na segunda fase da dosimetria, em respeito ao princípio da não culpabilidade.
2. O reconhecimento da reincidência com fundamento em condenação prévia, com registro de trânsito em julgado somente para a acusação, caracteriza flagrante ilegalidade na dosimetria da pena.
3. O paciente, tecnicamente primário, condenado a pena inferior a 4 anos de reclusão, deverá, desde o princípio, cumpri-la em regime inicial aberto, pois favoráveis as circunstâncias previstas no artigo 59 do Código Penal.
4. Ordem não conhecida. Habeas corpus concedido, de ofício, para afastar a reincidência e redimensionar a pena final do paciente, a ser cumprida no regime inicial aberto." (HC 241.473/SP, Rel. Min. ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, DJe 16/12/2014).
Por essas razões, deve ser afastada a agravante da reincidência, bem como o acréscimo de pena dela decorrente, restabelecendo-se a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau.
Ante o exposto, com fundamento no art. 255, § 4º, III, do Regimento Interno do STJ, dou provimento ao recurso especial para afastar a reincidência do réu e restabelecer a sentença de primeiro grau de jurisdição.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 04 de agosto de 2020.
Ministro Ribeiro Dantas
Relator