Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
13 de Maio de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Superior Tribunal de Justiça
há 12 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

T3 - TERCEIRA TURMA

Publicação

Julgamento

Relator

Ministra NANCY ANDRIGHI

Documentos anexos

Inteiro TeorRESP_1037759_RJ_1306676514389.pdf
Certidão de JulgamentoRESP_1037759_RJ_1306676514391.pdf
Relatório e VotoRESP_1037759_RJ_1306676514390.pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Relatório e Voto

RECORRENTE : L C T A DE S
REPR. POR : CLAUDIA ELEONORA TORRES AFFONSO
ADVOGADO : CLÁUDIA ELEONORA TORRES AFFONSO E OUTRO (S)
RECORRIDO : GEAP FUNDAÇAO DE SEGURIDADE SOCIAL
ADVOGADO : TÂNIA SIDNEY DE SOUZA MESQUITA E OUTRO (S)
RECORRIDO : CLINICA RADIOLOGICA DR LAURO COUTINHO LTDA
ADVOGADO : JORGE DE SOUZA COSTA E OUTRO (S)
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cuida-se de recurso especial interposto por L. C. T. A. DE S., com fulcro no art. 105, III, “a” e “c”, da CF, contra acórdão proferido pelo TJ/RJ.
Ação : de indenização por danos materiais e morais, ajuizada pela recorrente em desfavor de GEAP FUNDAÇAO DE SEGURIDADE SOCIAL E CLÍNICA RADIOLÓGICA DR. LAURO COUTINHO LTDA., alegando deficiência na prestação do serviço de assistência à saúde por parte da primeira recorrida (“GEAP”), além da recusa da segunda recorrida (“CLÍNICA LAURO COUTINHO”), conveniada da primeira, em realizar exames radiológicos devidamente prescritos por profissional habilitado.
Sentença : julgou parcialmente procedente o pedido formulado na petição inicial, para condenar as recorridas “ solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$4.000,00 ” (fls. 318/329). Em relação aos danos materiais, entendeu o Juiz de 1º grau de jurisdição não terem estes ficado comprovados nos autos.
Acórdãos : o TJ/RJ, por maioria, deu provimento ao apelo de ambas as recorridas (fls. 387/393), dando azo à interposição de embargos infringentes pela recorrente, aos quais foi negado provimento, nos termos do acórdão (fls. 441/442) assim ementado:
“1. EMBARGOS INFRINGENTES.
2. DANO MORAL.
3. A CRIANÇA DE TRÊS ANOS DE IDADE NAO É CAPAZ DE SOFRER DANO MORAL, NAO SE PODENDO IMAGINAR ABALO PSICOLÓGICO À MESMA, PELA FALTA DE REALIZAÇAO DE UM EXAME RADIOLÓGICO.
4. RECURSO IMPROVIDO ”.
Recurso especial : aponta ofensa ao art. 14 do CDC e dissídio jurisprudencial (fls. 443/454).
Prévio juízo de admissibilidade : o TJ/RJ admitiu o recurso especial (fls. 606/608).
Parecer do MPF : o i. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins, opinou pelo provimento do recurso (fls. 614/618).
É o relato do necessário.
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : L C T A DE S
REPR. POR : CLAUDIA ELEONORA TORRES AFFONSO
ADVOGADO : CLÁUDIA ELEONORA TORRES AFFONSO E OUTRO (S)
RECORRIDO : GEAP FUNDAÇAO DE SEGURIDADE SOCIAL
ADVOGADO : TÂNIA SIDNEY DE SOUZA MESQUITA E OUTRO (S)
RECORRIDO : CLINICA RADIOLOGICA DR LAURO COUTINHO LTDA
ADVOGADO : JORGE DE SOUZA COSTA E OUTRO (S)
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cinge-se a lide a determinar se criança em tenra idade na hipótese dos autos, três anos é suscetível de abalo moral decorrente da ineficiência de seu plano de saúde e consequente recusa de clínica credenciada em realizar exames radiológicos.
Inicialmente, impende ressaltar que o próprio Relator dos embargos infringentes admite estar “ inteiramente de acordo com os argumentos da sentença, do voto vencido e do parecer do ilustre procurador de Justiça, no sentido de que a atitude da Ré realmente configura dano moral, estando muito além do conceito de meros aborrecimentos ” (fls. 442).
Com efeito, o voto vencido no julgamento da apelação relata o “ drama vivido por uma criança, com 3 (três) anos à época dos fatos, que, saindo de Paquetá, onde morava, teve indevidamente recusada a realização de um simples exame radiológico, sem qualquer razão que justificasse essa recusa ” (fls. 392).
Nesse ponto, o acórdão recorrido se alinha à jurisprudência desta Corte, no sentido de que “ a recusa à cobertura médica pode ensejar reparação a título de dano moral, por revelar comportamento abusivo por parte da operadora do plano de saúde que extrapola o simples descumprimento de cláusula contratual ou a esfera do mero aborrecimento, agravando a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, já combalido pela própria doença ” (AgRg nos EDcl no REsp XXXXX/SC, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe de 23.10.2009. No mesmo sentido: REsp XXXXX/ES, 3ª Turma, minha relatoria, DJe de 20.10.2008; REsp XXXXX/RS, 4ª Turma, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJ de 29.05.2006; e REsp XXXXX/RJ, 3ª Turma, minha relatoria, DJ de 12.12.2005, este último alçado a paradigma pela própria recorrente).
Apesar de reconhecer a existência de situação ensejadora do abalo moral, o TJ/RJ afastou a respectiva indenização, sob o argumento de que uma “ criança de três anos de idade não é capaz de sofrer dano moral, não se podendo imaginar abalo psicológico à mesma, pela falta de realização de um exame radiológico ” (fls. 441).
Porém, não é esta a conclusão que se extrai da legislação aplicável.
A Lei 8.069/90, que tutela especificamente crianças e adolescentes, na primeira parte do seu art. , estabelece que estes “ gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana ”. A norma evidencia que, em relação aos direitos fundamentais, a capacidade jurídica do cidadão menor de idade é plena. A circunstância de ainda não ter alcançado maturidade física e psicológica não lhe coloca em situação jurídica diferente daquela conferida ao adulto, no que tange aos direitos fundamentais.
Outrossim, entre os direitos fundamentais consagrados pela CF/88 está a dignidade da pessoa humana, que compreende a garantia dos direitos da personalidade, isto é, o direito da pessoa de defender o que lhe é próprio ou, no escólio de Rubens Limongi França, a “ faculdade jurídica cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim as suas emanações e prolongamentos ” (Manual de direito civil, vol. 3. Rio de Janeiro: RT, 1975, p. 403).
Ocorre que os direitos da personalidade manifestam-se desde o nascimento, nos termos do art. do CC/02, constituindo, nas palavras de Carlos Alberto Bittar, “ direitos inatos (originários), absolutos, extrapatrimoniais, intransmissíveis, imprescritíveis, impenhoráveis, vitalícios, necessários e oponíveis erga omnes ” (Os direitos da personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, 7ª ed., p. 11).
Caio Mario da Silva Pereira ensina que “ a personalidade, como atributo da pessoa humana, está a ela indissoluvelmente ligada. Sua duração é a da vida. Desde que se vive e enquanto se vive, o homem é dotado de personalidade ” (Instituições de direito civil, vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2009, 23ª ed., p. 183).
Induvidoso, pois, que crianças, mesmo da mais tenra idade, fazem jus à proteção irrestrita dos direitos da personalidade, entre os quais se inclui o direito à integridade mental, assegurada a indenização pelo dano moral decorrente de sua violação, nos termos dos arts. , X, in fine , da CF e 12, caput , do CC/02.
Acrescente-se que, nas hipóteses em que o prejuízo impingido ao menor decorre de uma relação de consumo como ocorre neste particular o CDC, em seu art. , VI, também assegura a efetiva reparação do dano, sem fazer qualquer distinção quanto à condição do consumidor, notadamente sua idade. Ao contrário, o art. da Lei nº 8.078/90 fixa o chamado diálogo de fontes, segundo o qual sempre que uma lei garantir algum direito para o consumidor, ela poderá se somar ao microssistema do CDC, incorporando-se na tutela especial e tendo a mesma preferência no trato da relação de consumo.
Dessa forma, afigura-se absolutamente incabível a exceção criada pelo TJ/RJ, que considerou ser impossível que uma criança de três anos de idade seja moralmente atingida pela negativa injustificada de realização de exames radiológicos.
Ainda que tenha uma percepção diferente do mundo e uma maneira peculiar de se expressar, a criança não permanece alheia à realidade que a cerca, estando igualmente sujeita a sentimentos como o medo, a aflição e a angústia.
Aliás, dada a sua maior vulnerabilidade e sensibilidade, não me parece errôneo concluir que estados de espírito como os citados acima lhe sejam, eventualmente, até mais prejudiciais e danosos do que aos adultos. Afinal, estão em fase de formação intelectual e psíquica, de sorte que abalos dessa natureza podem resultar em traumas incuráveis, que a acompanharão por toda a vida.
Na hipótese específica dos autos, não cabe dúvida de que a recorrente, então com apenas três anos, foi submetida a elevada carga emocional. Nessa idade, a criança tem nos pais em especial na mãe, dada a relação umbilical que os une seu porto seguro. É do estado emocional de seus pais que a criança retira, em grande parte, sua sensação de segurança e conforto.
Assim, mesmo que não tenha tido noção exata do que se passava, é certo que percebeu e compartilhou da agonia de sua mãe tentando, por diversas vezes, sem êxito, conseguir que sua filha fosse atendida pela clínica.
Ademais, a conduta das recorridas prolongou o estado de depressão e aflição da recorrente, derivado do sofrimento físico proporcionado pelas dores de uma enfermidade que permanecia incerta ante à relutância da clínica em realizar os exames que ofereceriam um diagnóstico preciso da doença que acometia a criança. De acordo com a sentença, a CLÍNICA LAURO COUTINHO “ sucessivamente impediu a realização de tais exames ”, entendendo inexistir justificativa para tal procedimento, pois, “ diante do quadro clínico da autora, bem como sua idade, está demonstrada a obrigatoriedade da cobertura pelo plano de saúde Réu da realização dos exames solicitados ” (fls. 325).
Todo esse cenário dramático foi potencializado pelo fato da recorrente estar fragilizada pelos próprios incômodos físicos decorrentes do problema de saúde de que então padecia.
Exsurge claramente, portanto, o dano moral causado à recorrente pelas recorridas e, por conseguinte, o dever de reparação.
Cabe aqui uma última consideração, relativa à responsabilidade da GEAP pelos danos em tela. Cumpre a ela, nos termos dos arts. , III, e 14 do CDC, manter seus conveniados devidamente informados acerca de todas as clínicas, hospitais e médicos credenciados. Nesse aspecto, consta da sentença ser “ certo que a Autora recebeu cópia do Contrato, Termo de Adesão e Protocolo de Inscrição, mas nada consta que tenha recebido um livreto com a relação dos conveniados, para que pudesse até mesmo ter procurado outra clínica conveniada para a realização dos exames ” (fls. 327).
Além disso, o plano de saúde é responsável pela escolha de seus credenciados, devendo zelar para que prestem um serviço adequado, sob pena de responder solidariamente pelos danos causados, nos termos dos arts. , parágrafo único, e 25, , do CDC.
Forte em tais razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, para restabelecer a sentença de fls. 318/329.

Documento: XXXXX RELATÓRIO E VOTO
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/19158604/relatorio-e-voto-19158606

Informações relacionadas

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
Jurisprudênciaano passado

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro TJ-RJ - APELAÇÃO: APL XXXXX-76.2020.8.19.0210 202300128239

Tribunal de Justiça de São Paulo
Jurisprudênciahá 6 anos

Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Apelação Cível: AC XXXXX-71.2017.8.26.0566 SP XXXXX-71.2017.8.26.0566

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios TJ-DF: XXXXX-61.2016.8.07.0017 DF XXXXX-61.2016.8.07.0017

Tribunal de Justiça de São Paulo
Jurisprudênciahá 6 anos

Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP: XXXXX-63.2016.8.26.0100 SP XXXXX-63.2016.8.26.0100

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios TJ-DF: XXXXX-49.2019.8.07.0016 1416980